Uma análise sobre a passagem do físico e teórico alemão pelo Brasil e o apagamento das mulheres na ciência
por
Natália Matvyenko Maciel Almeida
Joana Grigório
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16/11/2025 - 12h

Em 1925, Albert Einstein desembarcou na américa do sul, na cidade do Rio de Janeiro, para uma sequência de palestras e nesse vídeo exploramos uma parte dos relatos escritos em seu diário e a falta de registros de pessoas racializadas e também de mulheres nas conferências.

Referências utilizadas para esse vídeo: 

1. Tolmasquim, Alfredo Tiomno. Einstein, o Viajante da Relatividade na América do Sul (2003)
Este livro oferece um olhar detalhado sobre a visita de Albert Einstein à América do Sul, incluindo sua passagem pelo Brasil. O autor explora a recepção do cientista e seu impacto no cenário científico da época.

2. Haag, Carlos. "Tropical Relativity" (2004)
Artigo publicado na revista Pesquisa FAPESP, que aborda os diários de viagem de Einstein na América do Sul, com destaque para suas observações sobre o Brasil e suas interações com a ciência local.

3. Moreira, Ildeu de Castro. Entrevista: Visita de Einstein ao Rio de Janeiro promoveu valorização da ciência pura (2025)
Entrevista com Ildeu de Castro Moreira, que discute o impacto da visita de Einstein ao Rio de Janeiro, enfatizando a valorização da ciência fundamental e os desdobramentos para a pesquisa no Brasil.

4. Fundação Oswaldo Cruz. Museu tem atrações em homenagem aos 100 anos da visita de Einstein (2025)
A Fundação Oswaldo Cruz celebra o centenário da visita de Einstein ao Brasil com exposições e atividades que relembram a importância histórica dessa passagem do cientista.

5. Observatório Nacional. 100 Anos de Einstein no Brasil (2025)
O Observatório Nacional comemora o centenário da visita de Einstein ao Brasil com uma série de palestras e reflexões sobre o impacto de sua passagem no campo científico brasileiro.

6. Rosenkranz, Ze'ev (org.). The Travel Diaries of Albert Einstein (2018)
Esta coletânea organiza os diários de viagem de Einstein, incluindo suas observações sobre diferentes regiões do mundo, com destaque para seus comentários sobre a América do Sul, e apresenta uma análise crítica sobre seus pontos de vista racializados.

7. Artigos de divulgação histórica sobre os diários de Einstein e racismo
Diversas publicações, como matérias da History.com e do The Guardian, discutem as anotações de Einstein sobre suas viagens à Ásia e outros lugares, destacando seus comentários sobre raça e cultura.

Nota de Checagem de Fatos
As informações sobre a visita de Einstein ao Brasil e seu impacto no país, incluindo o papel de Carlos Chagas e a análise dos diários de viagem, foram baseadas em fontes como Fiocruz, Observatório Nacional, e pesquisas de Ildeu de Castro Moreira. As reflexões sobre os comentários racializados de Einstein seguem a análise crítica adotada por estudiosos como Tolmasquim, Haag e Rosenkranz.

Releitura transmídia da estadia do físico no Rio de Janeiro em 1925
por |
03/11/2025 - 12h

Em maio de 1925, Albert Einstein visitou o Rio de Janeiro por uma semana hospedando-se no Hotel Glória, quarto 400. Apesar da recepção calorosa como celebridade, sua passagem foi um desastre cômico. A comitiva que o cercava não tinha um único físico ou matemático - apenas médicos, advogados, políticos e militares da elite social brasileira. No Clube de Engenharia, falou para uma plateia lotada que não entendia alemão nem suas ideias, em uma sala barulhenta e sem acústica. Na Academia de Ciências, teve que ouvir três discursos vazios em francês mal falado, incluindo um sobre "a influência da Relatividade na Biologia". O ápice foi quando o jurista Pontes de Miranda tentou desafiá-lo em alemão com considerações sobre metafísica e direito. Einstein levou de presente um papagaio que repetia "Data venia, Herr Einstein", lembrando-o sempre, com humor, da "ciência" dos doutores brasileiros.

“Einstein: visualize o impossível” é um projeto dos estudantes do quarto semestre de jornalismo da PUC-SP, da disciplina de jornalismo transmídia. O projeto aborda, de diferentes maneiras, uma releitura da icônica visita do físico ao Brasil em 1925. Todos os relatos estão em um site especial. Além de produções visuais e sonoras, o especial propõe uma narrativa em quadrinhos que conecta ciência, história e imaginação, tendo como cenário o Observatório Nacional (espaço que recebeu Albert Einstein). 

A produção contou com a colaboração de Bruno Matos, vice-diretor da Escola Estadual Professor Walter Ribas de Andrade. Já o vídeo “Os impactos de Albert Einstein na educação brasileira explicado por doguinhos” apresenta as contribuições das teorias do cientista para a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) a partir da entrevista com o professor de física Dediel Oliveira.  

Em “Diário do Einstein”, o leitor encontra coletânea de depoimentos em formato de diário sobre a passagem de Albert Einstein pelo Rio de Janeiro no ano de 1925, comentando ao longo de cada dia, pontos turísticos e palestras presenciadas por ele. No podcast "A carta que revolucionou a corrida armamentista", discute carta assinada pelo físico Albert Einstein em agosto de 1939, que alertava o presidente dos EUA, Franklin D.Roosevelt, sobre o potencial da Alemanha nazista em desenvolver uma bomba atômica.

O vídeo vertical “Einstein no Brasil” narra o encontro do físico com Carlos Chagas, marcando um momento científico crucial. A produção destaca a troca intelectual entre os dois grandes nomes da época. Por fim, é possível compreender uma sutil crítica sobre a omissão de um encontro com cientistas mulheres consagradas, como Bertha Lutz. Em “Einstein: uma análise de sua trajetória política”, as cartas de Einstein e seus discursos que expressavam preocupação com a violência e os conflitos no Oriente Médio são revisitadas. Nas declarações, o físico defende uma convivência justa entre judeus e árabes, e o projeto analisa como suas palavras ecoam no contexto atual da guerra entre Israel e Palestina, mostrando que o tempo passa, mas as perguntas sobre humanidade e coexistência continuam urgentes. 

Finalmente, o livro "Os Sonhos de Einstein", de Alan Lightman, pela Cia das Letras, apresenta uma série de sonhos imaginários que o jovem Albert Einstein teria tido enquanto desenvolvia a Teoria da Relatividade, em 1905. Em cada um deles, o tempo funciona de um jeito diferente, às vezes para, volta ou corre mais rápido e essas variações servem para refletir sobre a vida, as lembranças e as escolhas humanas. "Neste mundo, a textura do tempo parece ser pegajosa. Porções de cidades aderem a algum momento na história e não se soltam. Do mesmo modo, algumas pessoas ficam presas em algum ponto de suas vidas e não se libertam".
 

O uso excessivo do celular está moldando comportamentos e lucros empresariais das Big Techs
por
Julia Cesar Rangel
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27/10/2025 - 12h

Por Julia Cesar

 

O som começa suave, quase hipnótico. A vinheta colorida anuncia: “Cocomelon!”. Em segundos, os olhos se fixam na tela, o corpo se acalma e o mundo ao redor desaparece. Por trás dessa inocente animação infantil, há uma equipe bilionária que lucra com cada clique, cada minuto de atenção e cada vídeo que não para de rodar.

Nos últimos anos, o uso excessivo do celular tem preocupado especialistas, pais e educadores. Plataformas e canais, especialmente os voltados para o público infantil, estão sendo desenhados para capturar e reter o olhar humano o máximo possível. No caso das crianças, os efeitos são ainda mais intensos, já que seus cérebros ainda não estão totalmente formados para compreender o que é viciante e prejudicial.

A mãe Bianca Rangel, por exemplo, percebeu esse impacto em casa. O pequeno Gael, de 3 anos, começou a reconhecer a música do Cocomelon apenas pelo primeiro segundo de som. Ele largava qualquer brinquedo para correr até o celular. No início, Bianca achava a cena fofa, mas com o tempo notou que o filho ficava irritado e chateado quando o aparelho era desligado.

Preocupada, ela tentou limitar o tempo de tela, mas enfrentou forte resistência. Foi então que decidiu buscar orientação profissional e entendeu que substituir o tempo de tela por atividades com “dopamina boa” não era apenas uma escolha, e sim uma necessidade.

De acordo com a psicóloga Mayara Contim, formada pela USP e atualmente atuando na escola St. Nicholas, esse tipo de comportamento é resultado de mecanismos psicológicos cuidadosamente estudados pelas plataformas. Ela explica que não se trata apenas do Cocomelon: hoje, vídeos são planejados para ativar o sistema de recompensa do cérebro. As músicas, as cores e o ritmo acelerado são pensados para liberar dopamina, o hormônio ligado ao prazer imediato. Isso cria um ciclo de dependência semelhante ao que ocorre com jogos e redes sociais entre adultos e adolescentes.

A psicóloga ressalta que o problema não está apenas nas crianças. Segundo ela, os adultos também são vítimas desse design, já que as redes sociais funcionam com a mesma lógica de manter o usuário rolando infinitamente. No entanto, o impacto é mais grave nas crianças, pois seus cérebros ainda estão em desenvolvimento.

Um estudo recente da Common Sense Media apontou que, em média, crianças de até cinco anos passam quase três horas por dia em frente a telas. O dado assusta, mas reflete uma realidade cotidiana: celulares se tornaram babás digitais, distrações práticas para pais cansados e ferramentas de lucro para empresas que vendem publicidade a cada visualização.

Bianca admite que o uso do celular facilitava sua rotina. Enquanto o filho assistia aos vídeos, ela conseguia trabalhar ou realizar tarefas domésticas. Com o tempo, porém, percebeu que estava trocando momentos de qualidade com o filho por alguns minutos de silêncio.

Para Mayara Contim, o primeiro passo é não culpar os pais, e sim compreender o contexto. Ela destaca que vivemos em um mundo hiperconectado e que o caminho está na consciência e nos limites. O ideal, segundo a psicóloga, é que os pais assistam junto com as crianças, conversem sobre o conteúdo e ofereçam outras formas de estímulo — como brincadeiras, leitura e contato com a natureza.

Enquanto isso, a indústria continua explorando cada segundo de atenção possível. Canais como Cocomelon acumulam bilhões de visualizações e lucros altíssimos com publicidade, licenciamento e produtos derivados. O looping digital virou negócio, e nós, espectadores, nos tornamos o produto.

Mayara resume a lógica de forma direta: a atenção é a nova moeda. E, no fim, essa frase ecoa como um alerta — quanto mais tempo passamos presos às telas, mais alguém, do outro lado, está lucrando com isso.

O Brasil é pioneiro na criação de um medicamento que regenere a medula óssea de pacientes
por
manuela schenk scussiato
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03/11/2025 - 12h

Por Manuela Schenk

 

Não fora uma sexta-feira qualquer para Júlia. A caminho do ponto de ônibus para voltar para sua casa após um dia de aula na faculdade um motorista embriagado atropelou-a e fugiu sem prestar socorro que mudou sua vida para sempre quando tinha apenas 19 anos. Júlia teve lesões nas vértebras T8, T9 e T10 que a deixaram paraplégica depois de cinco dias em coma quando recebeu a notícia de que jamais andaria novamente.

Hoje Júlia tem 22 anos e teve que reaprender a viver. Coisas que jamais imaginou ter dificuldades agora são grandes conquistas, como quando conseguiu tomar banho sozinha pela primeira vez ou quando pode se deitar na própria cama sem auxílio. Escadas se tornaram rampas, seu restaurante favorito virou delivery, já que não possui acessibilidade para que ela consiga entrar na cadeira de rodas. As festas que frequentava semanalmente agora são eventos anuais, pois a locomoção dentro de uma balada é quase impossível para alguém que não consegue usar as próprias pernas.

No início se adaptar parecia impossível, noites mal dormidas quando chorava no travesseiro até seus olhos cederem. Depois de receber alta do hospital ela foi encaminhada para terapia, consultas três vezes por semana que depois de dois anos se tornaram duas. A fisioterapia que antes era uma tortura aos poucos se tornou um momento divertido.

Nos anos que se passaram Júlia conheceu mais pessoas na mesma situação que ela e de pouco a pouco sua nova vida se tornou mais tolerável, mas mesmo depois de quase 4 anos do acidente ela ainda tem dias ruins, sua autoestima nunca mais foi a mesma já que por muito tempo não conseguia se arrumar como antes. Júlia conta que o momento mais difícil da vida dela foi descobrir que seu caso não tinha cura. Sem possibilidade de tratamento ou cirurgia, uma menina que antes era ativa, amava se exercitar, sair com suas amigas, passear com sua cachorrinha, agora se vê forçada a reaprender a viver.   

É possível perceber as dificuldades que marcam a vida das pessoas que são afetadas pela paraplegia. Infelizmente muitos casos não são reversíveis, mas graças a estudos de um grupo da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), o mundo pode estar mais próximo de encontrar uma cura para uma deficiência que interrompe a vida de tantas pessoas.

A pesquisa, desenvolvida no Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ, representa um marco para a medicina brasileira. O medicamento experimental chamado Polilaminina foi criado a partir de uma proteína natural da placenta humana, capaz de estimular a regeneração das células nervosas. Em estudos com animais, especialmente cães que haviam perdido os movimentos, o tratamento apresentou resultados impressionantes: alguns conseguiram voltar a andar mesmo após anos de paralisia. Esse avanço chamou a atenção da comunidade científica internacional e fez com que o Ministério da Saúde e a Anvisa classificassem o estudo como de prioridade absoluta no País.

A equipe liderada por Tatiana Sampaio começou o estudo da eficiência polilaminina para promover a regeneração de fibras nervosas/axônios e reconectar áreas lesadas da medula espinhal começou em 2007, embasado em outro estudo da faculdade que iniciou em 1998. São quase três décadas de trabalho árduo que trouxeram a equipe ao sucesso que é exposto para o mundo hoje, com seis dos oito pacientes humanos recuperando, parcial ou completamente, os movimentos que lhes foram tomados. 

Além dos testes clínicos em andamento, o projeto da UFRJ tem recebido apoio de instituições públicas e privadas, como o Laboratório Cristália, que colabora na etapa de desenvolvimento farmacêutico e produção em larga escala da substância. O próximo passo dos pesquisadores é a realização de estudos em uma quantidade maior de voluntários, o que permitirá avaliar com mais precisão a segurança e a eficácia do medicamento. Caso os resultados se confirmem, o Brasil poderá ser o primeiro país a oferecer um tratamento realmente regenerativo para lesões medulares, uma conquista inédita na história da ciência.

Para Júlia e milhares de pessoas que convivem com a paraplegia, essa descoberta reacende uma esperança que parecia perdida. Mesmo que o caminho até a cura ainda seja longo, cada passo da pesquisa representa uma vitória contra a limitação imposta pela lesão medular. A história de Júlia mostra a força de quem se reinventa diante da adversidade. O que a ciência da UFRJ faz agora é provar que o impossível pode estar mais perto do que se imagina. Aquilo que antes era apenas sonho, agora começa a ganhar forma nas mãos de pesquisadores brasileiros dedicados a devolver o movimento e com ele a liberdade a tantas vidas interrompidas.

Especialista alerta para riscos do uso acrítico de plataformas de IA na educação
por
Thomas Fernandez
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04/10/2025 - 12h

A inteligência artificial (IA) ganhou rapidamente espaço em diferentes setores da sociedade, e a educação não ficou de fora dessa tendência. Plataformas capazes de corrigir redações, recomendar atividades personalizadas e até mesmo substituir parte das tarefas do professor estão em alta.

A promessa, vendida por empresas de tecnologia e gestores entusiasmados, é de que a IA pode democratizar o ensino, personalizar a aprendizagem e aliviar a carga de trabalho docente. Não por acaso, de acordo com o Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (CETIC), sete em cada dez estudantes do Ensino Médio já utilizam ferramentas de IA generativa em trabalhos escolares, mas apenas 32% afirmam ter recebido orientação na escola sobre como usar esses recursos de forma pedagógica. 

Há quem veja nesse movimento um risco de precarização do trabalho dos professores, transformando a inovação em mais uma engrenagem de uma lógica de cortes de custos e desvalorização profissional. Afinal, a inteligência artificial na educação é realmente uma aliada do professor ou pode acabar sendo um instrumento de substituição e perda de direitos? 

Em entrevista à AGEMT, Pedro Maia, cientista de dados e pesquisador em ética e tecnologia, alerta para o risco de que a IA seja utilizada como justificativa para reduzir a presença e a importância dos professores. Para ele, é preciso estar atento à lógica de mercado que move grande parte das inovações tecnológicas aplicadas à educação: “O risco é que as escolas passem a enxergar a inteligência artificial não como apoio, mas como substituição. Se uma plataforma consegue corrigir automaticamente atividades e sugerir trilhas de estudo, a tentação de reduzir o quadro docente e cortar custos é enorme”, explica. 

Segundo Maia, isso poderia levar a uma precarização ainda maior do trabalho docente, em um cenário no qual professores já enfrentam baixos salários, excesso de carga horária e falta de condições adequadas de trabalho. “A promessa de eficiência pode esconder a intenção de enxugar gastos. É a lógica neoliberal aplicada à educação: menos investimento em pessoas, mais aposta em soluções padronizadas”, acrescenta.

Pedro Maia, cientista de dados.
Pedro Maia, cientista de dados. Foto: Arquivo Pessoal.

 

Maia também chama atenção para o risco de aprofundar desigualdades: “Nesse cenário, a IA não democratiza, mas acentua a exclusão. O aluno da periferia continua com menos oportunidades que o de elite, ainda que ambos usem supostamente a mesma tecnologia”. Esse alerta encontra respaldo nos números. Em 2023, 69% dos estudantes já conheciam a IA; em 2024, esse índice subiu para 80%, segundo levantamento nacional feito pela Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior (ABMES).

No entanto, nem todos têm acesso à mesma qualidade de ferramentas ou de acompanhamento pedagógico. Enquanto escolas privadas de ponta conseguem incorporar plataformas sofisticadas, parte da rede pública depende de versões limitadas, com pouco ou nenhum suporte docente.

Mesmo assim, o cenário não é apenas de resistência. Pesquisas feitas pela SEMESP (Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo), mostram que 74,8% dos professores acreditam que a IA pode ser aliada no processo de ensino, e 39,2% já utilizam a tecnologia regularmente em sala de aula. Esses dados revelam uma categoria dividida, mas que enxerga potencial na tecnologia quando aplicada como ferramenta de apoio, não como substituição. 

Além disso, iniciativas públicas começam a surgir. O governo federal, em parceria com a UNESCO e a Huawei, lançou o projeto “Open Schools” na Bahia e no Pará. Ambos locais foram escolhidos pela falta de infraestrutura educacional, conectividade e recursos tecnológicos. A iniciativa foca na formação de professores em competências digitais e uso de IA, além de investimentos em conectividade e infraestrutura. O objetivo é reduzir desigualdades e preparar a rede pública para essa transição.

A coexistência desses dois pontos de vista - o risco de precarização e a promessa de apoio pedagógico - evidencia o dilema atual: A IA pode ser tanto aliada quanto algoz, dependendo da forma como for implementada. Se o objetivo for cortar custos, há risco de enfraquecer a profissão docente. Mas se, por outro lado, houver investimento em formação, infraestrutura e regulação, ela pode abrir espaço para práticas pedagógicas mais ricas e inclusivas.

O que está em jogo, portanto, não é apenas a chegada de uma nova tecnologia, mas o modelo de educação que o país pretende construir. A questão central permanece: a inteligência artificial será um recurso a serviço de professores e alunos ou mais um instrumento de precarização do trabalho em nome da eficiência econômica?

Enquanto não há consenso, cresce a urgência em debater publicamente os rumos dessa transformação. O futuro da escola não depende apenas das máquinas, mas das escolhas políticas, sociais e econômicas que definirão como, para quem e com quais propósitos a tecnologia será utilizada.

Conheça o que há por trás das charges do mineiro Renato Aroeira
por
Marcela Foresti
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02/04/2021 - 12h

 

O chargista Renato Aroeira nasceu em Belo Horizonte e cresceu em uma família de desenhistas e jornalistas, começou sua carreira na adolescência ilustrando os livros paradidáticos da mãe, que era professora  e as apostilas do pai, que era professor de desenho: "é aquele aprendizado na oficina familiar”. Aos 17 anos passou a ilustrar a coluna de esportes do Jornal de Minas, escrita pelo pai.

Além de fazer ilustrações na coluna de esporte, ele também passou pelas de humor e atualmente política. Fez charges em jornais como O Dia, O Globo, Estado de São Paulo, entre outros.

Ele conta que só foi realmente entender  política no Movimento Estudantil e na construção da imprensa sindical.

Aroeira explica que quando faz suas charges políticas prefere que elas sejam mais complicadas, mesmo que isso faça com que nem todos entendam. Isso porque ao longo dos anos percebeu que quanto mais simples o humor nas charges, mais preconceito há nela: “o humor simplificado tende a ser um humor muito raso”. 

Com o tempo, o chargista aderiu ao politicamente correto e aos lugares de fala, para que não se torne um humor sem graça e que fale apenas sobre as minorias que já sofrem diariamente: "não bato em quem está apanhando”. Aroeira diz que como um crítico social, ele tem a função de  criticar a estrutura que garante a permanência do que está errado.

Outra função de suas charges é tentar informar com humor e fazer com que as pessoas entendam os acontecimentos e fatos, para que assim consigam tirar suas conclusões sobre os assuntos. “Eu tento desenhar para que as pessoas entendam”, ironiza. 

Por outro lado ele não tem a  intenção de  que suas charges resolvam os problemas. “Eu não espero que uma charge resolva nenhum problema, nem atice nada, nem provoque uma revolução ou coisa parecida”, confessa. Para ele a charge é uma pecinha num componente cultural que é necessário para a sociedade mudar de rumo:  “a charge tem um papel auxiliar no processo de construção da civilização”.

No seu processo de criação, ele explica que normalmente já sabe o que quer dizer e só precisa  procurar algum fato que combine com o que ele já tem em mente. Aroeira faz em média de 15 a 20 desenhos por semana, sendo destes 7 charges. 

Além de chargista, Aroeira também é saxofonista e  participa do grupo “Trio das Quartas” ao lado da esposa Cláudia Barcellos, que é violinista e radialista.

Esta reportagem especial tem como base os cortes no investimento em ciência no Brasil nos últimos anos, que cresceram, trazendo denúncias de desmantelamento da pesquisa no país
por
Artur Ferreira, Gabriela Neves e Natasha Meneguelli
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11/12/2020 - 12h

 

“Minha pesquisa vai atrasar, meus resultados foram interrompidos, vou ter que pedir prorrogação de prazo. Enfim, é dramática a situação”, conta Marcela Rodrigues, 34 anos, mestranda em Ciências Mecânicas pela UnB (Universidade de Brasília). Ela estava no processo de conclusão da sua dissertação quando sua bolsa foi cortada. Por conta disso, teve que interromper o estudo para aceitar outros trabalhos em busca de outra fonte de renda.  

 

Luís Carlos Pereira, 29 anos, nem chegou a conseguir a bolsa que precisava. Ele se graduou em Economia pela Universidade Federal do Ceará e atualmente é mestrando em Economia Política pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo). Para continuar a pesquisa, trabalha como promotor de eventos. 

 

“Sempre tivemos bolsas e fomento, claro que nunca foi o ideal, os recursos sempre foram instáveis, essas reservas de contingência já vêm acontecendo há muito tempo. Mas, atualmente, a situação está trágica”, afirma a vice-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Fernanda Sobral, que atua na formação de cientistas.

 

marcela rodrigues
Marcela Rodrigues. Acervo Pessoal.

 

Flávia Calé, mestranda em história econômica pela USP (Universidade de São Paulo) e presidente da Associação Nacional de Pós-graduandos (ANPG), vai na mesma linha, explicando que os jovens pesquisadores, em especial os doutores, se encontram totalmente desamparados e sem perspectivas.

 

 

Entrando para a estatística

 

Para concorrer à uma vaga de mestrado nas melhores universidades do país, Luís teve de prestar um concurso. Conta que foi uma alegria imensa ver seu nome selecionado em diversos programas de pós-graduação, e o da PUC-SP era o que mais lhe interessava.

 

Sua dissertação trata de um fator crucial para a economia, a qualidade do capital humano do país. Ou seja, o quão bem treinado é o trabalhador. Seu enfoque é compreender qual o grau de formação e conhecimento, e como isso afeta as desigualdades de renda do Brasil. O objetivo é que esse estudo sirva como base para representantes políticos, ativistas e outros pesquisadores formularem melhores políticas públicas para a educação.

 

Contudo, ele entrou para a estatística que gostaria de pesquisar, tendo sua formação afetada por um corte de bolsas na sua área. Em Economia Política, o número caiu de 16 para 5. 

 

O choque não foi só de Luís. “Você tinha antes 16 pessoas que teriam condições de se manter no mestrado e dedicar ali suas vidas, porque a bolsa exige isso, dedicação exclusiva para fazer ciência.” Hoje, ele precisa de um segundo emprego, tanto para custear a pós quanto seus próprios gastos pessoais.

 

Luís Carlos Pereira
Luís Carlos Pereira. Acervo pessoal.

 

De acordo com a pesquisa de 2019 da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), apenas 0,8% dos brasileiros entre 25 a 64 anos concluíram um mestrado. No caso do doutorado o número fica ainda menor, alcançando 0,2% da população. A média dos países analisados era de 13% com mestrado, e 1,1% com doutorado. O Brasil só fica na frente de países como a China, que não possui dados numéricos sobre doutorados, e da Arábia Saudita (entre quantos países pesquisados?) 

 

Casos como o de Luís e os de muitos outros pós-graduandos não chegaram com a pandemia da Covid-19. Mas ela certamente vai agravar a situação devido à crise econômica.

 

Quando compilados os dados dos principais fundos de pesquisa do Brasil, como o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT),  a verba do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e as bolsas cedidas pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), em meados de 2015 o Brasil somava quase R$ 14 bilhões investidos em pesquisa acadêmica.

 

Em 2016, o número total era de R$ 9,43 bilhões - uma diminuição de cerca de 33%. Quando se transforma essa verba em número de bolsas de mestrado e doutorado, pode ser observada uma queda de 28 mil para 17.818. No ano passado, R$ 1,24 bilhão foi cortado da verba destinada às universidades brasileiras, 17% do orçamento. 

 

Em uma audiência pública na Comissão de Educação (CE), no dia 3 de dezembro do ano passado, o presidente da Capes, Anderson Ribeiro Correia, negou os cortes nas bolsas de estudos denunciados por pesquisadores. Para o órgão, houve um aumento de 11% no orçamento do ano de 2018 para o de 2019. O valor total de investimento apontado foi de R$ 4,179 bilhões.

 

“Daqui a 10 anos, vamos ter uma geração de cientistas que não se formaram”, desabafa Luís.

 

 

“Escolha de Sofia”

 

Marcela Rodrigues tem ideias semelhantes às de Luiz. Para a pesquisadora, se não houver nenhuma política que reveja o “desmonte” da ciência brasileira, viveremos um “apagão” na área. “Em breve, assim, ano que vem. Porque o que tá previsto para a lei de orçamento é a extinção dos programas de pesquisa no Brasil”. 

 

Ela conta que o impacto imediato é a evasão de estudantes do programa. A evasão de cérebros, discussão comum no universo acadêmico, é outra consequência – com  pesquisadores e estudantes buscando, em outros países, a estrutura para continuar os seus trabalhos. 

 

“A sociedade precisa perceber que cada pesquisador que sai leva com ele anos e anos de investimento público. Então o estado acaba desperdiçando dinheiro não dando condição para esses pesquisadores continuarem no Brasil”, afirma. 

 

protesto contra cortes na educação
Protestos contra os cortes nos investimentos em educação. Por Gabriela Neves.

 

A pesquisadora conta que, para que o país não dependa do que vem pronto de fora, é necessário investimento em ciência. Cita o exemplo do mercado agrícola, que precisa de ciência e tecnologia de ponta para desenvolver sementes competitivas. Para ela, sem essas áreas de inovação tecnológica, não há soberania e desenvolvimento no país. 

 

“É em cima desses programas de engenharia, de inovação, de energia e de recuperação ambiental que a vida em sociedade está apoiada”, afirma Marcela. E lembra que são esses projetos que dão origem a ferramentas como as que usamos para diminuir os impactos da pandemia. “É muito contraditório o discurso de que vai preservar a engenharia cortando bolsa e desmontando programas de pesquisa dentro das universidades, perseguindo as universidades, colocando o pós-graduando como inimigo da nação, e não como um aliado ao seu desenvolvimento.”

 

Marcela lembra que esses problemas já existiam antes da pandemia. O programa de que ela faz parte é do Capes 4 na Universidade de Brasília (UNB), e foi duramente afetado pela portaria 34 do governo federal, que modificou a forma de concessão das bolsas. 

 

Uma série de bolsas foram antes do coronavírus chegar aqui. A situação se complicou quando vários estudantes que já tinham assinado o termo de concessão de bolsa perderam a continuidade da pesquisa. Depois do início da quarentena, surgiram obstáculos para o trabalho experimental necessário para os projetos. 

 

Alunos e professores precisavam de campo, laboratório e infraestrutura que se tornavam impeditivos. “Muita gente não tem o equipamento que dê conta de fazer a simulação dentro de casa, são processadores muito avançados. Geralmente, os computadores domésticos não conseguem dar conta”, explica Marcela.

 

Quando a Capes fez a prorrogação da bolsa, o programa tentou resolver um problema anterior à pandemia, fazendo a fila de espera por bolsas andar, para ver se reduzia a evasão e segurava o programa vivo. “Foi nesse contexto que a minha bolsa foi cortada. É o contexto em que vários programas estão submetidos, de fazer a ‘escolha de Sofia’: decidir quem vai receber bolsa ou quem não vai, se o aluno que está com o trabalho em curso ou o aluno que acabou de ingressar para não evadir”, diz Marcela. 

 

“Eu só daria um recado para os meus colegas: que não se sintam culpados pelo que a gente está vivendo. A gente é muito pressionado pela questão da produtividade e tudo o mais, é um problema muito mais conjuntural do que individual. A saída que a gente precisa buscar é coletiva, não do indivíduo.” 

 

 

Pesquisadores e o Estado

 

A presidente da ANPG, Flávia Calé, indica que um dos fatores que prejudicou o andamento de diversas pesquisas nacionais foi o encerramento do programa de pós-doutorado da Capes. Parte do dinheiro foi direcionado à reposição de bolsas de 2019, e outra parcela foi investida nas pesquisas sobre a Covid-19.

 

O investimento é essencial para todo projeto, pesquisa e desenvolvimento de ciência em larga escala. Para alcançar essas verbas, os governos federal e estadual devem trabalhar em conjunto com as instituições de ensino superior. Entretanto, segundo o presidente da Associação dos Docentes da USP (Adusp), Rodrigo Ricupero, a relação entre Estado e universidade está bastante abalada.

 

Segundo ele, houve uma queda nos investimentos em pessoal e equipamentos: “O Instituto Geológico, Florestal, da Pesca, uma série de institutos de pesquisas foram desmontados. Não tem concurso faz tempo, os salários são baixos... Então, no fundo tem uma política de desmonte da ciência e da tecnologia”.

 

O presidente da Adusp criticou o discurso mercadológico que, segundo ele, transforma as instituições em “startups” e “empresas unicórnio” [startups com avaliação de mercado de mais de 1 bilhão de dólares], diminuindo seu aspecto social. 

 

Flávia Calé
Flávia Calé

 

Ricupero cita o exemplo do projeto USP do Futuro, que teria sido criado por professores e ex-alunos da universidade em conjunto com a consultoria norte-americana McKinsey. Segundo ele, o processo de convênio não foi comunicado ao restante da universidade e boa parte dos envolvidos no projeto estão em altos cargos de governança estadual. (Explicar melhor qual o problema do USP do Futuro)

 

O projeto de lei apelidado de “PL da autonomia das universidades” seria mais uma forma de distanciar o poder público e os institutos de ensino superior. Essa é a opinião de Amanda Harumy, graduada em Relações Internacionais, doutoranda no Programa de Integração da América Latina, coordenadora geral da Associação de Pós-Graduandos da USP (APG-USP) na capital.

 

De acordo com ela, o orçamento da universidade depende do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). Conta que instituições como a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e as universidades estaduais recebem uma porcentagem de sua arrecadação, que é variável. Ou seja, em determinados períodos a verba é maior ou menor.

 

Como a verba arrecadada não é constante, a reserva feita com o que “sobra” dela depois desses gastos imediatos das universidades é essencial para o uso de médio e longo prazo. Isso significa que ele pode ser direcionado para outras necessidades futuras e igualmente importantes para a continuidade dos trabalhos de pesquisa, como reformas de laboratórios, compra de equipamentos, entre outros investimentos. 

 

O PL 529/20 foi criticado pela comunidade de pesquisa.  Após protestos de associações e organizações de docentes e estudantes, acabou não sendo aprovada pela Assembleia Legislativa de São Paulo. 

 

 

Frente contra a Covid-19

 

Marcelo Mori é Secretário Regional da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) e professor da Unicamp. Ele estuda biologia do envelhecimento  com foco em doenças metabólicas, e seu interesse pelo coronavírus se relaciona aos idosos e pessoas com problemas metabólicos, que são mais suscetíveis à doença.

 

Coordena a força-tarefa da Universidade Estadual de Campinas contra a pandemia. Iniciada em março, trouxe resultados em diversas áreas, servindo como apoio para o Estado. Conseguiram a estrutura necessária para realização de diagnósticos e pesquisa, além de equipes que atendiam populações de menor renda e comunidades indígenas. “Tudo foi feito de forma voluntária, ninguém ganhou nada a mais por conta disso”, conta Marcelo. 

 

“A gente acabou trabalhando com outros grupos, colaborando, fazendo uma ciência muito mais colaborativa, o que para mim é o legado dessa pandemia”, conta. Marcelo Mori explicou que as agências de pesquisa foram compreensivas quanto aos atrasos por conta da pandemia, e que houve financiamento para os projetos relacionados à doença. 

 

Marcelo mori
Marcelo Mori. Acervo pessoal. 

 

Apesar do ganho científico por conta de projetos ligados à covid-19 (alunos e pós-doutorandos se envolveram na nova linha de estudos), ele avalia que houve um atraso significativo nas pesquisas que vinham sendo feitas antes da pandemia. 

 

Para quem trabalha com outras áreas não relacionadas ao coronavírus, ou que não receberam financiamento para trabalhar com a doença, a questão é mais complicada. “Talvez o impacto não seja imediato, mas talvez na hora de enviar um relatório, de conseguir um outro financiamento, esse tempo, esse atraso, pode ser problemático”, afirma. 

 

Quando questionado sobre o que devemos esperar para o ano de 2021, o cientista respondeu que acredita que o aprendizado e a valorização da ciência são essenciais para que a sociedade se prepare para as próximas epidemias, problemas socioeconômicos e mudanças climáticas. 

 

“Não seria possível se não tivesse um arcabouço prévio de investimento, com equipamentos, experiência, estrutura para fazer isso.” Ele lembrou que quem respondeu fazendo testes foram instituições de pesquisa e de ensino, e que fazer as pessoas se recordarem disso por meio de divulgação é importante para a ciência.

Em meio a pandemia da Covid-19 e conflitos incessantes ao redor do mundo, entenda esse grupo e conheça a uma das instituições que lhes presta apoio no Brasil
por
Marina Daquanno Testi e Thayná Alves
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08/12/2020 - 12h

 

 

     

        O número de refugiados no Brasil vem crescendo a cada ano. Só no ano de 2018, segundo a Agência da ONU Para Refugiados (ACNUR) foram relatadas 80 mil solicitações de reconhecimento de condição de refugiado no Brasil. Os grupos de maior número entre as solicitações são os venezuelanos (61.681), que saíram do país devido à crise humanitária, e os haitianos (7.030), cujo fluxo de migração se intensificou após o terremoto que atingiu o país em 2010.  

        A lei brasileira considera refugiado todo indivíduo que está fora de seu país de origem devido a guerras, terremotos, miséria e questões relacionadas a conflitos de raça, religião, perseguição política, entre outros motivos que violam seus direitos humanos. Isso pode acontecer, por exemplo, quando a vida, liberdade ou integridade física da pessoa corria sério risco no seu país.

        Para que o imigrante seja reconhecido como refugiado, é necessário enviar uma solicitação para o Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE). O processo de reconhecimento, que antes era mais burocrático e mais demorado, atualmente é feito no site do Ministério da Justiça, a partir do preenchimento do formulário que pode ser feito ainda no país de origem. Todas as etapas podem ser acompanhadas pela internet, mas para o processo começar a tramitar, o solicitante deverá comparecer pessoalmente a uma unidade da polícia federal. 

        Dentre a população refugiada reconhecida no Brasil, segundo o censo da ACNUR de 2018, a maioria se concentra nas faixas etárias de 30 a 59 anos (41,80%), seguido de pessoas com idade entre 18 a 29 anos (38,58%). Do total, 34% são mulheres e 66% são homens, ressaltando os sírios, os congoleses como nacionalidades em maior quantidade (respectivamente 55% e 21%). 

         Em janeiro de 2020, o Brasil tornou-se o país com maior número de refugiados venezuelanos reconhecidos na América Latina, cerca de 17 mil pessoas se beneficiaram da aplicação facilitada no processo de reconhecimento, segundo a  Agência da ONU para Refugiados. As autoridades brasileiras estimam que cerca de 264 mil venezuelanos vivem atualmente no país. Uma média de 500 venezuelanos continua a atravessar a fronteira com o Brasil todos os dias, principalmente para o estado de Roraima.

         Apesar de em grande quantidade, apenas 215 municípios têm algum tipo de serviço especializado de atenção a essa população. As maiores dificuldades encontradas por pessoas refugiadas são a adaptação com o mercado de trabalho, com o aprendizado do idioma, o preconceito e a xenofobia, educação (muitos possuem diplomas em seus países de origem que não são aceitos aqui no Brasil), moradia e saúde. 

 

Covid-19 e o amparo aos refugiados

 

        Diante de um quadro de crise em escala global, como o que acontece este ano com a pandemia da Covid-19, essa população de migrantes e refugiados, que já se encontram em extrema vulnerabilidade, conta com o apoio de poucas instituições voltadas especialmente para suas necessidades. Este é o caso da Missão Paz, uma instituição filantrópica de apoio e acolhimento a imigrantes e refugiados, com uma das sedes na cidade de São Paulo, como conta o padre Paolo Parise.

        Nascido e criado na Itália, Parise atua desde 2010 na Missão Paz, atualmente como um dos diretores, e explica que esta instituição está ligada a uma congregação da Igreja Católica chamada Scalabrinianos, que atua com imigrantes e refugiados em 34 países do mundo. “Na região do Glicério - município do estado de São Paulo-, a obra se iniciou nos anos 30 e atualmente está presente em Manaus, Rio de Janeiro, Cuiabá, Brasília, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre, Foz do Iguaçu, Corumbá e outros lugares.”

        Sua estrutura atual conta com a Casa do Migrante, um abrigo com capacidade de 110 indivíduos que são acolhidos com alimentação, material de higiene pessoal, roupas, aulas de português, acompanhamento de assistentes sociais e apoio psicológico; e o Centro Pastoral e de Mediação dos Migrantes (CPMM) que oferece atendimento e serviços voltados aos imigrantes, quanto aos seguintes temas: documentação e jurídico; trabalho, capacitação e cidadania; saúde; serviço social; família e comunidade. “Além disso, temos a área de pesquisa em parceria com a revista Travessia, que é o Centro de Estudos Migratórios (CEM), uma biblioteca especializada em migração e a WebRadio Migrantes”, completa Pe. Paolo.

Fonte: Site da instituição Missão Paz - Casa do Migrante
Fonte: Site da instituição Missão Paz - Crianças brincam na Casa do Migrante

        De acordo com o diretor, o maior desafio enfrentado pela instituição, durante a pandemia, foi com a saúde dos refugiados, principalmente pela impossibilidade de viver a quarentena isoladamente, já que muitos vivem em ocupações ou em lugares com muitas pessoas concentradas. Ele ainda denunciou que, dentre tantas vítimas da Covid-19 em São Paulo, um dos grupos mais afetados foi o de imigrantes bolivianos, “muitos foram contaminados e muitos morreram”.

        Diante de instabilidades políticas e econômicas, atualmente, sírios e venezuelanos são as principais nacionalidades afetadas que solicitam entrada no país. O que ratifica o Pe. Parise, “Falando pela Missão Paz, se você utiliza o termo ‘refugiados’, o maior grupo neste momento é de venezuelanos, sejam os que foram acolhidos pela missão paz, sejam os que estão entrando no Brasil. E depois encontramos outros grupos como da República Democrática do Congo. Mas se falamos de imigrantes, temos Colombianos, Bolivianos, Paraguaios, Peruanos, Angolanos e de outros países que estão recorrendo ao Brasil.”

        Mesmo com mudanças críticas, no cenário jurídico e político brasileiro, para que esta população seja recebida no país e tenha seus direitos respeitados, ainda não se pode falar em auxílio do governo ou medidas diretas de apoio a refugiados e imigrantes. 

        Paolo relembra a criação de leis que têm beneficiado a população no Brasil. Uma delas é a lei municipal Nº 16.478 de 2016, onde o Prefeito do Município de São Paulo, Fernando Haddad, instituiu a Política Municipal para a População Imigrante que garantia a esses o acesso a direitos sociais e aos serviços públicos, o respeito à diversidade e à interculturalidade, impedia a violação de direitos e fomentava a participação social; e a outra é a lei federal Nº13.445 de 2017, ou a nova Lei de Migração, que substitui o Estatuto do Estrangeiro e define os direitos e deveres do migrante e do visitante, regula a sua entrada e estada no País e estabelece princípios e diretrizes para as políticas públicas para o emigrante.

        A Missão Paz se mantém através de projetos e dinheiro injetado pela congregação da Igreja Católica. “Neste momento, a Missão Paz não recebe apoio financeiro nem do município, nem do estado e nem do Governo Federal”, relata Parise. Durante a pandemia receberam ajuda da sociedade civil, “[A Instituição] Conseguiu muitas doações de pessoas físicas, de instituições, de campanhas, fosse em dinheiro, em cestas básicas ou kits de higiene pessoal”, e com 200 cestas básicas, por mês, da Prefeitura de São Paulo. Também receberam ajuda com testes de COVID em nível municipal. 

         A instituição filantrópica ainda conta com a ajuda de vários parceiros, como explica seu diretor “na área de incidências políticas, por exemplo, nós atuamos com a ONG Conectas Direitos Humanos, temos na área de refugiados um projeto com a ACNUR, estamos preparando outro com a OIM (Organização Internacional para as Migrações) e temos algumas ações com a Cruz Vermelha”. 

        Desde o começo do ano, já atenderam por volta de 7 mil imigrantes e refugiados, e, hoje em dia, tem por volta de 40 pessoas na Casa, o que representa ⅓ da capacidade total. Além disso, entregam de 50 a 60 cestas básicas a refugiados, diariamente, e ao redor de 60 a 70 que vão, por dia, procurar os serviços do CPMM. “Outras ações incluíram a disponibilização de atendimentos online, de aulas de português a atendimentos jurídicos, psicológicos ou serviços sociais, além de ajudar a completar aluguel, água ou luz daqueles que precisam da ajuda da instituiçã”, fala Padre Paolo. 

        Todo esse esforço e dedicação da instituição foi feito, sempre, visando seguir as normas de segurança e as indicações da OMS (Organização Mundial da Saúde). Foram fornecidos a seus funcionários e a população migrante e de refugiados álcool para higienizar as mãos, máscaras e demais equipamentos e serviços de proteção e higiene.

Especial recupera importantes falas de quem participou de evento em 2019, que comemorou os 90 anos do professor que dá nome à agência de notícias do curso de Jornalismo. Tr echos foram extraídos do material preparado pela equipe da TV PUC
por
por Lara Guzzardi e Victor Naia , fotos de Gabriela Neves (com TV PUC)
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15/11/2020 - 12h

Há um ano acontecia o simpósio “90 anos de Maurício Tragtenberg: Pensar é resistir”. Doris Accioly e Silva analisa o pensamento de Maurício Tragtenberg e suas influências. A professora da Unicamp também vai além: ela busca entender, como Maurício lia e interpretava esses autores, e como, a partir deles, conseguiram interpretar

Doris acrescenta o valor inigualável da pesquisa de Maurício, e a forma única com que ele pesquisava e desenvolvia seu pensamento. A professora comenta, também, como Maurício era generoso e que não se pode, jamais, desprezar algum autor. Mesmo não concordando com conteúdo ou corrente de pensamento, é importante lê-los e debatê-los.

Maurício demonstrava grande interesse pela figura ambígua de Walter Rathenau, e procurava estudá-la com mais profundidade. Tragtenberg, criticava a burocratização no exercício do poder.

Pedro Porcino conta como conheceu Mauricio Tragtenberg em 1984 em pleno processo de redemocratização e, claro, como ajuda que Maurício deu a ele e toda classe sindical foi valiosa. Mais de 30 anos após os eventos, Porcino, nos faz relembrar como os ensinamentos de Maurício e suas visões na classe sindical faz ainda mais sentido nos dias atuais. Maurício conseguia unir o meio acadêmico com a prática. Eis um exemplo: Maurício não escrevia apenas para os alunos e a academia, ele escrevia para os trabalhadores, escrevia para todos.

Lucia Bruno comenta como a visão de Maurício Tragtenberg sobre associações, sindicatos, movimentos sociais - e como suas dicas fazem sentido hoje, analisando o movimento social e sindical que perdeu força. Maurício participou ativamente nestas questões nos anos 70 e 80. 

A AGEMT relembra a fala do ex-aluno de Maurício, Edson Passetti, formado em Ciências Sociais pela PUC - SP, sobre a forte atitude de contestação do sociólogo.

Durante a fala na mesa "O Pensamento de Maurício Tragtenberg e as Práticas de Liberdade" , Passetti comentou sobre a importância de um mestre no aprendizado dos jovens, principalmente nos tempos atuais, com excesso de tecnologia e informação:

O cientista social contou também sobre a ocasião em que Maurício questionou os alunos em sala de aula se eles já tinham pensado em votar no Movimento Democrático Brasileiro (MDB), partido político brasileiro que abrigou os opositores da ditadura militar brasileira, fazendo-os refletir:

Passetti, no fim de sua fala, diz que acredita ser válida a discussão acerca da presença dos textos de Maurício no programa das faculdades atuais, já que esses teriam muito a acrescentar aos jovens universitários de diversos cursos:

A historiadora, filósofa e professora colaboradora no IFCH da UNICAMP, Margareth Rago, participou da mesa três: O Pensamento de Maurício Tragtenberg e as Práticas de Liberdade do encontro “90 anos de Mauricio Tragtenberg: Pensar é resistir”.

Ela encerrou sua fala sobre seu contato com o anarquismo, grande alvo de estudo do sociólogo, fazendo uma analogia a fim de mostrar como ela enxerga esse espírito revolucionário de Maurício. 

Durante a mesa  "Coleção Maurício Tragtenberg e a Atualidade do Pensamento Tragtenberguiano", o pensador marxista brasileiro e diretor do CNRS na França, Michael Löwy, que conheceu Maurício através de um evento sobre Kafka, comentou sobre a o caráter inovador e corajoso do pensamento de Tragtenberg.

Löwy discorreu sobre a atualidade das ideias de Maurício diante do nosso cenário político atual e se referiu a ele como um verdadeiro remédio contra a ameaça de fascismo: “o pensamento do Maurício é o melhor antídoto para esse veneno”.

Em homenagem aos 90 anos do sociólogo Maurício Tragtenberg, a PUC-SP realizou o colóquio “Pensar é resistir”. O evento contou com a presença do professor titular do Departamento de Filosofia da PUC-SP, Antonio Valverde, que em sua fala expressou admiração pelas ácidas críticas de Maurício à ordem social.

O colóquio “90 anos de Mauricio Tragtenberg: Pensar é resistir” faz um ano, assim como esse mês a morte de Maurício faz vinte e dois anos. A discussão apresentada na mesa quatro foi encerrada pelo professor e diretor-presidente da Fundação Editora da Unesp, Jézio Hernani B. Gutierre, responsável por possibilitar a publicação da coleção Mauricio Tragtenberg.

A AGEMT relembra a declaração de Jézio acerca da importância de manter a obra do sociólogo sempre viva, ao invés de transformá-la em algum tipo de relicário.

 

A pandemia vista por jovens em outros países.
por
Marcela Foresti
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06/11/2020 - 12h

A pandemia foi sentida de diferentes formas ao redor do mundo, enquanto alguns países como a Alemanha estão em sua segunda onda, outros lugares como a província de Newfoundland no Canadá  mal tiveram a primeira. 

A estudante Lacey Marshall de Newfoundland no Canadá teve no total apenas três semanas de quarentena neste ano, isso porque segundo o levantamento feito pelo Governo de Newfoundland a província teve apenas 292 casos de infectados pelo vírus.

Lacey Marshall

 Mesmo com o número de casos baixo e um curto período de quarentena, a   província mantém a recomendação de uso de máscaras e distanciamento social.   As aulas voltaram presencialmente em algumas escolas, mas Marshall ainda   está com as suas online.

 Ela não está mais isolada em casa, mas evita ao máximo encontrar diferentes   grupos de amigos na mesma semana “Prefiro me reunir sempre com o mesmo   grupo de amigos e com máscara”.

 Para a canadense o isolamento foi momento de organizar a vida e realizar   atividades diferentes “Me senti mais feliz do que antes durante o isolamento, a saudade de contato físico é pequena”.

Ao contrário dela , as estudantes alemãs Lilli Grandt de Hamburgo e Lisa Spiller de Stuttgart sentiram bastante as consequências da pandemia, a falta de contato com outros gerou desmotivação e afetou algumas amizades. Spiller que tem como hobby principal a escalada, está achando muito difícil não poder fazer a atividade este ano. Lisa Spiller

As estudantes tiveram poucas aulas online, Grandt teve o ano escolar encerrado um pouco mais cedo  que o normal. O calendário escolar na Europa é diferente do Brasil e vai do  mês de agosto até  junho. 

A Alemanha teve seu primeiro isolamento entre Março e Junho e, agora no mês de Novembro, entrou  em sua segunda quarentena que terá o mínimo de um mês de duração.

A diferença entre as duas quarentenas é que a segunda manterá as aulas presenciais e algumas outras atividades básicas funcionando. 

Ao final da primeira quarentena a Alemanha voltou a funcionar apenas com algumas restrições, Spiller viajou para encontrar uma amiga em outro estado e Grandt voltou a sair e ver seus amigos normalmente. A única coisa que mudou nos encontros é o uso de máscara que na Europa é obrigatório em locais públicos e a multa para quem não cumpre a regra pode chegar a dois mil e quinhentos euros.Lilli Grandt

 As três estudantes possuem opiniões diferentes sobre a situação da pandemia, uma vez que as   experiências também são diferentes. Spiller acredita que a fase que está vivendo da pandemia  é   difícil, mas as relações com amigos e família merecem uma maior atenção e importância “É   momento de escolhas difíceis”. 

 Grandt acha o momento complicado pela solidão, mas entende que é algo necessário para   controlar o vírus e para Marshall a situação é de incertezas e aprendizado “As adaptações devem ser feitas por todos, devemos aprender a viver desta nova maneira juntos”.

Diferente destes países, o Brasil segue com números altos de infectados e mortos assim como incertezas enormes sobre as condutas que devem ser tomadas, o país está dividido entre a ciência e a política.

A maioria das escolas e universidades continuam fechadas. Diferente da Alemanha e de Newfoundland no Canadá, aqui não se sabe quando voltaremos a ter aulas presenciais e o ensino remoto está cheio de falhas.