O futebol feminino está em constante evolução e tendo uma visibilidade maior, porém, muitas vezes o esporte para as mulheres ainda é estigmatizado pela sociedade, fruto de um preconceito enraizado que se desfaz em um processo lento. O interesse das mulheres pelo esporte sempre existiu, mas por ser tratado como atividade feita apenas para os homens, foi reprimido por anos.
No entanto, as mulheres que decidiram encarar o preconceito de frente, seguindo sua paixão pelo futebol, enfrentaram muitos obstáculos para consolidar uma carreira séria e reconhecida. Enquanto para os homens a prática desse esporte gerava riqueza e fama, para as mulheres ele gerava preconceito e desprezo. Enquanto eles nunca precisaram provar seu lugar no esporte para terem visibilidade, para as mulheres isso é uma luta constante que mesmo com a evolução do pensamento da sociedade ainda permanece.
Muitas jogadoras que possuem as mesmas habilidades de atletas homens não têm seu trabalho reconhecido e valorizado apenas por serem mulheres. Um grande exemplo disso é a comparação entre o salário da camisa 10 da seleção brasileira feminina, a jogadora Marta, e o camisa 10 da seleção masculina Neymar.
Marta já foi eleita 6 vezes a melhor jogadora do mundo pela FIFA, prêmio cobiçado pelo camisa 10 da seleção masculina, e ainda sim, a campanha, voltada para igualdade salarial entre homens e mulheres no esporte, mostrou que Marta recebe o equivalente a 1% da receita e Neymar durante toda uma temporada.
A equipe da AGEMT conversou com a jogadora Adriana Oliveira, atleta que atuou profissionalmente de 2000 a 2013, que ressaltou o fato de em todos esses anos jogando por clubes como Corinthians, Palmeiras, São Caetano, São Bernardo, nunca ter obtido um patrocínio. “Na minha primeira participação com o Palmeiras, eles só davam a camisa e ponto, nós nem treinávamos no centro de treinamento, não tínhamos direito a usar estádio ou qualquer outra coisa do clube. Então, essa coisa de patrocínio é algo muito recente.
Há também uma grande importância na atuação das mulheres fora de campo, especialmente em modalidades femininas. Ter um modelo feminino para incentivar as próximas gerações de atletas a seguirem no esporte e lutarem por mais direitos é essencial para a constante evolução da modalidade, servindo também como uma inspiração por quem admira e ama o esporte. Adriana reforçou a importância da representação feminina nos esportes. “Eu me considero até mãe dessas meninas, por ser de outra geração e participar dessa evolução ao longo dos anos”, afirmou a ex-atleta.
Mídia e visibilidade
A mídia também tem contribuição para a evolução do futebol feminino, quanto maior o número de notícias mostrando ídolas do esporte e prestigiando seu trabalho maior a visibilidade para o grande público.
Em 2022, o Campeonato Brasileiro Feminino passou a ser televisionado tanto na TV aberta quanto em canais fechados, além de algumas competições como o Campeonato Paulista, transmitirem os jogos pelas redes sociais.
A técnica da seleção brasileira Feminina, Pia Sundhage, em entrevista a AGEMT destacou a importância da mídia e das redes sociais na valorização da modalidade. “É ótimo quando se tem a mídia por perto e eu sempre tento fazer um bom trabalho ao contar histórias, histórias pessoais sobre o quão importante é o futebol é pra mim, além de você ter as redes sociais, que é um papel importante para espalhar boas notícias", salienta a treinadora.
Vencedora de dois ouros olímpicos com a seleção feminina dos Estados Unidos em 2008 e 2012, e prata com a seleção da Suécia em 2016, Sundhage também falou sobre a motivação para seguir na carreira. “Começou com a paixão, sem me importar com os obstáculos e ser persistente, então se você tem essas duas palavras para si você pode superar qualquer tipo de obstáculo. É desconfortável quando você é a única mulher, é desconfortável quando você é excluída em discussões algumas vezes, mas persistir é um começo, mesmo que seja desconfortável sua paixão vai te fazer passar por isso”, disse a treinadora sueca.

Feminina. Foto: Mauro Horita/CBF
A popularização das competições e a visibilidade na mídia, atrai o público para os estádios, a final do Brasileirão entre Corinthians e Internacional, em 24 de setembro deste ano, estabeleceu não apenas o recorde de público do futebol feminino no Brasil como na América do Sul. Com um público de 41.070 pessoas na NeoQuímica Arena, o Corinthians bateu o Inter por 4 a 1 e levantou mais uma taça.
E aí, CBF ?
A luta por igualdade e direitos das mulheres deve ter participação também das instituições. Até 2013, por exemplo, não exista nenhum tipo de competição oficial de futebol brasileiro feminino organizado pela CBF (Confederação Brasileira de Futebol). Em 2022, o campeonato brasileiros feminino passou a ter primeira e segunda divisão, um modelo inédito, com 16 times nas duas divisões.
Um passo de cada vez
Nos últimos anos a modalidade tem obtido pequenos avanços, fundamentais para a afirmação das mulheres no futebol. Um grande exemplo disso é o fim da diferença no pagamento das diárias das jogadoras convocadas para a Seleção. Agora, homens e mulheres que atuam pelo Brasil recebem o mesmo valor.
Um acordo entre a empresa de material esportivo Puma e as jogadoras do Palmeiras também é motivo de comemoração. Pelo acordo, as "palestrinas" são patrocinadas individualmente pela marca, algo inédito no futebol feminino.
Esse reconhecimento é importante e essencial para as atletas superarem os obstáculos e continuarem na luta pelos seus sonhos, afinal, o lugar delas é dando espetáculo com a bola nos pés.
Quando a gente é pequeno, ouve dos adultos que pra se acalmar basta respirar e contar até 10. Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez. Assim.
Quando cresci, e passei a acompanhar mais de perto o futebol, comecei a duvidar da eficácia desse método. Às vezes, não dava tempo de contar até 10, o gol saia antes e o grito de emoção se misturava à contagem. Às vezes, contar até 10 soava como contar até mil e o fôlego acabava pela metade.
Mas no dia 2 de novembro, com a derrota do Internacional e o baile do Palmeiras em casa - literalmente, dá pra ver o oposto de tudo isso.
Para qualquer palmeirense, a partir dessa noite, contar até 11 é a melhor sensação de todas! E contar até 10, não é mais o que era antes. Já para o resto… Que eles continuem contando até 8, no máximo. E que aos de verde caiba contar até 11. Não para relaxar, mas para comemorar!
Contar até 10, agora, não é mais suficiente. É preciso contar até onze.
É preciso encher duas mãos e acrescentar mais um dedo. Colocar mais uma taça naquela sala de troféus. É preciso entender que, se em 2018, contar até 10 bastava, agora, em 2022, não basta mais.
O que acalma mesmo um torcedor alviverde hoje é contar, mais e mais - e não só títulos!
Entender que a tarefa do palestrino também é a de contar sobre ídolos, academias, sobre crianças de 16 anos que jogam como adultos e de adultos com tamanho de criança que jogam e encantam.
Aquela mesma menina que eu era e que até aqui contava até 10, hoje é uma mulher que comemora poder contar até onze. O que soava como um castigo de infância, uma espécie de bronca em momentos de birra - respira! Conta até 10-, agora é um prazer inestimável.
Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez, ONZE.
Sinto muito mãe, mas não vou ensinar meus filhos a contar até dez quando estiverem nervosos. Vou ensinar-lhes o prazer de torcer pra um time que pode contar até onze!
Palmeiras: 11 vezes campeão brasileiro!

O futebol é o esporte mais consumido do mundo. Segundo relatório da FIFA (Federação Internacional de Futebol) metade da população mundial assistiu a copa do mundo realizada em 2018 na Rússia (cerca de 3.5 bilhões de espectadores). A competição feminina ministrada pela mesma entidade contou com audiência superior a um bilhão de pessoas, um aumento de 30% em comparação a anterior. Esses números compravam a popularidade e o alcance do esporte.
No Brasil não é diferente, conhecido como país do futebol, quase metade da população tem interesse no jogo e um a cada seis diz frequentar estádios, dados da ESPN Brasil. A popularidade é um fato e a prática movimenta bilhões de reais no país. Os clubes profissionais contam com estruturas pomposas, repletas de profissionais qualificados. Porém, a divisão entre gêneros dentro do quadro de funcionários está longe de igualitária, em matéria publicada pelo Metrópoles em agosto de 2020 aponta que 85% das comissões técnicas do futebol feminino são compostas por homens, no masculino esse número ultrapassa os 95%.
Alguns pontos podem explicar essa discrepância, em território nacional as mulheres foram proibidas de praticar futebol por 38 anos (1941 a 1979) devido às condições de sua natureza, escancarando o machismo estrutural que o gênero sofre não só no esporte, mas em todos os âmbitos sociais.
Após se deparar com a pesquisa do Metrópoles, Maria Victoria Poli Cipeda (chefe de conteúdo da 90 min) explicou: “Esses números assustam, mas não surpreendem aqueles que conhecem o meio” seguindo com o questionamento “você conhece quantas mulheres trabalhando no futebol masculino, não digo apenas do seu clube do coração, mas no contexto geral nacionalmente? Consegue citar nominalmente alguma”? Ela completa “existem profissionais mulheres altamente qualificadas para toda a hierarquia que um clube de futebol necessita, mas só as encontramos em funções indiretas a tática ao campo e bola, como nutricionista e massagistas, você nunca vê uma mulher comandar o corpo técnico ou ser diretora de futebol de uma agremiação masculina”.
Entre os 3 principais times da capital paulista (Corinthians, Palmeiras e São Paulo) trabalham mais de 130 profissionais em diversas áreas, desde assessoria de imprensa até técnicos, apenas 12 são mulheres, com o Corinthians totalizando mais da metade delas. Os sites oficiais validam as falas de Maria Victoria Poli, nenhuma participa do chamado “corpo técnico” dos times citados, composto pelo técnico, auxiliares e diretores de futebol.
(comissão técnica da seleção masculina de futebol. Crédito: Lucas Figueredo/CBF)
Matérias de cunho sexista, falas machistas de profissionais do meio, proibições passadas foram responsáveis por transformar o futebol numa área ainda mais tomada pela presença masculina nos cargos de liderança, problema da sociedade como um todo. Alguns movimentos, dentro e fora do futebol, estão contribuindo para quebrar esse paradigma, portais voltados a divulgação da mulher no futebol como “dibradoras” ou “ESPNW” servem como fonte de notícias imparciais, além de referência para outras mulheres que não se sentem representadas.
“O caminho é longo, mas nos últimos tempos nós mulheres começamos a quebrar barreiras, até na Globo, em TV aberta, temos uma narradora mulher comandando o jogo (referindo-se a Renata Silveira). Precisamos ocupar todas as áreas do futebol, criar referência para as meninas que sonham em se envolver. A sociedade como um todo passa por essa mudança e o futebol não pode caminhar na linha contrária”.
(Renata Silveira – Foto: João Cotta / TV Globo)
O futebol é o esporte mais famoso do mundo, é praticado praticamente em todos os países do mundo, trazendo alegria para muitas pessoas, e ainda pode trazer um sentimento de esperança e diversão para populações no meio de um conflito interno ou uma guerra de alta escala.
Isso está ocorrendo na Ucrânia, que está em guerra com a Rússia, ainda ocorrendo futebol profissional e disputando competições europeias.

Para isso ser possível precisou-se esperar o andamento da guerra logo após 9 meses,23 de agosto, a competição voltou para ficar. Mudando o regulamento do campeonato local, Premier Liga Ucraniana, implementando novas regras de segurança como a proibição de público, para segurança devido a possibilidade de um bombardeiro.
As equipes ucranianas disputam os torneios do continente europeu; Champions League( Shakhtar Donetsk), Europa League( Dynamo Kiev) e Conference League( SK Dnipro-1, Zorya Lugansk, Vorskla Poltava).Esses jogos internacionais estão sendo realizados em países vizinhos, principalmente na Polônia, pois a UEFA não autorizou a realização dos jogos no território ucraniano .

O principal motivo para a volta do futebol foi para trazer alegria para a população ucraniana e assim motivar os soldados a lutarem pela sua nação.
Nem tudo foi flores para a volta deste campeonato, pois 2 equipes tiveram que ser removidas do campeonato por terem fechado as portas por causa da distribuição da infraestrutura dos clubes, os times foram Desna Chernihiv e FC Mariupol.

Ocorreu também uma grande saída de jogadores estrangeiros que resultou em um grande impacto na qualidade dos elencos ucranianos, como ocorreu com o Shakhtar Donetsk que na temporada passada possuía um quartel de 14 estrangeiros( 12 brasileiros)e 2 brasileiros naturalizados ucranianos, na atual só há 4 estrangeiros( 1 brasileiro), segundo o Transfermarkt.
Enquanto a Ucrânia luta pela sua soberania e usando o futebol como esperança, a Rússia ainda continua com seu futebol profissional como se nada estivesse ocorrendo, apesar do país ter sido expulso de disputar qualquer competição internacional e também ter tido uma debandada de estrangeiros na competição, claro de proporções bem menores do que ocorreu na Ucrânia.

No próximo sábado (29), em Guayaquil, no Equador, Flamengo e Athletico-PR lutarão pelo título da Copa Libertadores da América de 2022. A competição terá a terceira final consecutiva apenas com clubes brasileiros, um recorde — mas não o único recorde superado durante os últimos seis anos na Libertadores.
Um processo de dominação do torneio, iniciado em 2017, parece ter atingido seu auge (ou algo muito próximo disso). Em toda a história da Libertadores, brasileiros e argentinos nunca foram tão dominantes.
Para tentar entender os motivos dessa supremacia, esta reportagem fez um levantamento que considerou todos os participantes das fases avançadas da Copa Libertadores da América desde sua primeira edição, disputada em 1960, em moldes muito diferentes dos atuais. Foram feitos cinco recortes temporais, que separam bem as diferentes “eras” da competição continental: de 1960 a 1970, de 1971 a 1988, de 1989 a 1999, de 2000 a 2016 e, por fim, de 2017 a 2022.
A ERA DA SELETIVIDADE
Antes de falar sobre os dias atuais, é preciso voltar um pouco no tempo.
No início de tudo, a Libertadores tinha a mesma (simples) premissa da “Copa dos Campeões” da Europa: reunir todos os campeões nacionais numa disputa pela soberania no continente — o que justificava o número de participantes bastante limitado. Até 1966, somente o vencedor do campeonato nacional de seu país obtinha o direito de participar da competição. Na temporada de 1967, os vice-campeões nacionais foram introduzidos, mas a fórmula de disputa se manteve: num período de 11 anos entre 1960 e 1970 (tendo 1969 como exceção, quando teve quartas com um clube de cada país), as fases de mata-mata existentes na Libertadores eram somente semifinais e finais.
Os brasileiros demoraram a se estabelecer no torneio, que teve domínio argentino e uruguaio. Durante essa “era”, 77% dos clubes que disputaram as finais da Libertadores pertenciam aos países platenses; o Brasil foi o terceiro com mais representações: 4, ou 18% do total.
O modelo de disputa foi modificado para a temporada de 1971, trazendo novidades para as fases decisivas da competição. A partir daquela edição, as semifinais passaram a ser disputadas com dois grupos de três equipes; além disso, o atual campeão recebia o direito de começar a competição já nesta fase, enfrentando alguns dos primeiros colocados de cada um dos cinco grupos.
Essa configuração de disputa se manteve até 1987 (com um ensaio de mudança em 1988, recebendo uma “terceira fase” antes das semis, que voltaram a ter quatro equipes) e, como cada grupo contava com quatro times (sendo dois de cada país) a variação de nacionalidades marcou este período da competição: apesar de 40% dos times que disputaram as semis entre 1971 e 1988 pertencerem a Brasil ou Argentina, os dez países representados na Libertadores tiveram ao menos três participações na primeira fase decisiva da competição até então.

"MAIS OU MENOS" COMO HOJE
A Libertadores assumiu o formato de mata-mata que conhecemos hoje, com oitavas, quartas, semis e finais, a partir de 1989. As fases anteriores, no entanto, foram recebendo cada vez mais clubes com o passar dos anos.
Entre 1989 e 1997, cada país recebia duas vagas na competição (três para o país com o atual campeão, que entrava nas oitavas). Com a chegada dos clubes mexicanos, em 1998, a competição passou de 21 para 23 participantes e criou uma primeira fase, na qual os representantes mexicanos enfrentavam os venezuelanos em busca de duas vagas na fase de grupos.
O sistema de disputa só foi modificado em 2000, quando a Libertadores passou a ter 32 equipes; os países participantes receberam uma vaga a mais — indo de duas para três -, com exceção de Brasil e Argentina (que foram de duas para quatro) e de México e Venezuela (que mantiveram as mesmas duas vagas).
Em 2005, um novo aumento no número de vagas entrou em vigor e, com ele, o sistema de “pré-Libertadores” ao qual nos acostumamos, com confrontos ida e volta para definir a classificação à fase de grupos. Brasil e Argentina tinham cinco vagas, enquanto todos os outros países tinham direito a três, totalizando 38 vagas.
Algumas mudanças relevantes aconteceram no início da temporada 2017. Antes disputada durante o primeiro semestre, a Libertadores passou a ser jogada por todo o ano e, por conta de divergências de calendário, os clubes mexicanos não puderam mais participar da competição. Além disso, ocorreu também o mais recente “boom” de vagas, subindo o número de participantes de 38 para 47; duas novas fases preliminares foram introduzidas — para acomodar tantos clubes sem precisar mudar o formato de disputa de fase de grupos e mata-matas tradicionais.
Com um grande número de vagas disponíveis e a esperada dominância dos clubes dos países mais ricos, que se acentuou no período, bizarrices como o Brasil conseguir nove vagas (2022) na competição passaram a ser normalizadas.
A DISCREPÂNCIA ATUAL
Desde 2017, só uma final de Libertadores não teve um clube brasileiro: a edição de 2018, que teve simplesmente um Boca Juniors x River Plate, o maior clássico argentino. Todas as finais tiveram apenas clubes brasileiros e argentinos nos últimos seis anos.
Os dados das fases de mata-mata, para além da grande final (que passou a ser disputada em jogo único na edição de 2019), são assustadores. Não é exagero dizer que a Libertadores, principal competição da América do Sul, se tornou a Copa Brasil-Argentina.
Nunca argentinos e brasileiros foram tão dominantes na competição continental — não em todas as fases de mata-mata, pelo menos. Desde 2017, a fase de oitavas de final da Libertadores contou com 96 participantes; 65 deles brasileiros ou argentinos, o que representa 68% do total. Esse número representa um claro aumento em relação aos 39% registrados entre 1989 (quando a fase foi inserida no mata-mata) e 2016.

Os dados das oitavas de final, porém, representam a menor predominância numa só fase. Nos últimos seis anos, 39 dos 48 participantes das quartas de final da Libertadores foram de Brasil ou Argentina, 81% do total. Se comparado com outros recortes de tempo, o número é muito maior que os 56% registrados entre 2000 e 2016 ou os 39% do recorte de 1989 a 1999.

Terceiro clube com mais participações em fases avançadas da Liberta no levantamento desta reportagem, o Nacional-URU só passou das oitavas de final em uma única oportunidade no período (2020); seu maior rival Peñarol, quinto colocado nesta mesma contagem, não participou do mata-mata da competição nenhuma vez.

As semis (junto da final) apresentam os dados mais impressionantes: desde o “boom das vagas” em 2017, 92% dos participantes nesta fase de mata-mata — ou 21 dos 24 times — foram brasileiros ou argentinos. É, por larga margem, a maior representação desde a primeira edição da competição: a média histórica desta fase, desconsiderando os últimos seis anos, é de 47% dos clubes pertencentes a Brasil ou Argentina. A dominância foi crescendo com o tempo, atingindo 59% entre 2000 e 2016, mas foi acelerada de forma incrível nos últimos anos.


BUSCANDO UMA EXPLICAÇÃO
Existe algo que pode explicar tamanho domínio da dupla Brasil-Argentina? Apesar de não existir uma resposta certa, existem algumas teses: uma delas defende que a questão predominante é, essencialmente, financeira.
Brasileiros e argentinos detém os clubes mais ricos na América do Sul desde que a Libertadores foi criada. A distância financeira para os outros países, porém, só vem aumentando, ano após ano. Realizado pela Pluri Consultoria em 2019, o estudo “Gigantes das Américas” mostra que, assim como na sociedade, no futebol o dinheiro se concentra entre os mais ricos. Seis dos 10 times com maior arrecadamento no ano de 2018 eram do Brasil; três, argentinos — o melhor deles, Boca Juniors, ocupou a sexta posição do ranking.

Mas a desigualdade na parte sul da América é evidenciada por outro número: apenas três clubes sul-americanos fora da dupla Brasil-Argentina estavam na lista dos 60 maiores faturamentos do continente americano: do Chile, Colo Colo (26º) e Universidad de Chile (46º); do Equador, o Barcelona de Guayaquil (55º). Em 2018, o arrecadamento do Colo Colo foi de 52 milhões de dólares, enquanto o Flamengo, segundo colocado do ranking, faturou U$149 milhões; o Palmeiras, primeiro colocado, faturou 179 milhões de dólares — quase o dobro da arrecadação de Colo Colo, La U e Barcelona somados (U$110 milhões).
O domínio Brasil-Argentina, causado pela falta de competição financeira à altura, se explica, também, por meio de um marco na Copa Libertadores, justamente no ano de 2017. No ano em questão, em que aconteceu o “boom” de vagas e que inicia o atual recorte temporal da competição, os clubes mexicanos deixaram de disputar o torneio continental.
A saída dos times do México foi extremamente relevante. No período em que estiveram na Libertadores (entre 1998 e 2016), os clubes do México foram os que mais rivalizaram com o TOP2 da América do Sul nas fases avançadas do torneio. Nesse recorte de tempo, apenas Brasil e Argentina tiveram mais participações que os mexicanos nas fases de quartas de final e semifinais.

Além da questão técnica (que deixou de acontecer em campo), a competição entre Brasil-Argentina e México segue ativa no “quesito grana”. Em 2018, oito dos 30 maiores faturamentos do continente americano vinham de clubes mexicanos, de acordo com o levantamento Gigante das Américas — o Chivas Guadalajara, inclusive, tinha a terceira maior receita entre os clubes analisados, à frente de todos os argentinos, com 131 milhões dólares (um milhão a mais do que o Corinthians, quarto colocado do ranking).
Como o dinheiro comanda, a saída de um dos países ricos contribuiu bastante para a dominação argentino-brasileira. O problema (para o lado que fala castelhano) é que, nos últimos quatro anos, a soberania está pendendo apenas para o país do samba e do carnaval.
BRASIL DOMINANDO A ARGENTINA?
Como o campeão da Libertadores 2022 será Flamengo ou Athletico-PR, é garantido dizer que o Brasil terá seu quarto título consecutivo na competição — o quinto em seis anos, depois do boom das vagas. Se o domínio das fases de mata-mata da Libertadores se dá por brasileiros e argentinos, por que os títulos ficam com apenas um dos lados da “parceria”?
Também é uma questão difícil de ser solucionada, mas essa resposta (a mais provável, pelo menos) segue na mesma linha das anteriores: dinheiro. Não dinheiro, simplesmente, mas a junção da explosão de receitas brasileiras à crise do futebol argentino. Vamos por partes.
A situação econômica do futebol brasileiro vem sendo inversamente proporcional à do povo do país nos últimos anos. Enquanto o Brasil voltou ao mapa da fome e convive com o desemprego e a desvalorização do salário mínimo, o futebol nacional jamais movimentou tanto dinheiro em sua história.

Segundo o levantamento “A Evolução das Receitas no Futebol Brasileiro”, realizado pela PLURI Consultoria em 2020, a receita dos principais clubes do país cresceu 250% entre 2010 e 2019, quase o triplo da inflação oficial (IPCA) acumulada para o mesmo período (76,31%). Se descontada a inflação, o número representa um crescimento real de 98% (7,1% ao ano). A receita com direitos de TV e premiações de participação em campeonatos — maior fonte de renda dos clubes brasileiros — cresceu 330% na década passada.
Enquanto isso, no país ao lado, os hermanos vivem uma grande crise econômica, que obviamente assola o futebol. No momento do fechamento desta reportagem, um dólar equivale a mais de 150 pesos argentinos. A situação era diferente em 2015, quando, no fim do governo de Cristina Kirchner, a cotação era de um dólar para nove pesos. Mauricio Macri, ex-presidente do Boca Juniors, assumiu o governo argentino em dezembro daquele ano e, contrariando promessas de campanha, anunciou mudanças num programa que esteve ao lado da ex-presidente Kirchner desde 2009: o Fútbol Para Todos.
Durante 2009 e 2017, o “Fútbol Para Todos” foi um programa estatal argentino que buscou democratizar o acesso ao esporte. Ao vencer uma disputa com o principal grupo midiático da Argentina, o Clarín, o governo federal comprou os direitos de transmissão do campeonato nacional e passou a exibir as partidas na TV Pública Digital, uma rede estatal. Além de facilitar a exibição do futebol, que foi para a TV aberta, os valores de direitos de TV foram distribuídos de forma mais igualitária durante os anos em que o programa esteve ativo.

Coincidentemente — ou não — dois clubes que não estão entre os mais ricos do país conquistaram a Libertadores durante o período do Fútbol Para Todos (Estudiantes, em 2009, e San Lorenzo, em 2014). Macri encerrou o programa em 2017 e renegociou os direitos de transmissão para os grupos Clarín, FOX e Turner, retirando o futebol da TV aberta argentina. O acordo foi selado por cinco anos, tendo um piso de 3.2 bilhões de pesos como valor definido.
O dinheiro com direitos de TV, inclusive, é o mais relevante nessa discrepância econômica entre brasileiros e argentinos desde 2017. De acordo com o Levantamento Financeiro dos Clubes Brasileiros 2021, da EY Consultoria, os clubes brasileiros faturaram R$3,6bi com premiações e direitos de TV no ano passado.
Em matéria publicada em 2020, Carlos Aira, escritor argentino, divulgou dados sobre valores de direitos de transmissão do futebol do país. O último contrato do Fútbol Para Todos, em 2015, repartiu 1.6 bilhão de pesos (185 milhões de dólares, na cotação da época) aos clubes da Superliga; no balanço da temporada 2018/19, o valor repartido foi de 2.6 bilhões de pesos — como o dólar flutuou entre 30 e 65 pesos, fixando o câmbio em 50 pesos, o montante equivale a 52 milhões de dólares. Para se ter ideia, em 2019, o dólar equivalia a cerca de R$4; no ano em questão, o Flamengo, campeão da Libertadores e do Brasileirão, faturou R$329 milhões em direitos de transmissão — o equivalente a cerca de 82 milhões de dólares. Um único clube brasileiro provavelmente ganhou da TV mais do que toda a liga argentina somada.

Em entrevista concedida à reportagem, o jornalista argentino Agustin Troyano disse não conseguir enxergar os clubes de seu país conseguindo competir com os brasileiros a curto prazo. “Não vão poder competir porque a Argentina, hoje, passa pelo seu pior momento econômico. Um futebol que não tem organização, em que um dia se diz que jogam 20 equipes [na primeira divisão], no outro dizem que jogam 30. Isso vai fazendo com que o futebol se desgaste e que mais futebolistas decidam ir mais jovens daqui da Argentina até o exterior, ou a outro futebol”, afirma.
Agustin cita, também, como clubes e federação tentam buscar formas de conseguir dinheiro. “A Argentina não teve um representante nos últimos anos, com bastante força nas finais da Sulamericana e da Libertadores. Se você notar, eles foram, por exemplo, Boca e River — que apostaram na Copa Libertadores e não no torneio local. Apostaram em um torneio internacional que te dá mais poder econômico que um torneio local. Obviamente tudo isso não vem de agora, mas com a pandemia se agravou ainda mais e saiu um pouco mais para a luz. Por isso também a Argentina firmou esse contrato para a Supercopa da Argentina ser disputada na Arábia Saudita. Obviamente pela questão econômica e para vender os direitos televisivos”, afirma o jornalista, que é setorista do River Plate.
Nada parece ser coincidência: na edição de 2022, a Libertadores contou com cinco brasileiros e três argentinos na fase de quartas de final; dentre os cinco clubes do Brasil que chegaram a esta fase, estão as quatro maiores receitas de direitos de TV e premiações: Palmeiras (R$551 mi), Flamengo (R$450 mi), Atlético-MG (R$279 mi) e Corinthians (R$266 mi). 50% de todo o valor arrecadado com TV e prêmios está concentrado em apenas 5 clubes — o São Paulo se junta aos quatro primeiros da lista. A tendência, inclusive, é de que o abismo vá aumentando a cada ano. Em 2021, 13 clubes da Série A do Brasileirão faturaram ao menos R$100 milhões em direitos de transmissão e premiações. Nunca existiu tanto dinheiro à disposição no Brasileirão.

O argentino Felipe Silveyra, também jornalista, destaca que a maioria dos clubes argentinos se aproximam mais dos chilenos do que dos brasileiros, economicamente falando: “Hoje, o futebol chileno lida com orçamentos maiores do que muitos dos times argentinos que participam da Libertadores. Posso garantir que qualquer jogador da Universidade Católica ganha mais do que qualquer jogador de Talleres, Colón ou Vélez”, conta.
“O futebol argentino está cada vez pior. Hoje não há time que jogue bem e seja favorito na Libertadores. River e Boca sim, […] mas não os vejo como candidatos. Logicamente, eles botam medo por causa do nome e do que geram, mas não são mais os mesmos de antes da pandemia. Se você quer saber, acho muito difícil que a Libertadores saia do Brasil”, completa Felipe.