A produção de arte independente no pós pandemia

Como funciona a produção de arte independente e quais foram os efeitos causados pela pandemia.
por
Michelle Batista Gonçalves
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20/04/2022 - 12h

Por Michelle Batista Gonçalves 

É fácil de imaginar a Av. Paulista apenas como um centro comercial e corporativo, com seus edifícios enormes e brilhantes e engravatados andando apressados de um lado para o outro; com a constante pressa que nos atravessa ao andar por suas ruas e alamedas em dias úteis, ouvindo buzinas e observando pontos de ônibus cheios de pessoas com fones de ouvido.

Ademais, a Av. Paulista – uma das mais famosas avenidas do Brasil – é bastante conhecida também por sua abertura a pedestres aos domingos e feriados. Das 8h às 16h a circulação de carros fica restrita e os 2,8 km que compõem sua extensão são pintados de pessoas em sua maior diversidade.

A rua – que costuma remeter a carros, trabalho e a correria do dia a dia – é agora ocupada por pessoas com skates, patins ou simplesmente caminhando sem grandes preocupações. Além da mistura de pessoas com diferentes idades, crenças, classes sociais e etnias, a avenida – que participa do Programa Ruas Abertas, instituído em 24 de Junho de 2016 – também é tomada por variados espetáculos a céu aberto.

Um exemplo da exposição de arte que ocorre em nossa selva de pedra é encontrado em um dos vãos do Museu de Arte de São Paulo. Anderson, poeta de 31 anos – autor do livro O Balaio da Dislexia – e formado em Recursos Humanos, presenteia nosso olhar com seus macramês, pendentes, cachecóis para plantas e poesias em tela.

Ele explica que, depois de concluir a graduação e começar a trabalhar em sua área de formação, problemas como ataques de ansiedade e pânico se mostraram frequentes, o direcionando para um outro lado: a rua.

O processo de ir para a rua expor suas criações começou com uma indigestão – um incômodo – e, conversando com um amigo que também havia saído do escritório para difundir sua arte pelas ruas de São Paulo, o poeta e artesão percebeu que este seria um melhor caminho.

O pulsar da rua, o calor do contato direto, as trocas de vivência e o poder de espalhar sua arte e criação não só com brasileiros, mas também com pessoas de todo o mundo, é um dos principais motivadores para que Anderson continue expondo seu trabalho apesar da brutal queda de vendas provocada pela pandemia.

Carica – como prefere ser chamado – é outro responsável pela movimentação do espaço artístico e independente na Av. Paulista. Caricaturista, o peruano se estabelece próximo à estação Trianon-Masp e fica posicionado em frente a uma das lojas Marisa da região. Ali é possível ver seus trabalhos já prontos e observá-lo enquanto desenha diversas pessoas. Pelo valor de R$ 10,00 você sai, em pouco mais de 15 minutos, com uma caricatura fresquinha!

Já há três anos no Brasil, a rua é o point de Carica para produção de seus desenhos. Para ele, fazer caricatura é como jogar ingredientes em um liquidificador e aguardar até que uma vitamina seja feita. Viajando de país em país, essa foi sua forma de ganhar dinheiro.

A queda de vendas e a pouca circulação de pessoas pela avenida turística durante a pandemia também impactou sua produção e renda, mas a volta gradual a normalidade o deixa confiante de tempos melhores.

Ainda seguindo em direção a Consolação, é possível se perder em diversos sons: crianças rindo, cachorros latindo, o girar de correntes de bicicleta e, principalmente, música – seja ela cantada ao vivo ou transmitida através de aparelhos de som. É seguindo o ritmo do hip hop que você deve encontrar Sid e seus amigos dançando energicamente.

A música ecoada na caixa de som improvisada movimenta não só o seu corpo como o de todos os que param por algum tempo para observá-lo dançar. Naquele momento, a energia da música é o combustível para queimar tudo o que está reverberando internamente em seu ser. Cada batida, melodia e vibração dá o impulso para que um passo novo seja criado e é isso, sobretudo, que move o dançarino.

Desde 2016 gingando e explorando seu corpo, Sid conta que, apesar de toda a visibilidade e troca com o público, o que traz a maior satisfação em se apresentar e dançar na avenida é a sensação de pôr tudo para fora, de ter passado o dia se movimentando e fazendo aquilo que gosta: criando sua arte, seu movimento e seu templo.

O lado terapêutico da arte também é sentido por Klinsman. Professor e historiador, ele se apresenta na avenida desde setembro de 2021. Seus passos na música começaram ainda criança, cantando num coro e, depois de um tempo apenas lecionando e afastado da arte, ele percebeu que este é o rumo que deseja seguir.

Ele relata que a vida dentro da sala de aula lhe desenvolveu diversas ansiedades que foram crescendo e atrapalhando sua felicidade, mas a música e poder extravasar emoções e sentimentos através de suas letras e melodias foram seu remédio.

Durante a pandemia, uma Paulista mais fria e vazia se apresentou diante dos artistas: carros inúmeros, pessoas afastadas umas das outras e um lugar menos plural, com poucos artistas e circulação. Hoje, aos poucos, as faces sombrias trazidas pelo vírus parecem se dissipar.

Visando seguir com a trajetória artística, Kiu – como é chamado artisticamente – vê grande potencial na exposição independente que realiza na Av. Paulista e é motivado pela satisfação que só a arte pode proporcionar.

 

 

 

 

 

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