Os impactos da pandemia na educação

O Brasil completou um ano de ensino remoto. Para profissionais da área, o combate da covid-19 está sendo ineficiente e não permite a volta das aulas presenciais
por
Fernando Figaro, Giulia Palumbo e Rafaela Correa
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15/04/2021 - 12h

 

Um ano de ensino remoto no Brasil. Foi no mês de março de 2020 que as escolas públicas e particulares de São Paulo fecharam as portas pela primeira vez em anos. Isso se dá em virtude de conter o avanço do vírus. A medida afetou mais de 5 milhões de crianças e adolescentes, segundo o Ministério da Educação. São Paulo foi o primeiro Estado brasileiro a fechar as instituições de ensino e naquele momento pouco se sabia sobre a Covid-19. 

Passado um ano, no que  é considerado o pior colapso hospitalar e sanitário da história, 18 estados brasileiros ainda se veem obrigados a manter o ensino em forma remota. 95% das nações conseguiram retomar o sistema híbrido, contudo,o Brasil não tem nenhum tipo de protocolo para a volta às aulas 100%. A empresa de Fonoaudiologia SIKAF indica que o apoio interdisciplinar nesse momento é imprescindível e a volta às aulas presenciais mesmo que com carga horária reduzida é algo que ajudaria nesse colapso da educação,“ O desenvolvimento foi totalmente  prejudicado, e permanece com muitos déficits. Os anos de 2020 e 2021 comprometem o desenvolvimento escolar e social das crianças. As consequências já estão surgindo e alguns aprendizados não serão recuperados” explicam Katia Tzirnazoglou e Simone Maria, sócias-proprietárias da SIKAF.

A psicopedagoga Quézia Bombonatto reafirma que a falta de interação entre crianças e adolescentes no período escolar pode causar danos cognitivos profundos nos jovens, “mesmo com ações de ensino remoto bem estruturadas, a suspensão temporária das aulas presenciais deverá criar lacunas significativas no aprendizado e consequentemente no desenvolvimento cognitivo dos estudantes”. 

De acordo com a profissional, o isolamento não favorece as nossas formas de vivências e de aprendizagens, uma vez que não passam só pelos aspectos cognitivos, mas pelas necessidades afetivo-emocionais encontradas na sala de aula. Portanto, o isolamento representou uma situação de privação, provocando danos significativos tanto para o desenvolvimento cognitivo quanto psíquico. 

No entanto, Quézia explica que ainda é cedo afirmar que são  danos permanentes, uma vez que as escolas estão buscando formas alternativas para suprir as lacunas no ensino geradas pelo isolamento. Porém, evidências mostram que o impacto é muito maior para aqueles indivíduos que se encontram em situação de vulnerabilidade. Que muitas vezes precisam dividir o cômodo com outras pessoas, não têm internet de qualidade capaz de suportar a transmissão da aula, moram em regiões violentas, e outros motivos, que só dificultam ainda mais o aprendizado e a absorção do conteúdo transmitido em aula.

Quando questionada sobre a volta às aulas, ou ensino híbrido, ressaltou, “tem que se considerar que o retorno às aulas presenciais, ao mesmo tempo que se faz necessário e é desejável, também gera certo grau de insegurança e medo. Para tanto, é importante contar com o preparo psicológico dos vários grupos envolvidos com a escolarização. Isto poderá ser realizado criando-se espaços para trocas, conversas sobre como foram as experiências impostas no período de isolamento, como uso de redes, de mídias diversas, as novas propostas de aprendizagens, as facilidades ou dificuldades que perceberam, os ganhos ou perdas que avaliam que tiveram.”

Em relação às propostas do Ministério da Educação, a psicopedagoga diz ter acompanhado alguns entendimentos feitos entre estados e municípios, por intermediação do Conselho de Secretários Estaduais de Educação e da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação. Foram propostas que visam o desenvolvimento de soluções frente às demandas das escolas e em busca de adequações para o enfrentamento da crise em virtude das perdas decorrentes do fechamento das escolas levando em conta as situações econômico-sociais-culturais diversas por conta da extensão do nosso país, e as desigualdades que se tornaram mais evidentes ainda nesse contexto. 

Sabe-se também, que a dificuldade do ensino remoto atinge professores na mesma medida. Não só os alunos perdem o interesse e sentem dificuldades, como o próprio docente  também se vê em uma situação difícil. É o que Katiane Verazani, bacharel e licenciatura em história, com mestrado em história econômica pela FFLCH-USP, conta. “Na tela só há letras, e a sensação de que falamos para o vazio, ou para ninguém, pois muitas vezes não respondem as perguntas, há um silêncio mortal. Inúmeras vezes tive a certeza de estar sozinha, os alunos apenas faziam login e deixavam suas letras lá, mas não estavam, e numa sala de aula não é possível fazer isso, pois, por mais que os pensamentos não possam ser controlados, eu posso trazê-los de volta de alguma forma, mudando a dinâmica num piscar de olhos.”

Ouve-se com frequência que o ambiente doméstico gera distrações e inconveniências para os alunos, que muitas vezes escolhem não ligar as câmeras, mas Katiane aponta que o mesmo ocorre com professores, “Estar em frente a uma tela, expondo minha casa, minha família, meu universo privado... A invasão de privacidade é o que mais me incomoda e é algo que não se fala e não se pensa a respeito da vida do professor.”  O mesmo vale para o aproveitamento das aulas, enquanto alunos não conseguem absorver o conteúdo ou sentem dificuldades, ela ainda diz que também não sente o rendimento das aulas, estando inserida em um sistema híbrido na escola privada onde trabalha.

A preocupação dos docentes e alunos com o sistema híbrido e remoto, segundo Katiane, está sendo pensada pela equipe das escolas e professores, mas em relação ao posicionamento do Ministério da Educação, não houve medida alguma que tenha alcançado a instituição que ela trabalha “Não mudou em nada minha realidade. Todas as mudanças foram resultados das ações da gestão escolar e dos professores, que agiram bravamente para se adaptar o mais rápido possível à nova realidade.”