Mulheres que investem na bolsa quase dobram em 5 anos

por
Mariana Bocaiuva Ribas
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06/11/2019 - 12h

O mundo dos investimentos é, comprovadamente, dominado pelos homens. No Brasil, menos de 30% dos investidores são mulheres - mesmo que elas representem 51% da população. Mas estudos recentes mostram que os números estão mudando, ainda que lentamente.

De acordo com uma pesquisa da bolsa brasileira, B3, em 2014 havia 137 mil mulheres investindo em ações. Em julho deste ano, elas já somavam 270 mil. Estatisticamente, cresceram 97%, ou seja, quase dobraram em apenas cinco anos.

Tatiane Lima, 31 anos, enfrentava insegurança com sua mudança de emprego: CLT para prestação de serviço. Com a renda maior, ela decidiu estudar sobre o assunto e há dez meses começou a investir na bolsa. O plano da gerente comercial é ter independência financeira no futuro. A jovem está dentro do grupo de mulheres que começaram a investir entre 2014 e 2019.

“Há cinco anos, eu tinha comprado algumas quitinetes para alugar. Vendi em maio deste ano. Era uma ideia de investimento. Meu trabalha com isso e eu me inspirava muito nele para ter uma independência financeira através do aluguel. Mas só tive dor de cabeça e prejuízo, então eu resolvi vender essas quitinetes e aplicar tudo em bolsa, que foi uma das decisões mais certeiras que eu tomei. Hoje, meu investimento está todo na bolsa de valores”, conta Lima.

A jovem buscou estudar o mercado de investimentos. Começou com vídeos e canais de finanças, até chegar nos livros. “Comecei a estudar finanças com o canal do YouTube ‘Me poupe’, da Nathalia Arcuri, e a partir dela eu conheci ‘O Primo Rico’, que fala mais sobre o mercado financeiro. Depois parti para o Tiago Reis. Também estudei nos livros, como o ‘Investidor Inteligente’, de Benjamin Graham, e ‘Guia Suno Dividendos’, do Tiago Reis [e Jean Tosetto]”.

Em 2019, as mulheres representam apenas 21,75% das pessoas físicas que compram ações, de acordo com a B3. Já no Tesouro Direto, programa do Tesouro Nacional em parceria com a B3, que vende títulos públicos federais para pessoas físicas, as mulheres são 30,3%.

É o caso da médica Ana Carolina Leghi, 31 anos, que notava a perda de dinheiro sem motivos e, após quitar seu carro e zerar seus cartões de crédito, decidiu investir no Tesouro Direto há mais ou menos um ano. “Não invisto na bolsa, ainda, porque requer estudo. Sou uma investidora mais conservadora. Não quero riscos, pelo menos por enquanto. Se ainda não sei como fazer bem correto, prefiro não fazer”, diz Leghi, que, assim como Tatiana, começou a investir  vendo canais do YouTube, como o de Nathalia Arcuri.

Finanças para mulheres

Carol Sandler, fundadora do site "Finanças Femininas"
Carolina Sandler, fundadora do site "Finanças Femininas"

Apesar do número crescente de mulheres que investem em renda variável, no Brasil, o aumento de investidores do sexo masculino é ainda maior, de 123% entre 2014 e 2019. Neste contexto, surge um novo modelo de conteúdo online de finanças para mulheres, que influencia no aumento do interesse feminino na área.

Formada em jornalismo e relações internacionais, Carolina Sandler, 35 anos, estudou economia, microeconomia e comércio exterior. Após notar a dificuldade que as mulheres têm em se inserir nesse mercado e a inexistência de projetos brasileiros pensados para a mulher na área de finanças, decidiu criar o site  “Finanças Femininas”, onde compartilha conhecimento do mercado financeiro direcionado, especialmente, para as mulheres.

“Eu decidi montar o “Finanças Femininas” no momento em que percebi que o conteúdo para mulher na internet era moda, beleza, casamento e maternidade. Me apaixonei pela causa, e abracei esse papel de ser uma tradutora, em entender o mercado financeiro e explicar para quem não conhece”, afirma Sandler.

A especialista explica o motivo pelo qual o mundo do investimento é predominantemente masculino, e a dificuldade da mulher em se inserir nesse mercado. “O homem teve historicamente o papel de provedor, então ele ganhava o dinheiro e tem a responsabilidade de cuidar dele. Temos que parar para pensar que a mulher teve direito a ter um CPF e uma conta bancária individual, sem precisar da autorização do pai ou marido, no final dos anos 60.”

“Tudo começa no momento em que as mulheres crescem no mercado de trabalho, [começam] a ganhar o seu próprio dinheiro e ter a responsabilidade de cuidar dele, faz pouco tempo em termos históricos. Até então, os clientes e funcionários de todas as corretoras eram homens, as mulheres eram no máximo secretárias”, pontua Sandler.

A estudiosa também comenta sobre o peso que a construção social tem sobre isso. “Estudos mostram que as meninas começam a achar que são piores em matemática do que os meninos a partir dos cinco anos. Então você tem meninas que gostam de matemática, e de repente deixam de gostar por achar que aquilo é algo de menino. Essa construção social que precisa ser desmontada.”

“As mulheres não se sentem confiantes para lidar com seus próprios investimentos, é o que eu mais ouço: ‘eu tenho medo’, ‘eu não entendo nada’, ‘eu sou ruim de dinheiro’. Aí aquele momento em que a mulher pesquisa, ela tem a percepção de que ela tem que ter o controle das suas próprias contas, de que isso não pode ser responsabilidade de outra pessoa”, finaliza Sandler.