Estética midiática reforça a ocorrência crescente de transtornos alimentares

Há tempo que a mídia mostra sua influência no hábito alimentar da população
por
Larissa Isabella
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25/05/2022 - 12h

Por Larissa Isabella Araújo de Sousa

  A população brasileira tem em sua cultura a comida como afeto por muitas gerações. É extremamente comum que famílias se reúnam nos finais de semanas, feriados, datas comemorativas para comerem juntas. A criadora de conteúdo dona da página, Taurinagens, Flávia Antunes, 22, comentou sobre a comida em sua vida, “Os alimentos são mais do que só o valor nutricional, tem muito a ver com cultura, com costume, com momentos afetivos, eu tento trazer muito isso no meu insta… A comida sempre foi relacionada a momentos bons e isso ficou ainda mais intenso pra mim na pandemia sabe, basicamente organizava minha rotina em torno do que eu ia comer no meu dia, eu ficava animada se ia pedir algo”.

 A expressão “A cozinha é o coração da casa” é bastante difundida no Brasil justamente por se tratar do local onde muitas famílias se reúnem e passam bons momentos em conjunto. A comida sempre esteve envolvida nestes momentos, mas com a mudança imposta pela sociedade muitas pessoas deixaram de ver essa importância também afetiva nos alimentos. Por muitos anos a mídia focou muito em mostrar dietas radicais e por vezes com restrições de alimentos que são eleitos como malignos. Juntamente com as dietas restritivas desnecessárias, há grande apelo popular relacionado a chás milagrosos e remédios emagrecedores. De toda forma, a mídia sempre esteve muito relacionada em incentivar tais comportamentos.

 Durante os anos 90 e 00 a televisão teve grande influência negativa nos comportamentos alimentares da população, principalmente em garotas que só viam representação de mulheres extremamente magras e queriam alcançar aquele padrão corporal extremo. Em muitos filmes, inclusive, a representação de garotas que tinham uma má alimentação nutricional visando somente a estética era muito comum, podendo resultar futuramente até mesmo em transtornos alimentares. Os transtornos alimentares têm crescido drasticamente nas últimas décadas, atingindo principalmente adolescentes do sexo feminino. Mesmo que inicialmente a mídia não tenha relação direta com o desenvolvimento de tais transtornos ela está envolvida no aumento da comparação entre os corpos reais e os mostrados na internet e televisão.

A nutricionista comportamental, Gabriela Ortiz, 24, falou sobre o distúrbio de imagem “Li um estudo que o distúrbio de imagem, que é relacionado aos transtornos alimentares, subiu muito nos últimos 10 anos e é basicamente o mesmo tempo que as pessoas começaram a usar mais o instagram, então tem uma correlação”.

"Os níveis de cirurgias plásticas aumentaram muito nos últimos anos e há estudos que falam da correlação entre o aumento da procura de cirurgias e o aumento de filtros do Instagram. Acredito que sim, isso pode causar um distúrbio de imagem, isso pode causar uma comparação”, diz Ortiz.

Levando em consideração todo o contexto da relação entre televisão e alimentação, podemos então analisar dois principais pontos: primeiro a forma como mudou a relação da população com a comida; e depois a mudança da visão da população em relação a dietas. A comida passou a ser mal vista por diversos grupos, principalmente as mulheres, que muito afetadas pela mídia, mudaram a forma como entendem a alimentação em busca de um padrão estético. A comida passou de ser um ponto importante na vida, um momento de afeto, satisfação, para se tornar a vilã, sendo consumida de maneira equivocada sem levar em conta a nutrição necessária que o corpo necessita para se manter saudável.

Foi inserido no imaginário de grande parte da sociedade que as dietas são feitas exclusivamente para se atingir objetivos estéticos, mudando completamente o real objetivo de uma dieta criada por nutricionistas capacitados, que são a saúde e o bem-estar. “Quando a gente pensa em dieta restritiva de algum alimento sem necessidade, por exemplo, aquelas dietas prontas de internet, a gente tem um pouco de raiva sendo sincera. Porque muitas pessoas procuram o caminho mais fácil, a pessoa faz uma dieta pronta e ela perde o peso inicialmente, só que ela não consegue manter pois aquilo não é uma coisa sustentável e depois engorda tudo de novo”, comenta a nutricionista. Contrapondo o que se poderia imaginar com o andar da carruagem em relação à toda a indústria formada ao redor das dietas mal preparadas que criminalizam os alimentos, surgiu nas redes sociais um grande nicho que recoloca a alimentação no foco com a devida importância. Neste grupo de criadores de conteúdo tem-se alguns subgrupos como nutricionistas que desmascaram mitos populares ao redor da comida e também personalidades que frequentam e experimentam novos restaurantes.

Assim como a mídia influencia as pessoas, os novos criadores de conteúdo também têm se estruturado como influenciadores, adquirindo cada vez mais seguidores que buscam novos olhares sobre os alimentos. “Eu recebo bastante relatos de restaurantes e pequenas empresas, eu ouço muito assim, que eu posto e eles ficam tão felizes com o retorno que tem… Eu acho que sou uma micro influenciadora, às vezes eu saio e as pessoas me reconhecem, chegam e falam ‘segui uma dica sua’, ‘fui em um lugar por que você postou'”, diz Flávia.

O principal em relação às redes sociais é saber dividir e analisar as informações, porque mesmo que tenhamos uma melhora no conteúdo veiculado e com uma maior facilidade da população em consumir tais informações ainda há uma grande veiculação de conteúdos muito focados em estética ou que distorcem muito os corpos nas redes.  Gabriela Ortiz deixa um comentário sobre nossa relação com as redes sociais, “É preciso tomar cuidado com quem a gente segue, eu sei que é difícil ter um senso crítico quando um nutricionista ou um médico tá falando alguma coisa, automaticamente a gente vê aquela pessoa como autoridade. Mas todo profissional que critica muito um alimento, põe um alimento num pedestal, a gente tem que desconfiar, porque de forma geral não existe um alimento que vai estragar sua saúde, assim como não existe outro que vai salvar. Tudo depende de um contexto saudável”.

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