Por Tamara Ferreira
No dia 10 de agosto de 2024, após o empate por 1 a 1 contra o Flamengo, pela 22ª rodada do Campeonato Brasileiro, Abel Ferreira, técnico do Palmeiras, disparou contra a arbitragem brasileira, classificando o sistema como arcaico e dizendo não confiar no VAR, nos árbitros e nem nas televisões. O treinador declarou, inclusive, que só passaria a acreditar e confiar nas decisões dos lances quando a tecnologia fosse modificada. Na época, era o segundo jogo seguido da equipe contra o Rubro-Negro. No duelo anterior, realizado no dia 7, pelas oitavas de final da Copa do Brasil, Flaco López chegou a marcar, mas o impedimento foi assinalado — decisão contestada por amantes do futebol e, principalmente, palmeirenses, que reclamaram da falta de critério na marcação das linhas.
Parece distante, já que o lance ocorreu em 2024, mas o que não faltam são gols anulados por impedimentos milimétricos que, pela fama da arbitragem brasileira, geram dúvida se estavam irregulares ou não. Muitos desses lances, a olho nu, aparentam ser legais.
Recentemente, Samir Xaud, presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) deu diversas declarações afirmando a chegada do impedimento semiautomático ao Brasil em 2026 para a disputa do Campeonato Brasileiro e da Copa do Brasil. Popularizado na Copa do Mundo do Catar, em 2022, a tecnologia também foi utilizada na Champions League e na Copa do Mundo de Clubes de 2025, além de ser protagonista nos dois jogos da final do Campeonato Paulista deste ano. O sistema usa de 12 câmeras especiais para recriar o lance em 3D e dar o veredito final do lance aos responsáveis pela arbitragem. O VAR que se conhece hoje custa mais de R$ 20 mil por partida, porém, estima-se que o novo sistema vai custar cerca de R$ 100 mil por jogo. Samir declarou no programa Seleção, do SporTV, que é um investimento alto, mas o trata como uma ferramenta importante e necessária para diminuir ainda mais os erros da arbitragem, reforçando sua ideia de transformar a arbitragem brasileira na melhor do mundo.
Sálvio Spínola, ex-árbitro e comentarista da Record, comemorou a utilização da nova tecnologia a partir do próximo ano. Assim como Abel, ele classificou o modelo atual como arcaico, por ser baseado em uma computação gráfica manual, na qual o árbitro de vídeo precisa traçar as linhas azul e vermelha sobre o ombro ou outra parte do corpo. Para Sálvio, o novo sistema é mais preciso, exige menos intervenção humana, garante decisões mais rápidas e confiáveis e, consequentemente, traz mais segurança ao público e aos profissionais envolvidos no jogo.
Paulo Vinícius Coelho, mais conhecido como PVC, jornalista e comentarista da Paramount+ e do UOL, vê o impedimento semiautomático como algo objetivo, já que a máquina será responsável por determinar a distância do atacante em relação ao último marcador, encerrando assim as discussões sobre impedimentos milimétricos e o trabalho manual de traçar linhas.
A 17ª rodada do Brasileirão deste ano também trouxe polêmicas, desta vez, em dois jogos diferentes, com lances muito parecidos, onde um o gol foi confirmado e no outro o impedimento foi assinalado.
Em São Paulo x Fluminense, Ferreirinha marcou de cabeça após cruzamento de Marcos Antônio, ampliando para 2 a 0. Pouco depois, em Cruzeiro x Ceará, Marcos Victor fez o terceiro do Vozão, mas o gol foi anulado. O problema é que, nos dois lances, as linhas estavam praticamente sobrepostas e de acordo com a regra que a CBF tornou válida a partir de 2025, nos casos em que as linhas traçadas (a vermelha, do atacante, e a azul do defensor), ficassem uma em cima da outra, mesmo que o atacante esteja à frente, o impedimento seria desmarcado e o gol validado — o que não aconteceu no gol do Ceará.
Renato Gaúcho, técnico do Flu, não poupou críticas à arbitragem, afirmando que toda rodada há uma polêmica com o VAR. Segundo ele, se a imagem mostrada no telão do Morumbis for a oficial, Ferreirinha estaria impedido e o gol deveria ter sido anulado. Irritado, disse ainda que erros como esse podem custar posições, rebaixar clubes e até definir o campeão.
Já Renata Ruel, ex-árbitra e comentarista da ESPN, destacou que a chegada do impedimento semiautomático ao Brasil é fundamental por sua precisão. Ela lembrou que o sistema atual pode errar até 30 centímetros por lance, margem significativa para jogadas milimétricas. Também ressaltou que as longas análises atrapalham a dinâmica do jogo e que as linhas atuais não passam credibilidade, já que não se sabe ao certo de onde são traçadas e qual é o frame da bola.
Samir Xaud, também declarou, desta vez ao BTB Sports que, a princípio, a entidade arcará com os custos da tecnologia, mas que futuramente o custo passará por um processo de transição para os clubes — o que preocupa, especialmente os de menor expressão, que já enfrentam dificuldades financeiras.
Sobre isso, Sálvio afirma que alguns estádios do Brasil não têm infraestrutura suficiente e não estão preparados para adotar a tecnologia, dependendo inclusive dos clubes que subirem para a Série A do Campeonato Brasileiro. Ele classifica a implementação em todas as fases da Copa do Brasil como algo praticamente inviável, acreditando que só deve ocorrer a partir das oitavas de final ou fases seguintes. O comentarista também ressaltou a necessidade de tempo hábil para preparar os estádios.
PVC destacou também que, além da tecnologia, a entidade precisa investir nos árbitros, oferecendo mais treinamento em diferentes tipos de lances, para que tenham autonomia e segurança — fatores que hoje ainda não são vistos com frequência. O jornalista lembrou que, durante Copas do Mundo, a arbitragem brasileira costuma se sair bem, mas no cenário nacional o desempenho cai. Para ele, não falta qualidade, mas sim confiança.
Uma fala que remete ao lance inusitado ocorrido no jogo de volta entre Corinthians e Athletico-PR, pelas quartas de final da Copa do Brasil, em 10 de setembro. Na ocasião, Diego, árbitro de vídeo, chamou Davi, árbitro principal, para revisar um pênalti marcado a favor do Athletico, afirmando: “Eu tenho o sentimento de que está fora (da área), está bom? Mas é sentimento.”

Davi, com personalidade, rebateu de imediato: “Nós não trabalhamos com sentimento, e sim com imagens.” Como o lance foi considerado inconclusivo, a decisão de campo foi mantida.
Além do semiautomático e da qualificação da arbitragem, torcedores e especialistas defendem a adoção de outras tecnologias, como o chip na bola. Isso evitaria dúvidas em jogadas como o gol de Yago Pikachu, do Fortaleza, contra o Sport, pela sexta rodada do Campeonato Brasileiro. Naquele lance, a bola bateu na trave e quicou próxima à linha, mas sem clareza se entrou ou não. No próprio áudio divulgado pela CBF, os árbitros não chegaram a um consenso, e a decisão de campo foi mantida. Para a comentarista Renata, o uso do chip, junto do semiautomático, é essencial para garantir a precisão e a credibilidade das decisões.
Fato é que a implementação da tecnologia será fundamental para o futebol brasileiro, prometendo transformar o cenário da arbitragem. Porém, ainda será necessário analisar como a CBF conduzirá esse processo, já que os clubes vivem realidades distintas, especialmente no aspecto financeiro. O próprio presidente da entidade já admitiu que o sistema é caro e que haverá transferência de responsabilidade.
Apesar dos desafios, torcedores, atletas e especialistas concordam que a tecnologia é indispensável para reduzir polêmicas. O caminho até 2026, contudo, exigirá investimentos em infraestrutura, capacitação e planejamento. Afinal, como destacou PVC, o objetivo é acabar com discussões que em outros lugares já não existem.