Conexões digitais: O amor verdadeiro ainda existe?

A tecnologia mudou a maneira de conhecer pessoas e de se apaixonar, mas será que ela é tão eficiente quanto o romance à moda “antiga”
por
Catarina Pace
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02/10/2023 - 12h

À medida que a tecnologia avança, outras partes da vida pessoal também são determinadas por ela, e o romance não escapou dessa vez. Antigamente, o romantismo não era algo para se descartar, pelo contrário, os casais tinham um compromisso maior com os valores e família, mas também demonstravam que o amor era real. Com o tempo, tudo mudou, e por bem ou por mal, os relacionamentos também. 

Só o Tinder -- um dos aplicativos de namoro mais usados no mundo -- coleciona mais de 75 milhões de usuários ativos mensais. E suas motivações para buscar relações através de APPs são diversas, inclusive por impulsividade, auto estima ou realmente a de encontrar um namorado ou namorada. Em entrevista para AGEMT, um usuário do Tinder que preferiu não ser identificado, não descarta a opção de conhecer um futuro namorado (a) pelo aplicativo: "Eu acho que as pessoas que estão em um aplicativo de namoro, estão querendo algo mais casual, para matar a carência. Mas mesmo assim, tem pessoas que estão buscando algo mais sério nesses aplicativos. Eu já me relacionei emocionalmente em alguns APPs de relacionamento que deram muito certo, e foi muito bom”, declarou.

Segundo uma pesquisa da Pew Research de 2023, cerca de 50% de todos os adultos com menos de 30 anos já usaram algum site ou aplicativo de namoro. Mas ao longo do tempo, esses apps de paquera foram saturando, principalmente porque os matchs eram baseados em fotos, reforçando um estereótipo. Agora, a maioria deles está usando Inteligência Artificial para que as combinações sejam mais perfeitas. Alguns usam testes de personalidade e de tipo físico para que os filtros fiquem cada vez mais certeiros na hora de dar um match com a pessoa ideal.  

Eles estão cada vez mais inovadores em suas funções de cupido, mas será que é possível que possam identificar uma verdadeira conexão amorosa? O rastreamento de emoções não é algo totalmente fora da realidade, muitas empresas e aplicativos já fazem isso através de relógios que calculam frequência cardíaca, por exemplo. Mas essas ferramentas não conseguem dizer uma das maiores questões para os casais: saber se um relacionamento pode durar. 

Para a estudante de psicologia e usuária ativa do Tinder, Maria Laura Souza, o aplicativo abre portas, mas se mal utilizado, vira um APP de pessoas descartáveis. “Na era do amor líquido e dos relacionamentos virtuais, os indivíduos passam a manter vínculos afrouxados a fim de desfazê-los rapidamente", é um trecho do artigo “O amor nos tempos do Tinder". Algumas pessoas acabam se validando por quantos matchs possuem, ou se as pessoas que elas gostam, curtem ela de volta.”, disse ela. 

Autora: Catarina Pace
Imagem: [Reprodução/LT Latercera] 

Um dos exemplos mais recentes sobre a combinação IA e amor, é o aplicativo Aimm, um tipo de casamenteiro digital que usa uma assistente virtual para realizar avaliações intensas de personalidade antes de “conduzir” o usuário a um casamento. Ele ajuda a encontrar a combinação ideal. Mas como um computador pode saber o que é o verdadeiro amor humano? A paixão pode ser traduzida perfeitamente através de uma máquina? 

Só o futuro poderá dizer. Até hoje, os computadores funcionam através de bases de dados e algoritmos, juntando todas as informações sobre um usuário e suas atividades dentro do aplicativo. Se as inovações continuarem nesse ritmo, não seria impossível um computador identificar um sentimento. 

Os APPs de relacionamento usam uma tecnologia chamada aprendizado por reforço, que aprende com o mecanismo de avaliação dos próprios usuários na plataforma e relatos sobre as experiências nos encontros. Além dele, as plataformas podem adotar ainda, mecanismos de rastreamento baseados no comportamento do usuário dentro do aplicativo, como a frequência de mensagens, tipos de perfis visitados e a duração das interações. Tudo que é captado vai para a base de dados do aplicativo, e cada vez mais, há a chance de acontecer um match muito bem combinado. 

Para o usuário anônimo, os aplicativos de relacionamento não servem para substituir sentimentos e atitudes reais, mas eles vêm para somar. “Eu acho que as coisas acontecem naturalmente mesmo quando é online. Acredito que até hoje existe um tabu sobre conhecer as pessoas online, como se fosse algo ruim, pejorativo. E eu acho que encontrar pessoas na rua, no dia a dia, na vida real, é mais legal, tem uma certa mágica. Mas as relações que se constroem não dependem do como você conheceu a pessoa, a única coisa que muda é essa magia do primeiro encontro, por exemplo. Eu acho que pouco importa como você a conheceu na hora de construir uma relação.”, conclui. 

A educadora sexual e especialista em relacionamentos, Sham Boodram toca em um ponto importante na série O Futuro (Netflix, 2023). Ela diz que "mesmo que a inteligência artificial seja uma ótima ferramenta para ensinar as pessoas a ter boas conexões, ela pode acabar evitando que essas pessoas aprendam a fazer boas relações por si só: Elas tem um programa que vai fazer isso pra elas, ao invés de você mesmo fazer”, diz Sham.

Há um certo medo implícito em ficar dependente dessa tecnologia nas relações pessoais e amorosas, principalmente por ser uma ferramenta frequentemente usada para conhecer pessoas novas e sair do seu próprio círculo social, o que pode ser um grande problema. Esses APPs ainda não são capazes de impedir completamente problemas como encontros frustrados, discriminação, racismo e assédio e podem reforçar pré conceitos que usuários não demonstravam antes deles. 

A tecnologia pode ser vista como um facilitador de muitas tarefas diárias, até para o amor. Maria acredita que eles apresentam certos benefícios como o de iniciar novas conversas e ciclos, e expor pessoas a lugares que seu ciclo social não as levaria. “Um malefício, eu diria a superficialidade das relações, a sensação de que você pode ser descartado e a necessidade de validação por ter o melhor perfil para poder encontrar outras pessoas.”, concluiu a estudante. 

É difícil prever as próximas inovações da IA dentro dos aplicativos de relacionamento, mas que vão facilitar o encontro de duas pessoas  compatíveis, é algo certo. Cada vez mais certeiros nos matchs, os aplicativos podem ser um ponto de partida para um bom romance ou para uma grande decepção amorosa, coisas que só os humanos conseguem sentir, por enquanto. Agora, basta esperar e ver (ou experimentar) qual será a próxima descoberta que as IAs farão no mundo do amor.