Caso de primeira infecção generalizada em Bauru teve cirurgia gratuita

Nos anos 60, quadro grave em criança demorou para diagnóstico e se tornou objeto de estudo
por
Rafael Monteiro Teixeira
|
06/11/2020 - 12h

"Vocês têm fé? Então rezem, porquê nós não temos solução para o caso, não conseguimos descobrir o que ela têm", disse um médico para a minha avó, Luzia Peres Monteiro, 74, sobre o inchaço que tomava o pescoço da minha tia, Luciana Peres Monteiro, 51, quando ela tinha dois anos.

FOTO Luzia Peres Monteiro
Luzia Peres Monteiro (arquivo pessoal)

 

Ela conta em uma festa na sua casa, no final dos anos 1960, havia muitas crianças, todas brincando, correndo e se divertindo, quando de repente viu sua filha caindo, mas a menina continuou brincando como se nada houvesse acontecido. Após um tempo da queda o pescoço da Luciana começou a inchar e escurecer, então, no dia seguinte, minha avó e meu avô, Silas Borges Monteiro, 76, a levaram para o hospital Santa Casa, em Pirajuí.

¨Chegando no hospital, os médicos viram que estava inchado, ficando roxo e com uma febre que não cedia, mesmo com a medicação, decidiram fazer uma junta medica com vários especialistas e, depois de um tempo em reunião, decidiram que o melhor seria transferir a filha para uma cidade com mais recursos",  ela me conta, em entrevista presencial, após sete meses distantes.

Foi, então, solicitada a transferência para Bauru que é a cidade mais próxima à Pirajuí e que possuía mais recursos e infraestrutura na região. "Chegamos lá e fomos muito bem atendidos pelo Dr. Aimar e Dr. Noroacir, médicos e professores do Hospital Universitário de Bauru". Ela relembra dos nomes com carinho e admiração, mesmo após tanto tempo.

Porém, apesar do hospital contar com mais recursos, a equipe médica não conseguiu identificar o motivo do inchaço, que continuava a crescer, ficar roxo e agora a criança tinha com febre chegando a 40º graus e correndo o risco de convulsão. Após várias horas sem resposta, os médicos decidiram fazer mais exames, mas o inchaço que começou no pescoço já se espalhava pelo rosto.

No primeiro exame, o resultado foi inconclusivo, assim como no segundo e no terceiro, enquanto isso ela continuava a arder em febre, aumentando a probalidade de ter convulsões e chegar à morte. "Quando deu cinco horas da tarde eles foram fazer o quarto e último exame, então eu fui até uma capela que tinha no hospital e comecei a rezar." 

FOTO Luciana Peres Monteiro
Luciana Peres Monteiro, hoje (arquivo pessoal) 

Pouco tempo depois os médicos voltaram, e finalmente descobriram que era uma infecção generalizada, que em geral passa depois de 24 horas, mas já faziam dois dias  que ela se encontrava nesse estado.

¨Os médicos falaram que tínhamos que correr contra o tempo para salvar sua vida", ela me fala com lágrimas nos olhos. ¨Quando foi descoberto o que ela tinha, a equipe conseguiu indicar o melhor tratamento, porém acharam melhor que ela não ficasse no hospital sendo encaminhada para casa, onde, durante uma semana ela tomou todas as medicações para tentar fazer com que o inchaço diminuísse.¨

Depois dessa semana em que ela ficou em casa, ela precisou voltar ao hospital para um procedimento cirúrgico.¨Nós a internamos, e então foi feita a cirurgia, agora no hospital Beneficência Portuguesa de Bauru¨ ela diz. Era um hospital particular, mas eles não precisaram pagar nada, pois esse era o primeiro caso de infecção generalizada que havia acontecido na cidade, por isso a demora no diagnóstico da doença. Com isso os médicos que acompanharam minha tia, pediram a autorização de meus avós, para usar o caso como objeto de estudo pela universidade de medicina da região.

¨O médico que fez o procedimento, pediu para assinarmos um papel, dizendo que concordávamos que eles dessem palestras sobre o assunto, levando Luciana para mostrar o que aconteceu e como poderiam tratar. ¨ ela complementa.

¨Depois de uma semana internada e como tratamento, o rosto dela foi desinchando e voltando ao normal, ficando apenas um pequeno inchaço no pescoço",  conta minha avó. ¨Então, quando o rosto já estava quase normal foi colocado um dreno e ela teve que ficar 15 dias com isso para ver se tirava toda a infecção no rosto e no pescoço. ¨

Após 15 dias, o dreno foi retirado e ela pôde voltar a fazer coisas de crianças, que até então estava proibida por conta da necessidade de repouso e cuidados. Hoje o que restou dessa trágica situação de doença foram as tristes memórias de minha avó, que chora toda vez que relata o caso e uma pequena cicatriz em minha tia.

FOTO Cicatriz
Pequena cicatriz resultante da cirurgia (arquivo pessoal)
Tags: