A 15° Retomada Indígena teve início na segunda-feira (30), na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). O evento, que acontece anualmente, é organizado pelo Programa Pindorama, que atua como frente de apoio ao acesso e permanência dos estudantes indígenas na universidade. A programação inicial se estendia do dia 30/10 a 10/11, no entanto, devido a queda de energia no campus Monte Alegre, todas as atividades acadêmicas foram suspensas e a Retomada contemplou somente parte de seu cronograma.
O evento coloca as demandas indígenas à luz do debate. Para além da questão fundiária, o Programa Pindorama chama atenção para a presença indígena nos espaços de produção acadêmica, reivindicando o ingresso e a permanência de seus alunos nas instituições de ensino, sobretudo na universidade. “É preciso pensar como cuidamos dos estudantes indígenas que querem, minimamente, ter acesso à educação. Muitos alunos desistem durante o percurso. A faculdade, o ensino fundamental e médio não estão aptos para receber as comunidades originárias”, destacou Hans Remberto Quelca Yanique, indígena da cultura Aymara, mestre em Serviço Social pela PUC-SP.
Jaci Martins (36), do povo Guarani Mbya, é uma estudante indígena do curso de Ciências Socio-ambientais, que vive em contexto de aldeia na ‘Terra Indígena Jaraguá’ e atua como liderança pelo seu povo. A aluna contou que sua trajetória na educação sempre foi marcada pela resistência contra a ‘xenofobia racializada’ que a desmotivou por várias vezes.
“Eu entrei na PUC para descolonizar o pensamento acadêmico porque a realidade das comunidades é muito diferente do que é contado dos livros didáticos e antropológicos. Jovens e lideranças indígenas devem ocupar os espaços que nos são negados, justamente, para lutarem pela garantia dos nossos direitos e para que a nossa verdadeira história seja contada.”, contou Jaci.
“Eu não tenho que aguentar o espaço, o espaço que tem que me aguentar e entender a minha verdadeira história, desconstruir e começar a alicerçar um conhecimento que seja deseuricentrado e descolonizador. Como podemos nos ver em um espaço que não tem nenhum resquício da nossa cultura e história? Por essa razão, não consigo me considerar um filho da PUC. Eu sou filho da coluna vertebral que é chamada Cordilheira do Andes, de uma cultura milenar que tem muito o que ensinar”, ressaltou Yanique.
A estudante de Ciências Socio-ambientais falou sobre a importância da espiritualidade na cultura indígena: “nós temos um cordão umbilical invisível que nos liga com a terra, temos conexão com todos os seres que aqui habitam. Muitos indígenas que vivem em contexto urbano foram vítimas da pior violência que se pode imaginar: tiveram sua identidade roubada, foram expulsos de suas terras e obrigados a deixarem sua ancestralidade.”
Arte Indígena: espiritualidade, respeito e reconexão
Gabriel Telys (19) é um indígena pernambucano, do povo Pankararé, que participou da Feira de Arte Indígena promovida pela Retomada. Yabitu (filho dos ventos), como é chamado em Guarani, explicou como é a produção de suas artes: “quando eu faço meus artesanatos, respeito muito minha espiritualidade. Primeiro, eu sinto o que eu devo fazer. Quando extraio o bambu, peço licença para os donos da mata. Todo ‘cantinho’ da mata tem um dono, desde as fontes até as pedras. A produção é como uma conversa com Deus, é preciso se conectar com a arte que está fazendo.”