Loyal é um movimento de moda periférica que surgiu no extremo sul da periferia de São Paulo e vem transformando olhares para a moda desde 2017. O movimento une narrativas diversas e vivências marginalizadas, permitindo o reconhecimento do eu através da estética e da representatividade.
A subversidade, neste caso, é se opor a padronização e vestir o que se é. Possibilitar encontrar em si próprio, ser a sua principal referência e, a partir disso, construir narrativas singulares que permitam reconhecimento. Neste caso, a moda está além da estética, mas principalmente como uma expressão em diversos sentidos.
No último sábado (26), aconteceu mais uma ação do movimento, desta vez, através do fomento à cultura periférica no “Estéticas das Periferias”, sediado na Organização não governamental (ONG) Núcleo de Acolhimento e Valorização da Educação (N.A.V.E) Capão Redondo. A ação propõe a coletivos independentes a oportunidade para a realização de atividades artísticas e culturais em seus próprios domínios.
Movimentos que surgem e permanecem na periferia
O Loyal tem como parte de seu fundamento a seguinte condição: que as ações sejam sempre realizadas na periferia. “O Loyal surge na quebrada com público da quebrada, com os produtores, com os artistas, com os modelos de quebrada. A gente não quer se vender enquanto mercadoria da indústria, então o Loyal não é pra galera da ponte pra lá, é pra galera da quebrada”, comenta a idealizadora do movimento, Jaqueline Leal (Loyal).
Jaqueline também explicita que poucas pessoas se viam como criadoras ou modelos, mas a partir de seu primeiro desfile foi nítido o aumento do empoderamento individual e coletivo.
Hoje podemos encontrar diversas marcas periféricas que surgem em decorrência da experiência no movimento e, como exemplo disso, temos as próprias marcas que participaram do último desfile (Apolod, IURI e Loyal). Loyal reitera: “Nós somos um movimento, não é algo isolado [...] nos promover entre a gente, fazer acontecer pra gente.”
1000 trutas 1000 tretas
Todo o espetáculo carrega uma temática a ser abordada e debatida entre os participantes e espectadores, pois reencontramos propostas que possam sugerir a discussão em torno da cultura ou estética periférica. Por isso, a proposta do movimento Loyal é também trazer para suas ações, discussões e celebrações que se relacionam com o cotidiano e as vivências de pessoas da periferia, viabilizando um sentimento real de pertencimento.
Para o último desfile realizado, o movimento decidiu se inspirar na comemoração “50 Anos do Movimento Hip Hop”, Jaqueline Loyal explica: “A gente resolveu abraçar essa temática do Estéticas e de fato trazer essas intervenções sobre o Hip Hop e algumas informações que normalmente a gente não conhece como quem foram os pioneiros aqui, e lá fora”.
Outras intervenções também tomaram conta dos palcos da última edição, como shows de Rap, Breaking, DJ Set e o Graffiti.
O Loyal é um movimento coletivo, é um empoderamento da quebrada
Existem outros movimentos de moda acontecendo em paralelo ao Loyal, cada um em sua especificidade e com seus princípios. Quando questionada sobre o que o move “O Loyal” Jaqueline comentou: “Não é só sobre a roupa, é o modelo que tá ali, é o público que tá na platéia, é o artista que tá se apresentando. A roupa é só um plus, um adereço. O que faz as coisas acontecerem são as pessoas e essa autoestima. Às vezes elas não se enxergam no dia a dia, mas quando vestem uma roupa do Loyal, Apolod ou IURI, se sentem empoderadas”.
“É um movimento muito coletivo, então quando eu vejo alguém da minha família modelando, um vizinho desfilando, um vizinho que nunca vi cantar e ele tá lá no Loyal cantando, isso nos empodera energeticamente. Muitas pessoas ao meu redor se empoderam entre elas [...] é um empoderamento da quebrada, um movimento da quebrada e tudo muito coletivo. Para nós não importa muito o que ta rolando da ponte pra lá. Acho que quando fazemos esse contra-moda, esse movimento, nós nos empoderamos entre a gente.”
Durante sua trajetória, o Loyal também contou com a abertura de um Núcleo de Moda na Fábrica de Cultura do Jd. São Luís, dando início a mais uma atividade que propoẽ o saber sobre o moda e a valorização da criação periférica.
No desfile, conversamos com LIZI (@cherodejasmim) que além de estudante do núcleo de moda, também é modelo e desfilou na Loyal nesta última ação. LIZI comentou sobre sua experiência: “O meu sentimento de desfilar na Loyal foi de grandeza, como um mulher quilombola eu represento muitas pessoas que infelizmente hoje não puderam estar aqui, mas é um privilégio enorme pra mim desfilar na quebrada, com 3 estilistas muito monstros [...] Loyal não é especificamente sobre as peças, mas sim sobre os modelos, sobre corpos, sobre identidade visual, identidade própria, e é muito gostoso se sentir representada por marcas assim.”
A subversidade de vestir o que se é está principalmente no ato de se enxergar enquanto potencialidade e representante da sua própria história. Loyal é um movimento que permite esse encontro através da coletividade e afirmação da própria identidade.