PUC-SP recebe debate sobre jornalismo literário

Mesa contou com a participação dos jornalistas Fabiana Moraes, Nana Queiroz, Bruno Manso e Lucas Figueiredo
por
Victoria Nogueira
|
12/06/2021 - 12h

 

Na sexta-feira, dia 11 de junho, a 43ª semana de jornalismo recebeu a mesa Jornalismo Literário e Suas Versatilidades. Mediada pelo jornalista e professor da PUC-SP, Diogo de Hollanda, o penúltimo debate do evento trazia como convidados Bruno Manso, Lucas Figueiredo, Nana Queiroz, e Fabiana Moraes. Durante a conversa, realizada virtualmente, os autores traçaram um panorama acerca do desenvolvimento de suas obras.

Fabiana Moraes foi a primeira a falar. Vencedora do Prêmio Esso, passou pelo Jornal do Commercio e cadernos culturais de jornais do Recife. Atualmente, é professora na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e colunista do The Intercept Brasil.

Entre os seus trabalhos publicados está O Nascimento de Joicy, transexual que, segundo a autora, dificilmente teria a história estampada em um jornal. “Ela não se parecia com uma mulher como a gente pensa uma, mesmo a  travesti e transexual. Ela não se maquiava, não tinha brincos. Não tinha os marcadores sociais que entendemos como femininos”.

A jornalista salientou a importância de ter trabalhado em editorias menores, como de turismo, e que o momento foi oportuno para, além de se dedicar à composição de textos maiores, questionar os métodos utilizados na elaboração de uma matéria. “A objetividade jornalística não me respondia a uma série de perguntas que me interessavam”, relata. “Se eu precisasse atender a um critério jornalístico, a personagem de Joicy não teria acontecido”.

 

 

"Jornalismo literário não é só um modo de escrever, é um modo de captar a realidade com mais informações, características, dimensões”, afirma Nana Queiroz, autora de Presos Que Menstruam. Na obra, ela expõe as dificuldades enfrentadas por mulheres sob cumprimento de pena nos presídios brasileiros. 

Com passagem pela Veja e Exame, Nana, que também é ativista feminista e criadora da revista AzMina, atualmente se dedica aos livros e projetos sociais. Ela contou se sentir mais uma escritora que jornalista e que a profissão era uma desculpa para fazer literatura. “Todo jornalismo pode ser literário. Não deve, mas pode”.

No debate, Nana relatou o seu envolvimento como repórter no desenvolvimento da narrativa. "Quando eu estava escrevendo Presos que Menstruam, eu entrava nas cadeias que tinham cano de privada estourado na parede. Aquelas mulheres estavam vivendo com o cheiro de fezes e urina em um ambiente fechado, e eu tinha que estar ali com elas. Não tinha como eu reportar aquilo sem todos os sentidos, inclusive o emocional”

Ainda relembrou a apuração de Eu Travesti, outro livro de sua autoria, que traz a história de Luiza Marilac.  “A Luiza me contava as coisas e, para mim, era muito difícil capturar. Então, eu pedi para ela que me fizesse o mais parecida possível com uma travesti e eu ia fazer ponto com ela na rua. A Luiza era a protagonista da história, mas eu senti que só experimentando aquela realidade, eu conseguiria reportar de maneira mais real a vivência dela”.

Segundo a jornalista, “o jornalismo tradicional é o ouvir. O literário abre espaço para os sentidos - para os cheiros, olhares, toque, e para o sexto sentido: da sensibilidade, de se colocar no lugar do outro”.

 

 

Bruno Paes Manso é jornalista e pesquisador. Com passagens pelo jornal O Estado de S. Paulo e revista Veja, integra um grupo voltado aos estudos da violência atrelado à Universidade de São Paulo (USP). Também foi um dos fundadores de A Ponte, um veículo independente de informações.

 

 

Bruno iniciou a carreira dentro da redação, marcada pela competição e busca incessante pelo furo da notícia - o que, relata, se tornou insuportável em dado momento. “A mudança foi quando comecei a entrevistar matadores no final dos anos 90 em São Paulo e eles me contavam porque matavam”. Para ele, o importante era compreender os motivos que levavam o indivíduo a cometer o crime.  “As perguntas que eu passei a fazer que eram diferentes das que eu fazia na redação, e elas passaram a ser minhas questões de pesquisa”.

Autor de A República das Milícias: Dos Esquadrões da Morte à Era Bolsonaro, Bruno se coloca crítico à forma como o tema da violência é abordado. “Isso sempre me incomodou muito - o jornalismo que quer fazer papel de justiça, humilhar alguém, condenar antes de qualquer coisa.” 

Lucas Figueiredo foi repórter da Folha de S. Paulo e colaborador da BBC Brasil. Vencedor dos prêmios Esso e Jabuti, publicou obras dedicadas aos bastidores da política,  em especial durante o período compreendido pela ditadura militar e ao governo de Fernando Collor. No momento, vem trabalhando na produção de biografias. Escreveu O Tiradentes: Uma biografia de Joaquim José da Silva Xavier. Juscelino Kubitschek, presidente do Brasil entre os anos de 1956 e 1961, é o seu próximo biografado. 

Para Lucas, a maneira de contar a história era fundamental para o leitor entender o que estava acontecendo. Relembrando os tempos em que trabalhava na redação, conta “fui percebendo que escrevia uma boa matéria e a pessoa não entendia. Eu comecei a achar que estava fazendo algo de errado”

O jornalista reafirmou a importância da descrição dos personagens e a percepção de que os jornais não eram um suporte ideal para o desenvolver de uma narrativa mais complexa. 


O jornalista e professor da PUC-SP, Diogo de Hollanda, mediou o debate.

 

A corrente do jornalismo literário

O New Journalism, também conhecido como jornalismo literário ou narrativo, se difundiu como gênero de texto a partir da década de 60. Impulsionado por autores como Tom Wolfe, Truman Capote e Gay Talese, é caracterizado pela extensa descrição de fatos e personagens. 

 Truman Capote / Reprodução

Embora o livro permaneça sendo o principal veículo utilizado para a publicação deste tipo de narrativa, ele já se manifesta em outros formatos, a exemplo do podcast Retrato Narrado, produzido pela Rádio Novelo.

 

 

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