Meta de privatizações é tida como inviável até 2022

Após dois anos e meio do mandato de Bolsonaro, nenhuma das 17 vendas planejadas por Paulo Guedes foi feita
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Barbara Cristina
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10/06/2021 - 12h

A agenda de austeridade fiscal prometida pelo atual presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, e pelo ministro da Economia, Paulo Guedes,  não passará de uma simples ilusão.  Faltando um ano e meio para o fim do mandato, a promessa de diminuir as funções e a atuação do Estado em diversas áreas não será concluída.

No início de 2019, quando Bolsonaro tomou posse, o país tinha 209 estatais, seja de controle direto da União, seja ou subsidiárias (ou seja, empresas controladas por estatais como Banco do Brasil, Petrobras, Eletrobrás, Caixa, Correios e BNDES). Desse total, dezessete foram colocadas na mira para a privatização. A lista abrange diversos setores e inclui Codesp, Dataprev e Casa da Moeda (veja a relação completa na tabela).

  • Emgea (Empresa Gestora de Ativos);

  • ABGF (Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias);

  • Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados);

  • Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo);

  • Ceasaminas (Centrais de Abastecimento de Minas Gerais);

  • CBTU (Companhia Brasileira de Trens Urbanos);

  • Trensurb (Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre S.A.);

 

Para a Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados, ligada ao Ministério da Economia, a criação das estatais violou o artigo 173 da Constituição Federal, que determina que a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo. Desta forma, o governo pretende lucrar bilhões com as vendas, abatendo a dívida pública e investindo nas companhias que considera essenciais.

O ministério da economia avaliou uma arrecadação de cerca de R$ 150 bilhões em privatizações  somente em 2020. Os últimos dados disponibilizados pelo governo demonstraram  que, apenas na área de infraestrutura, a venda de ativos rendeu  R$ 16,8 bilhões  desde o início da agenda. A equipe econômica vê potencial para mais. No entanto, para outras privatizações  acontecerem, é necessária uma série de aprovações e análises, podendo durar até dois anos. 

Obstáculos

Foi pela dificuldade de fazer acontecer uma das principais promessas de Bolsonaro na campanha, que o ex-ministro da Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercado, Salim Mattar, deixou a pasta, em setembro do ano passado. Em entrevista à imprensa, ele disse que o Estado não tem interesse na redução de seu tamanho e, consequentemente, em levar adiante o programa de privatizações.

O ministro  Paulo Guedes, por sua vez, tem apontado obstáculos políticos e burocráticos para o avanço das privatizações. "As privatizações não andaram, e eu estou convencido hoje, porque havia um acordo político de centro-esquerda para não pautar. E dentro do governo também havia alguma resistência. Todo ministro gosta de uma empresa que está embaixo do ministério dele", afirmou Guedes, durante evento online da Câmara Internacional de Comércio, em novembro de 2020.

Dentre os ministros que não aprovaram a agenda, um deles seria Marcos Pontes (Ciência, Tecnologia e Inovações), segundo disse Salim Mattar em entrevista quando ainda estava no governo Pontes chegou a divergir publicamente de Bolsonaro sobre a privatização dos Correios, uma das seis estatais sob seu guarda-chuva. Entre as outras, estão a Telebrás e a Empresa Brasileira de Comunicações (EBC). 

Impacto socioeconômico

Entre os questionamentos em torno dos impactos econômicos e sociais das privatizações, a indagação sobre o efeito na população é a mais recorrente. O professor e economista André Paiva analisa uma das possíveis consequências das privatizações de empresas como a Petrobras.

“Empresas que atuam em setores estratégicos, como de energia, petróleo e gás, exercem uma função e têm uma participação muito expressiva. Se formos ver a Petrobras, ela tem uma participação muito grande, então qualquer aumento que ela venha a ter sobre a precificação dos combustíveis, como vem ocorrendo, tem um impacto direto para todo o conjunto da sociedade, principalmente para quem é muito dependente do modal rodoviário e transporte dado a sua extensão.”.

Paiva acrescenta que caso as empresas se pautem apenas para garantir o lucro dos acionistas, elevarão muito os preços dos combustíveis, encarecendo todos os produtos do país, restringindo ainda mais orçamento das famílias que dependem dos transportes baseados em gasolina e etanol.

Em contraponto à agenda de Guedes e aos argumentos do ministro, o professor considera as privatizações de todas as estatais um equívoco. “É evidente que apenas transferir, vender as empresas – muitas delas são amplamente lucrativas em setores muito estratégicos para o desenvolvimento econômico, social e regional do país – se mostra um equívoco que não é  suficiente e realmente necessário para conter a deterioração das contas públicas e da economia. Muito pelo contrário, essas empresas têm um papel fundamental para o desenvolvimento do país.” 

 Até o momento, oito privatizações foram realizadas, sendo quatro subsidiárias da Petrobras (Pasadena, Petrobras Paraguay, TAG e BR  Distribuidora) e quatro vendas de participações de estatais em outras empresas (Neoenergia, Petrobras, IRB e Fgeduc – Fundo de Garantia de Operações de Crédito Educativo).  Das 17 estatais mencionadas acima, somente a Eletrobras está próxima de ser privatizada. No dia 19 de maio, a Câmara dos Deputados aprovou a Medida Provisória que dá continuidade ao processo de privatização. Ela precisará ser votada novamente até 22 de junho para não perder a validade e poderá sofrer alterações. A Eletrobras poderá ser a única das mais de dezenas estatais presentes na agenda liberal do governo Bolsonaro a ser privatizada.