Brasil atinge novo recorde de empreendedorismo

A pandemia levou milhões de pessoas a abrirem seus próprios negócios; desemprego é um dos impulsionadores
por
Isabella Cavalcanti Fonseca e Laura Barbugian
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07/06/2021 - 12h

O Brasil terminou o primeiro trimestre com desemprego recorde. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de desocupação atingiu 14,7% no período, o maior índice já verificado pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. Em relação ao primeiro trimestre do ano passado, quase dois milhões de pessoas se somaram ao grupo de desempregados, que alcançou 14,8 milhões.

Paralelamente – e, em grande medida, como consequência disso –, o país atingiu outro recorde no ano passado: o maior número de empreendedores registrados. Os MEI’s (microempreendedores individuais) cresceram 14,8% em comparação com o ano de 2019, chegando a 10,9 milhões de registros, segundo dados do Portal do Empreendedor, do governo federal.

Uma estimativa feita pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) aponta que aproximadamente 25% da população adulta está envolvida com a abertura ou atividade de um negócio individual.

Em entrevista para a Agência Brasil, Carlos Melles, diretor-presidente do Sebrae, afirmou: “O desemprego está levando as pessoas a se tornarem empreendedoras. Não somente pela vocação genuína, mas pela necessidade de sobrevivência”. De acordo com ele, o cenário pandêmico e a crise econômica gerada pela Covid-19 funcionaram como impulsos para a atividade empreendedora. Já a jornalista Juliana Andrade, da Forbes Brasil, publicou: “Apesar das tendências negativas e impactantes, o brasileiro tem levado ao pé da letra a ideia de que crise gera oportunidade”.

MOOCA BUNS

Alexandre Gitti, de 21 anos, abriu seu negócio em junho de 2020, após três meses de quarentena e isolamento social no estado de São Paulo.

O estudante de Gestão de Políticas Públicas da USP aproveitou seu tempo disponível, uma vez que as aulas estavam suspensas, e se juntou com a sua mãe Rosane para testar uma receita tipicamente americana: os cinnamon rolls. “Eu estava desempregado e fiz algumas receitas diferentes com a minha mãe. Percebi que o que fizemos não existia por aqui, e, como não tinha muita coisa a perder, comecei o negócio”, afirma.

Assim nasceu o Mooca Buns, um empreendimento familiar de confeitaria caseira e aconchegante, com produção e vendas voltadas 100% para o delivery, retirada, encomendas e pronta-entrega. “O mercado de delivery explodiu na quarentena, fazendo muito mais gente vir mais ligada nas redes sociais para pedir comida, o que ajudou demais na divulgação.”

De acordo com um levantamento realizado pela Statista, empresa especializada em dados do mercado de consumidores, o Brasil foi responsável por 48,77% do segmento de delivery em toda a América Latina em 2020. O país registrou um aumento de 975% no número de pedidos durante a pandemia.

O negócio de Alexandre alcança, em média, 150 clientes mensais, podendo sofrer alterações em meses com datas comemorativas, como Páscoa e Dia dos Namorados. Além de seu produto final muito bem executado, sua fama vem também das redes sociais. O perfil do Mooca Buns no Instagram (@moocabuns) conta com mais de 3 mil seguidores ativos e uma forte identidade de marca e de marketing.

Apesar das incertezas, Alexandre planeja expandir o negócio depois da quarentena “Pretendemos abrir uma cozinha maior para delivery e retirada e talvez um espaço de salão no longo prazo”. Por ora, o Mooca Buns continua crescendo dentro e fora do forno.

BETTER BURGER

A Better Burger é uma hamburgueria localizada na Rua Rio Grande do Sul, em São Caetano do Sul, que abriu suas portas em julho de 2020. Idealizado por Vitor Tarifa, 20 anos, o negócio já era sonhado há muitos anos: “Ele nasceu pelo meu amor por cozinhar e por hambúrgueres, que tenho desde pequeno. A necessidade de ganhar dinheiro deu o empurrão que faltava”, conta.

Mesmo com a quarentena, a inauguração aconteceu com o salão e cozinha industrial já construídos e prontos para o público, o que exigiu ainda mais capital: “A quarentena de fato não ajudou, porque, por muito tempo, não passava ninguém na porta. As ruas estavam desertas e o comércio não estava girando. Em compensação, o delivery explodiu e conseguiu equivaler, mas atrapalhou muito, visto que a ideia era um atendimento presencial”.

O negócio, que funciona por delivery, retirada e salão, apresenta uma forte inclinação para o método de entregas, alcançando 5 vezes mais vendas do que no consumo local. Na plataforma iFood, aparece como um “super restaurante”, nome dado aos locais de boa avaliação dos clientes e baixo percentual de cancelamentos e atrasos.

A Better Burger recebe por volta de 30 pedidos diários e seus principais meios de divulgação são as redes sociais (@betterbuger.br no Instagram) e a panfletagem de bairro. “Como abrimos na pandemia, não somos muito conhecidos na região. Nas redes, conseguimos construir um bom trabalho”, diz Vitor.

VILACASABELA

As amigas Regina Cavalcanti, 53, e Cleís Pompeu, 51, se conheceram no mundo coorporativo há mais de 25 anos, onde trabalharam na Alcon Brasil. Depois de dois anos em que ambas estavam desempregadas, decidiram dar vida para uma paixão em comum: decoração e mesa posta.

A VilaCasaBela é um negócio que reúne lugares americanos, guardanapos, trilhos e sousplats de produção própria e venda através do Instagram (@VilaCasaBela), Facebook e WhatsApp.

A disponibilidade de tempo proporcionada pelo isolamento social e pela pandemia possibilitou a consolidação do negócio: “Nós sempre achamos fundamental criar um ambiente e atmosfera agradável para reunirmos família e amigos em refeições. Esse momento reúne e aproxima as pessoas. Com a pandemia, ficamos restritas às nossas casas e refletimos a possibilidade de proporcionar isso para os outros, mesmo de longe”, conta Regina.

Hoje, os clientes alcançam a marca de 15 compras mensais, com alta em datas como Natal, Ano-Novo e Páscoa. Além de trabalharem todos os dias, Regina e Cleís são mães e produzem, todas as quintas-feiras, 100 marmitas para pessoas em situação de rua impactadas pela Covid-19 através do grupo “Marmitas do Amor”, em São Paulo.

Animadas com o negócio, as amigas já traçaram diversas metas para 2021. A partir do próximo semestre, elas passarão a disponibilizar treinamentos para clientes interessados em aprender a arte de montar uma mesa. Além dessa informação em primeira mão, Cleís compartilhou os planos para além da quarentena: “Pretendemos continuar crescendo e expandir o negócio para uma loja física, onde comercializaremos nossos produtos de produção própria e decoração”.