Preso desde 2 de agosto por invasão ao sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Walter Delgatti Neto compareceu ao Senado, nesta última quinta-feira (17), para depor à CPI dos Atos Golpistas. Delgatti afirma ser o hacker contratado pelo ex-presidente da República, Jair Messias Bolsonaro (PL), para criar provas contra o resultado eleitoral obtido nas urnas em 2022.
De terno preto e gravata rosa, o hacker que diz ter recebido R$40.000, 00 da deputada federal Carla Zambelli (PL) para invadir o site do CNJ, chegou à câmara alta do Congresso Nacional dentro de uma viatura da Polícia Federal. O objetivo de seu depoimento, era que ele esclarecesse seu envolvimento com o então ex-presidente, Jair Bolsonaro. Com o semblante calmo e sem a barba ruiva que costuma utilizar, Delgatti acenou modestamente com a cabeça para aqueles que o aguardavam na entrada.
Walter ganhou fama ainda em 2019 ao ficar conhecido como o “hacker da Vaza Jato” após invadir e vazar mensagens de celulares particulares de diversas autoridades envolvidas na operação. Desde então, para Bolsonaro, tornou-se um exemplo de profissional chegando até a ser classificado pelo líder do Partido Liberal como hacker "do bem" e uma pessoa “confiável”. Certamente, Messias não previa, na época, o que viria depois.
Convocado a depor, Delgatti, ao contrário de Mauro Cid – tenente-coronel braço direito de Bolsonaro que também está preso e que chegou a comparecer à CPI, mas recusou-se a falar – colocou a boca no trombone. Walter surpreendeu a todos ao acusar Jair Messias Bolsonaro de ser o principal mandante de todas as ações tomadas pelo investigado.
O deputado federal Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ) foi um dos parlamentares que conseguiu arrancar de Delgatti as respostas mais diretas possíveis. O líder cristão fez sete questionamentos e todos foram respondidos prontamente pelo hacker.
Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ):
— “Quem pediu para o senhor tentar fraudar esse sistema?”
Delgatti respondeu:
— “Carla Zambelli, por ordem do Presidente Bolsonaro. Do ex-presidente Bolsonaro.”
Assim se deram todas as outras seis perguntas, Delgatti apontando e reafirmando o envolvimento de Bolsonaro como principal mandante das tentativas de fraudar o resultado do sistema eleitoral de 2022.
Ao finalizar sua fala dentro do tempo permitido, o deputado Vieira reiterou que a data se tratava de um dia histórico por apontar o envolvimento claro do ex-presidente nos fatos investigados pela comissão.
Já com o senador Sérgio Moro (União Brasil-PR), as respostas do depoente não foram consideradas tão agradáveis e muito menos receberam elogios. O então juiz "herói" da época da Operação Lava Jato travou um embate com o declarante. Ambos com os ânimos à flor da pele.
O político paranaense, ao iniciar sua fala, apresentou aos participantes ali presentes uma imensa ficha apontando todos os antecedentes criminais e processos movidos contra o hacker numa tentativa, é claro, de descredibilizá-lo e deslegitimar suas afirmações ali dadas durante o depoimento.
O hacker, que se mostrou nervoso com a exposição realizada por Moro, se defendeu afirmando:
- “Eu li as conversas de vossa excelência e posso dizer que o senhor é um criminoso contumaz, que cometeu diversas irregularidades e crimes”.
Moro então rebateu:
— “Bandido aqui, senhor Walter, que está preso, é o senhor. O senhor foi condenado, o senhor é inocente como o presidente Lula então”.
Soraya Thronicke (Podemos-MS), que também um dia já foi apoiadora de Bolsonaro, na contramão de Moro, defendeu a legitimidade do depoimento do hacker:
— “Se a pessoa cometeu um crime, isso não está sendo objeto de investigação. O que está sendo investigado aqui é a tentativa de golpe de estado. E, para esse desiderato, o senhor (Walter Delgatti Neto) é sim uma testemunha valiosa para nós”.
A deputada não somente advogou pelas declarações dadas por Delgatti como também exibiu provas de ameaças que o então advogado do hacker vem enfrentando. Thronicke ainda pediu proteção a ambos.
O deputado federal Nikolas Ferreira (PL), com tom de provocação, sua marca registrada, iniciou seu discurso trazendo uma análise do comportamento de Delgatti ao longo do dia durante o depoimento. O hacker, no período da tarde, se recusou a responder os questionamentos levantados por deputados de direita recorrendo constantemente ao seu direito de permanecer em silêncio. Já durante a manhã, com deputados de esquerda, Walter respondeu prontamente tudo a que foi indagado.
Nikolas articulou:
- “De manhã estava todo saltitante, feliz, respondendo todas as perguntas da esquerda, mas de repente, na parte da tarde, não responde ninguém da direita. A famosa testemunha seletiva... a mentira é sua verdadeira profissão”.
O parlamentar, na mesma tentativa de Moro de descredibilizar as declarações dadas pelo hacker, exigiu que um vídeo antigo do interrogado fosse mostrado durante a sessão. Nas imagens apresentadas por Nikolas, Delgatti afirma:
- “Eu tenho planos futuros, caso eu ganhe uma notoriedade positiva com tudo isso, quero me candidatar a deputado federal pelo meu estado. Não tenho ainda um partido definido, mas atualmente, não sei no futuro, se fosse me candidatar hoje seria com um partido de esquerda."
Durante o depoimento que durou quase 7 horas, Delgatti confessou as promessas feitas por Bolsonaro a ele. Entre elas, estaria um indulto garantido caso o hacker fosse preso por ação contra as urnas eletrônicas.
Não obstante, o ex-presidente teria pedido a Delgatti que 'assumisse a autoria' da invasão do aparelho celular de Alexandre Moraes, que também teria sido grampeado e acessado.
Delgatti ainda declarou ter plena consciência dos crimes que estava cometendo contra as urnas, mas informou que por se tratar de ordens do então presidente da República, na época, resolveu obedecê-lo.
Embora esteja detido, por ora, devido a seu envolvimento com a deputada Carla Zambelli, nesta segunda-feira (21), a Justiça Federal do Distrito Federal condenou Walter Delgatti Neto também a 20 anos e um mês de prisão pelos crimes cometidos no caso da Vaza Jato em 2019.