Venda da Eletrobrás deve ficar para 2021

Projeto vem sendo discutido desde o ano passado, mas Covid e eleições complicam execução
por
Francisco Vóvio Segall
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22/09/2020 - 12h

O governo Bolsonaro tem, desde as eleições, a defesa às privatizações como grande modelo econômico para o Brasil. Inclusive com o ministro da Economia, Paulo Guedes, prometendo que ocorrerão pelo menos “três ou quatro grandes privatizações” até o fim de 2020. 

Uma delas provavelmente seria a da Eletrobrás, empresa nacional de eletricidade. Porém, é necessária a aprovação do Congresso e Senado, com os quais Bolsonaro não cultiva uma boa relação, tendo discutido por meio da imprensa com o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, mais de uma vez. Esse desgaste com a Câmara pode dificultar a evolução dessa proposta. Como mostra publicação do Jota, o apoio ao governo Bolsonaro na Câmara caiu cerca de 10 pontos em relação a 2019.  Durante o ano de 2020 esse projeto foi muito discutido, mas, a contragosto da Presidência, no mês de agosto Maia declarou que a privatização da Eletrobrás não iria ocorrer este ano. Outro impeditivo seria a situação de pandemia.

Entretanto, no dia 24/08, a Reuters divulgou que o governo tentava manobrar essa situação, com um acordo para que a tramitação do projeto começasse no Senado em vez da Câmara, o que adiantaria o processo. É importante frisar que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, é do Democratas, mesmo partido de Rodrigo Maia. Em entrevista dada ao UOL,  o senador Eduardo Braga (MDB-AM), que participou de uma reunião no Ministério de Minas e Energia no fim de agosto,  disse:  "O que estamos propondo é criar um mecanismo que vai ter recursos, que vai ter investimento, vai baixar tarifa... e vai gerar de R$ 15  a R$ 20 bilhões  para o Tesouro Nacional". O senador declarou que não acreditava que haveria resistência ao projeto por parte dos senadores.

Entretanto, para surpresa do senador, a movimentação nos bastidores gerou descontentamento entre os parlamentares, de acordo com matéria do Valor Econômico. Existem pontos do texto que ainda desagradam parlamentares.

A perspectiva de privatização da Eletrobrás este ano se torna cada vez mais  improvável, ainda mais com a chegada das eleições municipais, que foram adiadas de outubro para novembro. Apesar dos deslizes no meio do caminho, a perspectiva de que a  privatização da estatal de energia aconteça em 2021 são bastante reais. O próprio Rodrigo Maia se declarou a favor da efetivação do projeto.

Existem também questões constitucionais e acordos internacionais que complicam o projeto de privatização, envolvendo as usinas termonucleares de Angra dos Reis e a hidrelétrica de Itaipu. Para que fosse possível privatizar a Eletrobrás, o governo já reservou cerca de R$ 4 bilhões  para a criação de uma estatal que comandaria as usinas de Angra e Itaipu. Parece contraditório que seja necessária a criação de uma nova estatal para que outra seja privatizada, mas a Constituição brasileira proíbe que energia nuclear seja explorada por empresas privadas. Em relação a Itaipu, o acordo internacional com o Paraguai obriga que seja uma empresa em poder da União a controlar a usina.

Outro ponto dessa proposta é que parte desses R$ 4 bilhões seja usada para a finalização da Usina de Angra 3, cujas obras  estão paralisadas desde 2015. Também existe interesse dos Estados Unidos e da China em financiar parte da construção da usina. Russos e franceses também têm interesse em participar do negócio. Pelo alinhamento do governo Bolsonaro aos Estados Unidos e ao presidente Donald Trump, técnicos do Ministério de Minas e Energia procuram colocar entraves para a participação chinesa no empreendimento, de acordo com reportagem da Folha de S. Paulo publicada em  19 de agosto. A expectativa é que o custo de construção de Angra 3 chegue no valor de R$ 17 bilhões. Um fator importante para o financiamento desse projeto é o fato de que as dívidas de Itaipu vencem em 2023, o que também ajudaria a acumular capital para o empreendimento.

Um ponto a ser levado em conta ao discutir a privatização do setor de energia é o fato de vários países pensarem nesse setor como estratégico, garantindo que boa parte do mercado nacional seja abastecido pelas estatais. Entre os  países que compõem o Brics, por exemplo, China, Rússia e Índia têm a área de  energia com forte presença estatal. Para além desses, França e Coreia do Sul também têm estatais do setor com muita presença no mercado.