A várzea como local de sobrevivência

Mesmo com as dificuldades econômicas cotidianas, o futebol amador ainda é o espaço de celebração e trocas afetivas para algumas pessoas.
por
Gustavo Oliveira de Souza
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23/09/2022 - 12h

O futebol de várzea é uma das modalidades esportivas mais antigas praticadas no Brasil. Antes mesmo de ser profissional, o esporte já era praticado às margens do rio Tietê e se expandiu até a organização de clubes que apenas participam de campeonatos amadores, chamados de campeonatos de várzea. Nas periferias, o futebol de várzea é tratado como uma das principais atividades dos moradores - tanto os jovens que sonham em se tornarem grandes jogares de futebol - quanto os mais veteranos, que dedicaram grande parte de suas vidas aos clubes dos bairros.

Na cidade de Santo André, São Paulo, o futebol amador possui grande incentivo da prefeitura - sendo a cidade fora de São Paulo a possuir mais campos sintéticos (campos com grama artificial), tendo 20 ao todo. O clube mais tradicional da cidade é o Esporte Clube Guaraciaba, fundado no ano de 1956 e que foi cinco vezes campeão da Divisão Especial - maior campeonato de várzea de Santo André. Mesmo após dois anos sem jogar oficialmente, o clube ainda conseguiu se manter devido o incentivo público e ao esforço dos seus torcedores e moradores do bairro que fizeram campanhas de doação para que as instalações ainda pudessem funcionar durante a pandemia da Covid-19. Sua torcida organizada, a Fúria Vermelha que foi fundada em 2015, é quem apoia o time tanto dentro quanto fora de seus domínios e Márcio Santos, um dos fanáticos pelo clube alvirrubro explica sua paixão pelo Guaraciaba:

“Moro a vida toda aqui, e o Guaraciaba sempre fez parte da minha vida. Quando eu era criança, vi meu pai jogando pelo clube e sua dedicação pelo clube me fez ver meu pai de outra forma. Ele trabalhava a semana toda, e aos fins de semana jogava e era muito feliz e foi aí que enxerguei uma das felicidades da vida dele, e desde lá sou apaixonado pelo clube também”.

“Estamos em todos os lugares. Já viajamos pela cidade toda pelo time, e em todos os lugares nós somos respeitados. A força do nosso time se deve muito à nossa torcida também, por que os jogadores se sentem muito motivados quando entram em campo e escutam aquele barulho - tanto dentro quanto fora de casa”.

“A várzea junta tanto o novo quanto o velho. Várias crianças que podiam ter ido para o crime foram resgatadas pelo futebol, e o sonho de muitas delas é jogar em um clube grande, mas infelizmente não são todas que conseguem.”

O poder do futebol de várzea é explicado nas aspas de Márcio. Ele consegue gerar uma identificação da pessoa com o bairro em que ela mora através do time e ele ainda junta vários dos moradores num único propósito - trazendo um senso de pertencimento. Assim como o entrevistado, vários dos torcedores trabalham durante a semana e aproveitam os jogos do time para se reunirem e celebrarem além do esporte, o fato de que ainda estão vivos e podem ter um motivo pra viver.