Várias em uma só

Argela Laya, a mulher que inspira o feminismo venezuelano
por
Luísa Ayres
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08/03/2024 - 12h

O sangue venezuelano sempre fora derramado em regimes ditatoriais. Ainda assim, é este mesmo sangue que faz pulsar a luta social e a sede de mudanças do país. 

Em uma nação com uma democracia frágil, nasce então uma mulher forte. 

Forte ao ponto de sustentar o peso de ser uma mulher negra, pobre, mãe solteira, militante, deputada, vereadora e sobrevivente de um estupro. 

Argelia Laya
Argelia Laya, as multifacetas da grandeza  / Reprodução: Venezuelanalysis

Argelia Laya nasceu em 1926. E com ela o feminismo latino-americano  deu a luz à consciência de outras milhares de mulheres por décadas no país.

Laya vem de uma família composta por uma mãe militante da Agrupação Cultural Feminina e por um pai integrante de guerrilhas populares. Nesta época, se combateu fortemente a entrada do comunismo no país. Inclusive, o Presidente Juan Bautista Pérez foi acusado pelo Parlamento de permitir a circulação do primeiro Manifesto do recém formado Partido Comunista da Venezuela.

Quando completou 5 anos de idade, Argelia Laya vivenciou a prisão de seu pai. Acabou por isso, migrando para um bairro popular e sofrendo com a pobreza. 

Em sua escola, a Escola Normal, pode provar que de normal mesmo não tinha nada. E que tão pouco aceitaria que a normalidade em seguir padrões lhe guiasse. Passou a fazer parte da União de Mulheres Jovens (organização do Partido Comunista), do jornal da instituição de ensino e tornou-se porta-voz de sua comunidade. 

Ao se formar professora, com 19 anos, é vítima de crime sexual - e para piorar, acaba ficando grávida. Preferiu enfrentar então, mais uma vez, os julgamentos da sociedade, ao viver o resto de sua vida com o estuprador. 

Para muitos, um escândalo. Para Laya, liberdade. E foi pelo anseio desta liberdade que lutou durante toda sua vida. 

Em seus primeiros anos no Partido Comunista da Venezuela (PCV), resistiu ao ditador Marcos Pérez Jiménez, organizando mulheres na Junta Patriótica Feminina, lutando pelo sufrágio e divulgando manifestos. 

E nesta mesma data, 8 de março, há 66 anos atrás, participou da comemoração do Dia Internacional da Mulher de 1958, no Novo Circo de Caracas, integrando a delegação do mesmo evento no ano seguinte. Anos depois, mobilizou junto a outras mulheres a Comissão Bicameral para os Direitos da Mulher no Congresso Nacional, criada para fiscalizar o cumprimento da Convenção Internacional para a Eliminação de toda Forma de Discriminação contra a Mulher. 

Hoje, a Escuela Feminista Del Sur Argelia Laya, extende seu legado, oferecendo planos de parto humanizado, programas de formação, pesquisas de gênero e contribuições ao feminismo socialista. A história de Argela Laya continua viva em cada protesto e organização social venezuelana, transpassando gerações e democratizando o conhecimento.