Uso crescente de IA pode significar que estamos perdendo o controle para as máquinas

Algorítimos como RankBrain e conceitos como Machine Learning e Deep Learning colocam o futuro da espécie humana em questão.
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17/11/2021 - 12h

Por Maria Morales

O que há em comum entre as séries que o Netflix indica a um jovem espectador, um carro sem piloto que trafega veloz por uma rodovia no meio do deserto de Mojave, o mecanismo que busca reconhecer facialmente manifestantes nas ruas Hong Kong, a oferta de pizza que pisca no celular todo domingo ao final da rodada de futebol ou o ataque por drone contra alvo alegadamente terrorista em região inóspita do Oriente Médio? 
 
Inteligência é a resposta correta, mas não de qualquer tipo. Todos esses exemplos são aplicações da inteligência artificial, ou, mais simplesmente, IA, também conhecida como AI, do inglês Artificial Intelligence. Trata-se de um avanço tecnológico, que permite a sistemas simularem inteligência semelhante à humana, e tomar decisões independentes, precisas e apoiadas em dados digitais, de acordo com os estudiosos da área. Ela já afeta - e muito - a vida das pessoas.
 
Alguns avanços tecnológicos propiciaram esse protagonismo da inteligência artificial: grandes quantidades de dados e capacidade de analisá-los, também conhecidos como Big Data, são um deles. Outro, importantíssimo, também é conhecido por seu nome em inglês, machine learning, que traduz a crescente capacidade de computadores serem treinados para realizar tarefas pelo exemplo em vez da necessidade de serem programados por humanos. Quando as máquinas ficam ainda mais capazes de aprender, esse processo muda de status e passa a ser conhecido como deep learning.
 
As máquinas analisam grandes quantidades de dados, situações e hipóteses e chegam a suas próprias conclusões, ficando mais espertas com o tempo. É mais ou menos como se elas adquirissem a capacidade de aprender como crianças: o sistema absorve, analisa e organiza as informações (dados) de modo a entender e identificar o que são objetos, pessoas, padrões e reações de todos os tipos.
 
Ao mesmo tempo que trouxe  novas perspectivas de conforto, como poder usar um assistente de voz para acender as luzes ao escurecer, ligar o ar condicionado pouco antes da sua chegada em casa em dias de calor ou mesmo fazer análises sofisticadas e antes inimagináveis sobre a saúde de um paciente, existe um lado sobre máquinas inteligentes que assombra até mesmo grandes cientistas.
 
O renomado físico britânico Stephen Hawking (1942-2018) fez diversos alertas sobre os perigos do avanço fora de controle da inteligência das máquinas: "O desenvolvimento da inteligência artificial total poderia significar o fim da raça humana", afirmou. Ele próprio foi um usuário de avançados sistemas para lidar com sua dificuldade de comunicação decorrente de ser portador de esclerose lateral amiotrófica (ELA), uma severa doença degenerativa. Para Hawking, as formas primitivas de inteligência artificial desenvolvidas até então seriam úteis, mas ele manifestou seu temor em relação a elas.  Para ele, as máquinas serão capazes de avançar por conta própria e se reprojetar em ritmo sempre crescente. "Os humanos, limitados pela evolução biológica lenta, não conseguiriam competir e seriam desbancados."
 
Para além do cenário distópico, a inteligência artificial tem sua gênese na academia. Décadas atrás, em 1956, o professor John McCarthy em uma conferência de especialistas em Darmouth Colege, chamada “O Eros Eletrônico”, definiu como “a ciência e a engenharia de produzir máquinas inteligentes" (ver quadro abaixo). Essa ideia é a antecessora dos hoje onipresentes algoritmos, definidos de modo bastante simplificado como uma receita, ou uma sequência finita de ações, para executar uma tarefa ou resolver um problema. Do início até agora, essa tecnologia se encorpou bastante e hoje dá munição para os futurólogos de modo geral. Alguns deles já imaginam a quarta revolução industrial, marcada pela convergência de tecnologias digitais, físicas e biológicas, impulsionadas pela IA. 
 
O fato é que a revolução parece estar em curso e um de seus líderes é ele, o Google. Seus produtos empregam processos de machine learning. No Google Fotos, o usuário consegue encontrar objetos e situações específicos, como “abraços”, “gatos” e “cores”. O filtro de spam do Gmail é impulsionado por machine learning e a busca usa o algoritmo RankBrain para aprimorar o ranqueamento dos links. O Facebook também faz das suas. E, naturalmente, como vários processos movidos nos Estados Unidos e Europa contra os gigantes da tecnologia, nada parece indicar que elas contam tudo que fizeram no último verão. Ao cidadão e consumidor resta ficar bem atento e afiar as garras da inteligência, aquela, a tradicional, para não comprar gato por lebre.

 

Linha do tempo de grandes marcos da Inteligência Artificial


1956
O Dartmouth Summer Research Project on Artificial Intelligence cunhou o nome de uma novo campo de conhecimento, que busca desenvolver software inteligente como seres humanos.


1965
O primeiro chatbot é criado por Joseph Weizenbaum no MIT. Com o nome de Eliza, ela faz as vezes de psicoterapeuta.


1975
Meta-Dendral, um programa desenvolvido na Universidade de Stanford para interpretar análises químicas, levou a que as primeiras descobertas feitas por um computador fossem publicadas em uma publicação científica.


1987
Uma perua da Mercedes com duas câmeras e alguns computadores trafegou sem piloto por 20 quilômetros em uma pista rápida alemã a mais de 80 km por hora, em um projeto acadêmico liderado pelo engenheiro Ernst Dickmanns.


1997
O computador da IBM Deep Blue derrota o campeão mundial de xadrez Gary Kasparov.


2004
O Pentágono apresenta O Darpa Grand Challenge, uma corrida para carros robôs no Deserto Mojave Desert  que acelera a indústria dos carros autônomos.


2012
Pesquisadores de um campo denominado Deep Learning aceleram o interesse corporativo ao mostrar que suas ideias poderiam fazer o reconhecimento de discurso e imagem muito mais preciso.


2016
AlphaGo, criada pela unidade DeepMind, do Google, derrota um campeão mundial do jogo de tabuleiro Go.


(Fonte: Wired).

 

Referências para o texto: BBC, Tecnoblog e Wired.