Transatlântico Oceania: China

Em transformação no esporte, conheça mais sobre a seleção chinesa
por
Leonardo Caporalini
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08/07/2023 - 12h

Com quase um quinto da população mundial e mais de 1,3 bilhão de habitantes, a China é uma República Popular Socialista, sob liderança política do Partido Comunista Chinês. A nação do sudeste asiático se descreve como uma "ditadura democrática liderada pela classe trabalhadora e baseada na aliança de trabalhadores e camponeses”.

Sendo uma das maiores potências do globo e a segunda maior economia do mundo, a China tem protagonismo no cenário internacional. Segundo informações do ranking especializado “Global Firepower”, os chineses também dispõem de um dos maiores poderios militares da Terra, possuindo, assim, o maior exército do mundo em número de soldados ativos (2 milhões de combatentes) e o segundo em orçamento de defesa (U$ 230 bilhões, atrás apenas dos Estados Unidos).

O sistema político do país se baseou por muito tempo em monarquias hereditárias como a Dinastia Qing (1644-1912), que governou o país por mais de 250 anos. Desde a introdução da reforma econômica no país em 1978, a China se tornou uma das economias que mais cresce no mundo, sendo a maior exportadora da terra (US$ 3.36 trilhões) e a segunda que mais importa mercadorias (US$ 2 trilhões), indicam as informações deste ano da Organização Mundial do Comércio. A industrialização nacional, inclusive, reduziu a sua taxa de pobreza de 53% (em 1981) para 8% (em 2001), com informações do maior e mais conhecido banco de desenvolvimento no mundo, o World Bank Group.

Todo esse domínio chinês também se reflete no esporte. O país é um dos que mais tem medalhas olímpicas, se tornando peça chave em uma das maiores competições do esporte mundial principalmente a partir dos anos 2000, quando ficou em 3º lugar no quadro de medalhas. Em 2008, na sua capital Pequim, conquistou o 1° lugar com o maior número de ouros. Apesar das competições mais premiadas serem o salto ornamental e o levantamento de peso, o esporte mais popular da China é o tênis de mesa.

A Grande Muralha da China, uma das construções humanas mais notáveis da história. Foto: Hung Chung Chih/National Geographic.
A Grande Muralha da China, uma das construções humanas mais notáveis da história. Foto: Hung Chung Chih/National Geographic.

 

Transformação no Futebol

Antes de falarmos sobre a “história chinesa na bola”, é importante entender o processo de popularização do esporte proposto pela China. Um plano foi elaborado no país pela Administração Geral dos Esportes, conjuntamente com os Ministérios da Educação e das Finanças, além da Associação Chinesa de Futebol (CFA). A ideia, apresentada também pelo presidente da China, Xi Jinping, é animadora e extremamente ambiciosa: transformar o país em uma das maiores potências do futebol.

Para alcançar esse objetivo, metas foram traçadas até 2035, visando uma reestruturação completa no esporte. Dentro desse planejamento, sete áreas serão priorizadas, sendo elas o aprimoramento da gestão desportiva, melhorias na seleção nacional, sistema de treinamento e competição entre jovens, desenvolvimento do esporte nas escolas, formação de treinadores de elite e a popularização do esporte no país com transmissões televisivas. Um dos principais alvos do governo, inclusive, é a candidatura para sediar a Copa do Mundo Feminina de 2031. A China já sediou a Copa do Mundo duas vezes, em 1991 e 2007.

Treino de futebol feminino em escola primária na província de Henan, China. Foto: Xinhua/Hao Yuan.
Treino de futebol feminino em escola primária na província de Henan, China. Foto: Xinhua/Hao Yuan.

As Rosas de Aço

Tanto a China como os Estados Unidos, se tornaram referências no futebol quando as mulheres entraram em campo. Enquanto os jogadores chineses venceram apenas duas vezes a Copa do Leste Asiático (2005 e 2010), as jogadoras, por outro lado, ostentam inúmeros títulos importantes e várias campanhas de destaque. As “Rosas de Aço”, como são conhecidas, já venceram nove vezes a Copa da Ásia (1986, 1989, 1991, 1993, 1995, 1997, 1999, 2006 e 2022), além de um 4° lugar na Copa do Mundo de 1995 e um vice-campeonato mundial da competição de 1999.

Seleção feminina da China, vice-campeãs da Copa do Mundo de 1999.
Seleção feminina da China, vice-campeãs da Copa do Mundo de 1999. Foto: AP/South China Morning Post.

Na última edição da Copa, em 2019, a equipe não foi bem e acabou sendo eliminada pela Itália nas oitavas de final. Ainda assim, o retrospecto chinês é bom no principal campeonato do mundo: o país tem sete participações, ficando na quinta colocação em sua primeira participação, em 1991, caindo nas quartas-de-final três vezes (2003, 2007 e 2015), uma nas oitavas (2019), uma na semis (1995) e na final (1999), em apenas uma oportunidade.

 

A estrela de Qingxia

Depois de uma Copa do Mundo decepcionante em 2019, a equipe se reestruturou e fez uma excelente Copa Asiática em 2022, conquistando o 9° título para o país e encerrando um tabu de 16 sem vencer no território em que a China tem absoluto domínio. Um dos motivos para a ótima campanha? A atual treinadora chinesa, Shui Qingxia.

A primeira ex-jogadora a treinar a seleção tem 56 anos, atuava como meia e fez parte do time mais dominante da história do futebol asiático, entre 1986 e 1997. Foi prata no futebol nos Jogos Olímpicos em 1996, em Atlanta, e disputou duas Copas e duas Olimpíadas pela China.

Contratada em 18 de novembro de 2021, tem até o momento 13 jogos como técnica com 7 vitórias, 4 empates e apenas 2 derrotas. Qingxia foi campeã 6 vezes da Copa Asiática (cinco como jogadora e uma ano passado, como treinadora) vencendo o torneio todas as vezes que disputou. A treinadora, inclusive, assumiu a Seleção Chinesa apenas dois meses e meio antes da quebra do tabu de títulos do país na competição, e encerrou o campeonato com uma grande vitória por 3 a 2 de virada, diante da Coréia do Sul.  

Depois de terminarem 2022 invictas - com seis vitórias, dois empates e enfrentando apenas seleções asiáticas -, a Seleção Chinesa mudou suas estratégias e enfrentou apenas equipes europeias nesta temporada. Apesar da aposta, o desempenho não atingiu as expectativas e em quatro jogos na temporada, a seleção ainda não venceu. As rosas de aço acumulam derrotas para a Suécia (4 a 1), Espanha (3 a 0) e empates diante de Suíça e Irlanda (ambos 0 a 0), e já não marcam gols há três partidas. Atualmente, a China ocupa o 14° lugar no ranking da FIFA de seleções femininas.

Shui Qingxia, atual treinadora chinesa e atleta da seleção entre 1986 e 1997.
Shui Qingxia, atual treinadora chinesa e atleta da seleção entre 1986 e 1997. Foto: CFP.

Intensidade e Velocidade!

A treinadora já usou três esquemas táticos diferentes desde que assumiu o time. Na Copa Asiática de 2022, Qingxia adotou um 4-3-3, priorizando a velocidade pelas laterais do campo. Já nesta temporada, Qingxia vem utilizando um 4-4-2, fortalecendo a criação das jogadas a partir de um meio de campo espaçado. Mas, nenhuma dessas é a formação preferida da técnica.

Shui Qingxia é fã de um sistema com três zagueiras, escalando o time em um 5-3-2. No caso, essa formação consegue suprir duas prioridades para a treinadora. As laterais viram alas, as meias podem se deslocar como segundas atacantes e assim, o time fica mais ofensivo - mesmo em um sistema com mais jogadoras defensivas.

Com média de idade de 26 anos e 10 meses, a comandante chinesa prioriza jogadoras mais jovens no elenco buscando nas palavras dela “uma maior intensidade em contextos mais extremos”. Na visão da treinadora, um time mais jovem entrega mais ações dentro do campo de jogo, tendo em algumas oportunidades a preferência por jogadoras mais velozes, em duelos pela titularidade contra atletas mais técnicas.

A China gosta de trabalhar na recuperação rápida da posse de bola e uma construção ofensiva com muita velocidade. É bem provável que veremos as chinesas apostando no contra-ataque, principalmente diante de seleções mais fortes.

 

Ponto Fraco? Bola Parada!

A China tem uma das médias de estatura mais baixas da Copa (1,66m), dificultando em muitas situações o aproveitamento de bolas recuperadas pelo alto. Nos amistosos disputados na temporada, a maioria dos gols sofridos pela equipe se iniciaram a partir de cobranças de falta e escanteios.

 

Destaques Chinesas

Além da treinadora, quem se destaca, sem dúvidas, é a atacante Wang Shanshan. Experiente, tem 33 anos e entrega muita força física, habilidade e versatilidade, podendo atuar tanto no meio campo, como na ponta. Já foi eleita melhor jogadora da Copa Asiática de 2022 e Jogadora do Ano na China. Tem 1,68m, é canhota e nasceu na cidade de Luoyang, província de Honã. Em 2023, disputou quatro jogos e marcou um gol. No geral, tem 51 jogos e 18 gols pela Seleção.

A atacante Wang Shanshan, de 33 anos, da seleção chinesa. Foto: Reprodução/AFC Women's Asian Cup.
A atacante Wang Shanshan, de 33 anos, da seleção chinesa. Foto: Reprodução/AFC Women's Asian Cup.

Outro destaque é a meia e ponta-direita Wang Shuang. Canhota, tem 28 anos, 1,64m e entrega muita velocidade em qualquer esquema tático. Começou a carreira e se destacou no Wuhan Chedu, da sua cidade natal. Depois, teve passagens pelo Daejon Sportstoto, da Coréia do Sul, Dalian Quanjian, da China, e no Paris Saint-Germain, da França. Desde 2022, atua no Racing Louisville FC, nos Estados Unidos. Na temporada, anotou um gol em sete partidas disputadas. Pela China, jogou em 106 jogos e marcou 37 gols.

Wang Shuang, meia e ponta direita da seleção da China, tem 28 anos. Foto: Punit Paranjpe/AFP/Getty Images.
Wang Shuang, meia e ponta direita da seleção da China, tem 28 anos. Foto: Punit Paranjpe/AFP/Getty Images.

A expectativa das chinesas é superar o chamado "grupo da morte" contra Inglaterra - atual campeã europeia -, Dinamarca - embalada por quatro vitórias seguidas - e Haiti, que eliminou Senegal e a forte seleção do Chile nas eliminatórias da Copa.

O “jogo chave” para a China é na estreia diante da Dinamarca. A Inglaterra chega como favorita para vencer todos os jogos e o Haiti é a seleção mais frágil. Se não conseguir vencer a Dinamarca, o ideal é no mínimo, não perder. Um empate faria com que o saldo de gols virasse uma prioridade no grupo. Na Copa do Mundo de 1991, China e Dinamarca também estavam no mesmo grupo e as rosas de aço conquistaram a classificação em primeiro lugar.