Por Jessica Midori
A condenação da tecnologia, comum argumento para justificar inúmeros problemas sociais, é a prova de que muitos ainda estão alienados, ou em estado de negação, do domínio que ela tem sobre todos nós. Esse fato gera um debate a respeito dos prós e dos contras da inserção das redes nas nossas vidas, que não deixa de fora o trabalho e o comércio. Se ouve falar sobre como a dependência digital é um caminho irreversível, podendo até ser prejudicial a longo prazo, principalmente ao trazermos à conversa o conceito de comprar sem precisar sair de casa, porém ao dialogar sobre um assunto que envolve milhares de pessoas, é necessário ouvir ambas as partes da pauta em questão e se perguntar “a tecnologia atrapalhou mesmo, de modo geral, o comércio?”.
Mayane Pinheiro, fundadora da loja virtual de roupas MTRINDADE STORE, quando iniciou o seu negócio era apenas uma estagiária, que no período de pandemia buscava uma fonte de renda extra. Sem experiência com vendas e recém-formada, a jovem encontrou no Instagram uma oportunidade de abrir a sua própria boutique, baseando-se nas lojas as quais ela mesma comprava e seguia em seu perfil pessoal. Conta que, como mulher, sempre estava comprando roupas novas, gostava de usar a moda do momento e se interessava pela ideia de tirar fotos para loja, então estudou pra começar e entender o que deveria ser feito. Nisso tudo, teve que escolher onde iria vender, e logo pensou no Instagram, pois, é uma plataforma imensa para qualquer mercado, e é onde as pessoas estão sempre conectadas, e ela sabia que veriam seu produto e também poderiam falar com ela através do WhatsApp.
O crescimento do comércio digital se deu exatamente pelo fato de que este é uma opção mais acessível, baseando-se na sua experiência pessoal, como comprador, é possível ter ideia o suficiente do que o mercado procura, como fazer uma divulgação do produto e como se comunicar com clientes. Ela destaca que as redes sociais são os lugares que os empreendedores estão colocando a cara pra divulgar seus produtos, assim como as pessoas que estão o tempo todo online também buscam o que desejam nessas plataformas digitais, porque querem ver o que é postado, o que é comentado, entre outras. Além disso, o baixo custo da venda online é uma grande vantagem para aqueles que estão começando um novo negócio ou estão entrando no mundo do empreendedorismo pela primeira vez. Ainda, conta que naquele momento inicial o comércio online, pessoalmente, era o mais barato, porque a pouparia de alguns gastos, como aluguel, energia, água e etc… e ao vender online, poderia ter um estoque em um local que já estava sendo utilizado por ela, com a luz e água que já usava.
Com a tecnologia houve uma democratização do empreendedorismo, assim muitas pessoas que estavam desempregadas, insatisfeitas com o seu cargo atual ou até mesmo buscando uma fonte de renda extra, encontraram nas plataformas digitais a solução de seus problemas. Mayane acredita que hoje o empreendedorismo seja para todos, porém, é necessário coragem e persistência para entrar nesse mundo, porque será bem diferente do seu trabalho cotidiano, principalmente com uso da tecnologia. Uma das vantagens é que o comércio digital não se limita a uma área especifica ou depende de uma formação em particular, por isso que ele é tão inclusivo, queira seguir o ramo da gastronomia, moda, beleza, ou dos serviços, no mundo digital tudo é possível.
Alessandra Leite, advogada e fundadora da empresa de consultoria GLOBAL TO BE, encontrou nas plataformas digitais a oportunidade de deixar o seu cargo de muitos anos, como funcionária de uma empresa, para seguir o seu caminho de forma autônoma e abrir a sua própria companhia. Juntando sua experiência com a disponibilidade de divulgação que as redes sociais oferecem, nasceu um novo negócio. Sobre a empresa, ela conta que é um serviço autônomo que surgiu após quase 15 anos trabalhando como funcionária em consultoria, desde estagiária até diretora. Com a experiência que ganhou acreditou que poderia fazer a mesma coisa, mas dando um atendimento mais personalizado, com custos menores, sem a massificação do atendimento das grandes consultorias em que o consultor mais experiente atende apenas as grandes contas e os clientes menores são atendidos por pessoas em treinamento. Afirma que a incorporação das plataformas digitais foi uma forma de apresentar permanentemente o seu trabalho, por ela não ter um nome consolidado no mercado, e assim, criar uma identidade profissional.
Nos tempos atuais, no contexto pós pandemia, será possível escutar de muitos que a possibilidade de comprar e vender online salvou as suas vidas durante os quase dois anos de isolamento social. A praticidade que a internet ofereceu, ampliou as portas do empreendimento, e nesse contexto muitos que estavam perdidos encontraram um ticket para adentrar um novo negócio, o seu próprio negócio.
Alessandra sugere, do seu ponto de vista, que o empreendedorismo cresceu como uma alternativa ao conceito de emprego que estávamos acostumados ao longo das décadas. Como muitas gerações nasceram e cresceram vendo seus pais trabalhando como funcionários de empresas de segunda à sexta em horário das 8 às 17, isso era o normal, e empreender era visto como uma opção àqueles que não tem mais emprego. Mas, com o avanço na área, muito também pela diminuição dos empregos formais, por causa da modernização e automação da produção, as pessoas se viram obrigadas a recriar e abrir seus próprios negócios, o que tem formado uma nova geração. Isso tudo vai moldando novos hábitos e um novo mercado de trabalho surge daí, no qual a tecnologia é essencial e ajuda a mapear negócios, estudar a distância, fazer contatos com clientes, etc, coisa que há alguns anos não era possível.
O sucesso dessa nova forma de comprar e vender foi tão visível, que mesmo após o fim das restrições sociais e a reabertura das lojas físicas, muitos vendedores optaram por manter a face virtual de seu negócio. Com alguns utilizando ambos os meios para desenvolver o seu comércio, e outros substituindo totalmente o espaço físico e adotando o espaço online como único meio, como ocorreu com muitos restaurantes que hoje só atuam através do serviço de delivery.
Thaisy Gomes, fundadora da loja VIPY COSMÉTICOS, além de conquistar autonomia ao deixar de trabalhar na loja do seu irmão e dar início no seu próprio empreendimento, encontrou nas redes sociais uma forma de elevar o seu comércio e ampliar a sua rede de consumidores. Ao disponibilizar, além da já existente loja física, o serviço de entrega para todo o Brasil, ela percebeu que o seu negócio ganhou mais visibilidade e a procura por seus produtos aumentou, com a praticidade da compra online. Relata que ideia surgiu através de uma pesquisa de mercado, na qual foi identificado que no bairro e região não tinha loja voltada para produtos de cosméticos, cuidados pessoais e beleza. Ela sempre acreditou que o comércio digital é um cenário positivo para todos os ramos e portes de empresas, pois ampliam oportunidades de venda, e foi com esse pensamento que decidiu criar um perfil no Instagram para a loja.
Com a sua experiência como consumidora, Thaisy foi aplicando seus conhecimentos e aprendizados pessoais no seu negócio, filtrando os pontos positivos e negativos de cada tipo de comércio, tanto o físico quanto o online, para então selecionar quais pontos gostaria de incorporar no seu empreendimento, visando satisfazer as vontades do cliente.
Ao analisar as diferenças da loja online para a física percebeu que ambas possuíam qualidades que poderiam ser somadas para criar um ambiente de compra e venda mais equilibrado, por exemplo, no virtual há a possibilidade de uma maior e mais rápida divulgação, trazendo visibilidade aos produtos, os custos e os investimentos necessários para tocar o negócio também são menores, a jornada de trabalho pode ser mais flexível e há a vantagem de atender uma área geográfica maior. O comércio físico traz um ar mais pessoal, mais acessível à loja, com os clientes sendo na maioria moradores do bairro e região, também há a possibilidade do contato físico do cliente com produto. Ao colocar essas diferenças lado a lado, é notável a vantagem que o digital possui, por isso que mesmo após a reabertura das lojas físicas ela escolheu manter a opção do atendimento online.
Pode-se afirmar que o comércio digital revolucionou o empreendimento, e a economia no geral, e é em tempos de isolamento, como a pandemia, que esse fato se torna mais incontestável. A prova dessa mudança é a permanência, e cada vez maior crescimento, dos comerciantes independentes que aparecem no nosso feed, seja no Instagram, Tik Tok, Facebook, e por todas as plataformas digitais. Esse novo mercado mudou os conceitos de quem pode e não pode ser dono do seu próprio negócio, e talvez essa possa ser uma das maiores e mais importantes mudanças atuais, pois não mudaram somente a vida de três mulheres brasileiras, mas de muitas pessoas no mundo inteiro.