Por Guilherme Lima Alavase
O futebol é o esporte mais popular do mundo e considerado uma paixão nacional. Nas últimas décadas foi se profissionalizando e virando um grande negócio financeiro. Os clubes passaram a movimentar cifras astronômicas. Copiando o modelo europeu, vários clubes brasileiros deram uma guinada na forma de conduzir o futebol. O esporte para ser rentável e competitivo precisava ser eficiente, como uma empresa. Criou-se nos clubes a profissionalização dos dirigentes, contratando especialistas em diversas áreas para comandar o departamento de futebol.
A partir deste ponto, passou a ser pensado como uma mercadoria e ser vendida pelo melhor preço. Acabou a era das improvisações, das jogadas desconcertantes do futebol alegre. Na modernidade o que importa é vencer. Aos jogadores, para ganhar muito dinheiro, resta cumprir as determinações do treinador, baseadas em dados estatísticos, repetindo a mesma jogada ensaiada até que dê certo. Como mercadoria que precisava ser comercializada em todos os cantos do planeta, as emissoras de TV investiram muito dinheiro em equipamentos tecnológicos que mostravam os jogos com diversas câmeras posicionadas de forma a cobrir todos os espaços do campo.
A partir das transmissões de TV, os árbitros de futebol passaram a sofrer uma pressão fora do comum, sendo o erro, mostrado em detalhes, imperdoável. As empresas patrocinadoras dos times investiam altos valores e não aceitavam ser prejudicadas em suas estratégias comerciais por equívocos da arbitragem. Era preciso, assim como em outros esportes, investir em tecnologia para que os erros banais fossem eliminados dos jogos. Quem nunca ouviu falar da história do gol de mão do jogador argentino Maradona em jogo contra a Inglaterra nas quartas de final da Copa do Mundo de 1986.
A primeira experiência com uso de tecnologia para auxiliar a arbitragem no jogo foi a “tecnologia na linha do gol”, que consistia em um chip colocado dentro da bola que avisava o árbitro, através de seu relógio, se a bola havia ultrapassado ou não a linha do gol. Essa tecnologia foi utilizada, para avaliação, no torneio mundial de clubes de 2012 e implantado definitivamente a partir da Copa do Mundo de 2014, realizada no Brasil.
Implantado, a partir da Copa de 2018, na Rússia, o árbitro assistente de vídeo (VAR) consiste em uma equipe auxiliar, localizada em uma sala, que acompanha e analisa os lances do jogo através de monitores de vídeo. O operador do sistema pode ver o lance em vários ângulos, em câmera lenta, observando os detalhes da movimentação dos jogadores. Se o lance merece ser revisado, avisam o árbitro principal, através de um sistema de comunicação em tempo real, ou seja, são vários olhos (humanos e tecnológicos) observando tudo o que acontece durante o jogo.
Nos protocolos da FIFA, o VAR só pode ser utilizado, para confirmar ou anular um gol, para lances de pênalti, cartão vermelho direto e em momentos que o arbitro não consegue identificar jogadores que participaram de lances polêmicos sem que fossem observados. No caso de lances objetivos, como um impedimento, basta o VAR indicar para o árbitro para que ele acate a orientação. Em casos subjetivos, ou interpretativos, o árbitro é alertado para que veja o lance através de monitor instalado na lateral do gramado. Após assistir o lance, cabe a ele tomar a decisão.
Segundo dados da FIFA, o VAR foi utilizado 355 vezes nos 48 jogos da primeira fase da Copa da Rússia, sendo que todos os 122 gols foram verificados. O uso do VAR, com toda a sua demora, elevaram os acertos da arbitragem a 99,3% na Copa.
VAR brasileiro
No Brasil, o VAR foi usado experimentalmente no campeonato Pernambucano de 2017. No campeonato Brasileiro o VAR começou a ser utilizado a partir de 2019, colecionando muitos elogios e críticas por parte dos torcedores, dirigentes dos clubes e da mídia esportiva.
Após três anos de sua implantação, o VAR ainda levanta muitas discussões no futebol brasileiro, porém, contra fatos concretos os argumentos contrários ficam fragilizados. Gols, com erros grosseiros do árbitro, praticamente foram eliminados, lances violentos não estão ficando impunes, o agarra-agarra dentro da área nos escanteios diminuíram sensivelmente, o cai-cai para cavar um pênalti sumiu dos jogos, ou seja, a malandragem do futebol parece que ficou no passado.
A ex-árbitra de futebol e hoje comentarista de arbitragem da ESPN, Renata Ruel, em entrevista concedida ao jornalista Diogo Magri do “El País” foi didática em suas explicações para elucidar duvidas dos interessados pelo esporte. Observa que o VAR é uma poderosa ferramenta de auxílio da arbitragem, pois legitima o resultado de uma partida, porém, afirma que é preciso investir na formação dos profissionais da arbitragem. Opina que, "Se o VAR está precisando corrigir muitos lances é porque os erros estão sendo cometidos. Vemos alguns árbitros se escondendo atrás da ferramenta, usando como bengala".
O auxiliar (bandeirinha) Emerson Carvalho, que atuou nas últimas Copas do Mundo, participou do podcast “Hoje Sim” do locutor Cleber Machado e relatou que a principal dificuldade enfrentada pelos árbitros é o medo de errar, pois um erro individual em um jogo sem o suporte da tecnologia já é ruim para o prestígio do profissional, imagine um erro sendo cometido com todo o suporte tecnológico e com o auxílio de uma equipe remota o orientando na tomada de decisão. Esse medo faz o árbitro ver e rever o lance diversas vezes.
Como no futebol, quase tudo acaba em polêmica, alguns freqüentadores dos jogos nos estádios ficam angustiados esperando, às vezes, alguns minutos para saber se o grito de gol do locutor valeu ou foi anulado pela tecnologia.