“Ser gay não é errado!”, afirma jovem católico

Vinicius Oliveira, da Paróquia Sagrado Coração de Jesus, em Jundiai, tem homossexualidade acolhida na comunidade
por
Camila Bucoff
Giovanna Brito
|
18/06/2024 - 12h

 

“Em Jesus, na minha fé, foi onde eu me encontrei para poder seguir em frente e me entender melhor, entender que isso - ser gay - não é errado” disse Vinicius Oliveira, 18, ao relatar a influência da religião na descoberta da sua sexualidade. O jovem congrega desde a sua infância na Paróquia Sagrado Coração de Jesus em Jundiaí, e durante a adolescência começou a servir de forma voluntária com eventos, teatros, acampamentos e em outras ocasiões. 

Atrás, uma parte da construção de uma igreja católica antiga e, á frente dela, uma bandeira da comunidade LGBTQIAPN+ erguida.
Imagem: Reprodução/Plano crítico.

 

Apesar do seu posicionamento positivo quanto a essa relação, sua trajetória de aceitação pessoal e coletiva como cristão parte da comunidade LGBTQIAPN+ foi composta por altos e baixos. Muitas pessoas que costumam assumir sua sexualidade dentro de lares e ambientes conservadores sofrem diversos tipos de preconceitos e linchamentos, o que acarreta em seu afastamento ideológico da religião. A experiência de Vinícius teve um desfecho diferente: “No começo eu cogitei várias vezes em deixar a minha igreja, sentia que isso não estava me fazendo bem emocionalmente. Foi muito difícil entender o que eu estava sentindo, mas ao me assumir encontrei apoio em amigos e principalmente em Deus.”

As visões cristãs sobre a homossexualidade têm sido diversas ao longo dos séculos e entre as denominações, seja católica ou evangélica. Algumas igrejas conservadoras veem a homossexualidade como uma violação dos princípios bíblicos e a consideram pecaminosa. Outras têm adotado uma abordagem mais inclusiva, aceitando membros LGBTQIAPN+ e, em alguns casos, permitindo casamentos e ordenação de clérigos.

Duas mulheres de cabelo curto, uma loira e uma morena, estão a esquerda da imagem, ambas estão segurando buquês e recebendo a benção de um padre, á direita da imagem. Ele esta de mão erguida sobre a cabeça delas realizando o casamento.
Cerimônia em Igreja Católica alemã celebra união entre casal lésbico. Foto: Andreas Rentz/Getty Images.

 

O número de membros assumidos do clero ainda é desconhecido. De acordo com o levantamento da BBC, dentre os 27 mil padres que exercem o ofício atualmente no Brasil, nenhum teve sua sexualidade levada ao público. Apesar disso estar diretamente ligado com a prática do celibato - disciplina existente desde o século 11 que não permite que os padres tenham relacionamentos amorosos - ainda gera questionamentos sobre a liberdade e é um dos motivos pelo qual diversos líderes pedem o desligamento da Igreja Católica todos os anos, segundo o G1. 

Nesse sentido, a falta de apoio, conselhos e acolhimento por parte da comunidade cristã pode gerar um sentimento de solidão e não pertencimento naqueles que fogem da heteronormatividade. Para o jovem em questão, isso deixou de ser um problema, pois seus amigos são uma grande rede de apoio dentro do ciclo religioso. Segundo ele, existem outras pessoas LGBTQIAPN+ ou que ainda estão confusas sobre sua orientação sexual e passando pelo processo de descobrimento.

Em relação ao posicionamento dos líderes religiosos quanto a homossexualidade, o Papa Francisco tem adotado uma abordagem mais inclusiva e compassiva em relação às pessoas LGBTQIAPN+ em comparação com alguns de seus predecessores. Ele frequentemente fala sobre a importância do diálogo, do acolhimento e do respeito mútuo, mantendo os ensinamentos tradicionais da Igreja. Vinicius comenta sobre isso: “A relação entre a igreja e os LGBT’s sempre vai ser complicada de entender, é um relacionamento muito difícil. Porém, acho que já tivemos muita evolução com isso, as falas do Papa e as leis que aprovam a benção a casais do mesmo sexo são alguns dos progressos que conseguimos ter.”

Porém, algumas de suas declarações recentes geraram controvérsias. Jornais italianos, como o “La Repubblica” e o “Corriere della Sera”, expuseram que dia 11 de junho, em uma reunião fechada, o Papa teria utilizado um termo homofóbico para se referir a população homossexual. A fala envolvia uma problematização da “ideologia gay” e o desencorajamento da presença dessa comunidade nos seminários religiosos. Após as publicações questionando o comportamento do líder, foi declarado em uma nota do Vaticano que o Papa falava sobre o perigo das Ideologias na Igreja.

Papa Francisco lendo um texto no microfone.
Papa Francisco. Imagem: Mídia do Vaticano /Reprodução via REUTERS.

 

O aumento de inclusão e representatividade no meio é fortalecido por movimentos sociais, como os “Cristãos Contra o Facismo” que articulam candidaturas coletivas na tentativa de tornar os espaços mais acolhedores e se opor ao conservadorismo. Todavia, ao passo que tais discursos tenham ganhado certa tolerância, a Igreja enquanto instituição ainda se mantém estagnada. Enquanto a luta não for impulsionada por mudanças estruturais, os avanços são dificultados. 

O padre José Trasferetti, professor titular da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, afirma em entrevista para a BBC que embora perceba uma evolução em relação aos movimentos LGBTQIAPN+ fora do ambiente religioso, a Igreja como instituição avança lentamente: “A Igreja Católica no Brasil é muito comprometida com as questões sociais. Entretanto, em questão de moral sexual, a prática e o discurso continuam os mesmos dos anos 1940 e 1950”. 

Após as dificuldades iniciais, Vinicius, que atualmente concilia seus trabalhos cristãos com a vida de vestibulando de medicina, reforça a sua decisão de seguir na religião: “Foi na minha fé em Jesus que encontrei conforto, que minha vida começou a andar. Isso facilitou para mim a lidar com todas áreas da minha vida. As pessoas tem que ser quem elas realmente são. Ir à Igreja, conversar com Deus e não perder a fé são coisas essenciais para mim.”