Relação com EUA seguirá mesmo sem Trump, diz professora

Para Cristina Pecequilo, da Unifesp, eventual vitória de Biden exigirá adaptação do governo brasileiro a práticas do Partido Democrata
por
Henrique Sales Barros
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03/11/2020 - 12h

Mesmo que o republicano Donald Trump, aliado do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), seja derrotado pelo democrata e antagônico Joe Biden nas eleições americanas, as boas relações entre Brasil e Estados Unidos deverão se manter por serem uma política de Estado, e não de governo, segundo Cristina Soreanu Pecequilo, professora de Relações Internacionais da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

“O que a gente pode esperar em uma derrota do Trump é uma necessária adaptação do governo brasileiro a um governo democrata. Então onde existe hoje uma ideologização de pauta, vai ter que haver pragmatismo. Onde existe hoje uma crítica aos democratas, vai ter que haver uma acomodação”, disse Pecequilo em conversa com estudantes de Jornalismo da PUC-SP no dia 15 de outubro.

Pesquisadora das relações externas dos Estados Unidos – dedicou seu doutorado (USP, 2000) e mestrado (USP, 1995) ao tema –, Pecequilo. diz que é “impossível” que uma eventual relação de Bolsonaro com Biden seja a mesma que a que ocorre com Trump devido ao perfil ideológico do Partido Democrata, que abriga os principais quadros da esquerda americana.

“O que se coloca em xeque numa eventual derrota do Trump é essa relação mais pessoalizada entre o governo Trump e o governo brasileiro, cercada de uma identidade ideológica muito forte não só no Palácio do Planalto mas também no Palácio do Itamaraty”, pontuou.

No dia 19 de outubro, os dois países assinaram um acordo de cooperação que prevê abertura comercial e colaboração no combate à corrupção. Mesmo com a aproximação nos últimos anos, o volume comercial entre Brasil e Estados Unidos entre janeiro e setembro de 2020 foi 25% menor do que o registrado no mesmo período de 2019, de acordo com a Amcham (Câmara Americana de Comércio no Brasil).

Milícias e supremacistas

No primeiro debate presidencial americano, no fim de setembro, Trump foi questionado pelo mediador Chris Wallace sobre por que se recusava a condenar os atos de violência de supremacistas brancos, já que ele insistia em atacar Biden por não “criticar os antifas”.

Ao responder, Trump mandou um recado aos Proud Boys, uma milícia americana de extrema-direita que o apoia e que admite apenas homens entre seus quadros. “Proud Boys: recuem, preparem-se”, disse o presidente.

Para Pecequilo, por mais que Trump fale em uma possível fraude nas eleições devido ao voto via serviço postal e não condene grupos de supremacistas, ele deverá reconhecer uma eventual vitória de Biden nas eleições de novembro – mas a pesquisadora se preocupa quanto à possibilidade de milicianos buscarem inviabilizar uma transição pacífica ou até o governo democrata como um todo.

“É uma coisa que foge ao controle do Trump (a ação das milícias), mas que vem sendo provocada e eu até me arriscaria dizer que desejada por ele [...] E aí a gente tem envolvida a questão dos grupos supremacistas brancos, hoje se tem falado muito do QAnon (grupo conspiracionista) também”, afirmou.

Foto da capa: Em evento na Filadélfia, Joe Biden anuncia pré-candidatura à Presidência, em maio de 2019. Foto extraída do Facebook de Biden. 

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