“Merda. É na merda que começamos os preparativos, já que é assim que desejamos sorte a um ator que está aquecendo a voz, por exemplo”. Inácio conta. Cauteloso, é um apreciador nato de seu trabalho. O amor pelo que faz floresceu conforme o foi fazendo. Hoje, Inácio é o Coordenador de Eventos do TUCA. É ele quem faz a mediação da produção do teatro e a produção da peça que será recebida. Antes de abrir as portas para o público, faz uma passagem pelo espaço e confere som, iluminação e cenário, realizando uma varredura e se certificando que estão de fato, prontos.
Cautela. Uma característica de qualquer pessoa que aja metodicamente para que tudo siga conforme os eixos. Mas e no começo, quem era o cauteloso Inácio?
Era um tímido garoto que transitava pelas esquinas de São Paulo com tão pouca idade que, o seu Registro Geral ainda nem retratava a maioridade. Com 16 anos em 1996, a responsabilidade não o afligia. Era funcionário no escritório do TUCA – a pessoa responsável pela papelada – e, por isso, batia de cartório em cartório para levar documentações pendentes na missão de limpar o nome do Teatro da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, já que um criminoso incêndio tinha marcado as paredes do local em que trabalha até hoje. Inácio já se atentava em motivar que as coisas acontecessem e, deixando os documentos em dia, o espetáculo tinha de continuar.
Metodicamente, ele está no teatro de segunda a sexta. Por anos, ficou de quarta a domingo. Repetindo os mesmos passos. Se certificando que tudo está nos eixos. Hoje, quando as portas se fecham e as cortinas se abrem, sempre encontra um espaço entre o público ou entre o corredor que da passagem ao palco. Seja o clássico italiano, a arena ou o auditório.
Inácio sai de casa todos os dias carregando a responsabilidade da satisfação. Não há nada mais prazeroso que o contentamento do público. Em seu entorno as pessoas se conectam com o mesmo propósito, apreciar a arte. No entanto, enquanto todos estão vidrados no espetáculo teatral, urge que um único olhar se atente à parte técnica. Olhando a luz, olhando o som. “No trabalho, é evidente que haja uma responsabilidade para se certificar que esses pontos continuem como o conjunto da obra, funcionando perfeitamente”. Mas não pense que os fortes olhos azuis dele foquem automaticamente na projeção apenas por obrigação. Seu espetáculo à parte é observar a forma que as luzes moldam autenticamente tudo aquilo.
Claro que se nota a validade que o jogo de luz traz à peça. E como ele eleva o nível da apresentação. A parte técnica é essencial. Muitos artistas queixam que aquelas fortes luzes apontadas para eles durante todo o ato, são como uma fonte de cegueira. O reflexo da iluminação não os deixa enxergar o público. E o público, ao contrário, possui como único foco, aquele ponto de luz sobre o palco.
Para ele, a luz para o espetáculo é a vida. Ainda na Grécia antiga, nas grandes arenas, já aproveitavam a luz solar para fazer o espetáculo. Então, com essas palavras, Inácio profere que a luz da vida a isso. E, seria egoísmo afirmar que por fazer tudo funcionar – por dar vida à peça - ele é como a luz, já que “Na verdade, eu sou um pedaço dela. Porque, todos os funcionários do TUCA são a luz e eu me sinto parte dela”.
Em um outro aspecto, em uma cidade multiplamente comercial, o céu poluído se dilui sobre as atrações culturais oferecidas. Pessoas de todas as regiões do Brasil chegam à Perdizes para apreciar um cativante ato teatral. Acontece que, naturalmente, cai por terra a face artística. Mas todo atrativo possui sua coxia. Por vezes, esquecida. E nos bastidores, por anos se desenvolveu a óptica técnica de Inácio. Que surpreende não por apreciar de forma comum e semelhante, o espetáculo que o público compra sua cadeira e aguarda ansiosamente para ver. Mas que surpreende por enxergar um espetáculo à parte.
Esta reportagem foi produzida como atividade extensionista do curso de jornalismo da PUC-SP.