O dólar tem registrado repetidas quedas em seu valor. Desde o início do governo Lula, em janeiro, até o fim de junho, a moeda norte-americana caiu 9,27%, terminando o primeiro semestre em R$ 4,7889.
A queda do dólar no primeiro semestre contraria a tendência dos quatro últimos anos, quando a moeda norte-americana saltou de R$ 3,87, no início do governo Bolsonaro, para R$ 5,28, no fim de 2022, um avanço de 36,4%. Nesse mesmo período, a inflação oficial, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), alcançou 26,93%, a maior variação desde o primeiro mandato de Dilma Rousseff (2011-2014)
Contudo, a conjuntura brasileira entrou em metamorfose, o que também alterou as perspectivas econômicas do país. André Luis Campedelli, doutor e especialista em macroeconomia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), afere como Bolsonaro adotava uma política internacional isolacionista, que priorizava países que seguissem sua mesma agenda ideológica e rompia com uma tradição de décadas de diplomacia do Brasil – o que também afetava o investimento externo no real. Um indício disso se apresenta em um levantamento encomendado pelo Correio Braziliense, que aponta que, em cinco meses de mandato, Lula se reuniu com o dobro de chefes de estado que Bolsonaro no mesmo período.
“Uma maior segurança em relação à estabilidade política nacional também faz com que a entrada de capital seja maior para o Brasil”, afirma Campedelli. O economista ainda menciona a alta do Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo, como um indício da desvalorização do dólar. O índice registrou um avanço de 7,61% de janeiro a junho, o melhor desempenho para um primeiro semestre desde 2019.
Estados Unidos e a economia externa
Segundo Campedelli, a instabilidade da economia internacional, causada sobretudo pela Guerra da Ucrânia, faz com que o mercado procure por novas fontes de investimento. O economista afirma que a Rússia era considerada um importante porto seguro de capital especulativo e, apesar de ter sido uma decisão repudiada pelo presidente Lula, a manutenção da taxa básica de juros, a taxa Selic, a valores elevados faz do Brasil uma nova alternativa para este tipo de aplicação. “A combinação de problemas em outros países com um cenário brasileiro favorável fez com que o atual governo expandisse as políticas de exportação, o que impulsiona nossa moeda”, aponta.
O dólar também é fortemente influenciado pelas movimentações da economia estadunidense. No dia 14 de junho, o Federal Reserve (Fed), banco central norte-americano, anunciou que manteria a atual taxa de juros do país, entre 5% e 5,25%. A decisão foi tomada após dez aumentos seguidos, que ocorreram desde março de 2022.
Segundo Claudemir Galvani, mestre e professor de economia política pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), a estabilização dos juros estadunidenses têm efeitos positivos para o Brasil: “Os Estados Unidos passam por um período de alta inflação e desemprego”. O especialista ainda comenta como, agora que a taxa de juros do país se firmou, com intuito de controlar os gastos públicos, os recursos que seriam aplicados lá, por ser considerado um mercado mais seguro, começam a ser direcionados a países de terceiro mundo, como Brasil, México e Chile, com taxas mais elevadas.
O futuro da moeda
Mas, afinal de contas, a baixa no valor do dólar é um efeito circunstancial ou uma tendência para os próximos anos? Para Campedelli, ainda que possam existir incertezas, a taxa de câmbio deve continuar caindo. “Como os Estados Unidos manterão uma política de não aumentar seus juros por um tempo, ao mesmo tempo que a taxa Selic no Brasil deve ser mantida ao menos até a próxima reunião do Banco Central, continuaremos observando uma queda vertiginosa no dólar para os próximos meses.”
O impacto mais perceptível dessa movimentação será na inflação, que já tem observado quedas. O IPCA de maio ficou em 0,23% – menor que o de abril deste ano e o de maio de 2022 (0,61% e 0,47%, respectivamente). “Como a inflação do Brasil é baseada em custos, e vários de nossos insumos são importados, o dólar caro contribuía muito para as altas desse índice. Agora que temos visto uma decaída, o preço de outros produtos, como combustíveis, também deve diminuir”, avalia Campedelli.
Porém, para Galvani, ainda não é suficiente. Para ele, o real poderá ser considerado uma moeda valorizada assim que alcançar valores entre R$ 4,40 e R$ 4,50: “É importante que tenhamos uma moeda forte, pois isso significa que ela acumula maior valor para o exterior, dando ao Brasil e ao brasileiro um maior poder de compra. Entretanto, é necessário que haja um equilíbrio, pois, quanto menor o valor de uma moeda em relação ao dólar, mais prejudicadas são as exportações, visto que outros países lucrarão menos com a compra de seus produtos”.
Já Campedelli concorda com o perigo, mas acredita que essa não deva ser uma preocupação a curto prazo. “Nossa taxa de câmbio estava extremamente elevada, muito acima do que podemos observar historicamente com o real. Mesmo que tenhamos nosso mercado perdendo certa competitividade, acredito que o custo da produção nacional irá compensar essas circunstâncias. Não adianta fomentar a competição se você não tem o valor necessário para produzir no país”, finaliza.