Projeto Brincadas mobiliza diversas ações para ajudar a conter danos causados pela pandemia

Liderado pela professora Fernanda Liberali, grupo de pesquisa utiliza o ato de brincar como uma forma de mobilização social para ajudar aqueles em situação de vulnerabilidade
por
Liana Ruiz
|
03/07/2020 - 12h

Com o intuito de suprir diversas necessidades advindas da pandemia do novo coronavírus, estudantes, professores e pesquisadores do grupo de pesquisa LACE, ligado ao programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Linguistica Aplicada e Estudos da Linguagem e do Mestrado Profissional em Educação:  Formação de Formadores,  criaram, no início da quarentena, o projeto Brincadas. Por meio do trabalho voluntário de todos os envolvidos, eles conseguiram executar diversas ações que resultaram no levantamento de verba para ajudar instituições educacionais e hospitais, na denúncia de falta de EPI’s para os agentes de saúde e no aumento da participação das famílias e de outras escolas no desenvolvimento de novas habilidades educacionais. 

Liderado pela profa Dra . Fernanda Liberali, o projeto começou com a criação do livro “Educação em tempos de pandemia: brincando com um mundo possível”, cuja temática trazia como foco a educação e a potência criativa do ato de brincar no contexto atual, e a necessidade de que esse conteúdo fosse rapidamente difundido. Ao mesmo tempo, existia uma vontade muito grande de ajudar aqueles em situação de vulnerabilidade e assim nasceu, paralelamente, a Brincada da Educação e a Brincada de Apoio. A primeira ocorre por meio de lives semanais no Facebook e na plataforma ZOOM, que traz temas do próprio livro e reúne pais e educadores num mesmo ambiente. A segunda, mediante doações de pessoas físicas, conseguiu comprar e distribuir EPI’s e 20 litros de álcool em gel para diversos hospitais da região metropolitana de São Paulo, além de comprar cestas básicas para alunos de centros educacionais unificados e organizações não governamentais.

Funcionária do hospital Tide Setúbal em São Miguel Paulista recebendo face shields.
Funcionária do hospital Tide Setúbal em São Miguel Paulista recebendo face shields. 

 

Posteriormente, foram criadas as Brincadas do Brincar que, por meio da brincadeira, introduz novas culturas e possibilidades do ser; as Brincadas dos Gestores, direcionada para a troca de informações entre os próprios gestores das escolas; as Brincadas do Ouvir que possibilitam o desabafo das angústias e dificuldades das pessoas durante a distanciamento social. De acordo com Fernanda, foi na dinâmica das lives que ela pode reparar uma fragilidade maior por parte, principalmente, daqueles que estavam isolados em casa sozinhos. “Começamos a perceber que o número de pessoas com dor era grande demais e foi aí que criamos a Brincada do Ouvir, no sentido não de fazer um atendimento psicológico, mas de ter um ouvido para escutar, para bater um papo”, diz Liberali.

Comemoração da Festa Junina na live da Brincada do Brincar
Comemoração da Festa Junina na live da Brincada do Brincar

Carol Abreu, coach e psicanalista, após participar de uma das Brincadas disse como o conteúdo contribuiu muito para ela trazer mais leveza, descontração e variedade em seus atendimentos com crianças e familiares. Segundo ela, as sessões via internet acabam sendo mais desafiadoras pela dificuldade de uma maior aproximação com os pacientes. “Estabelecer a conexão com as crianças online na largada é um desafio pra mim e as técnicas ajudaram bastante”, comentou Carol. Além disso, ela ressaltou como, apesar do intenso convívio em que as famílias estão sendo submetidas durante o período de quarentena, há uma certa desunião entre elas e, nesse sentido, as dinâmicas apresentadas nas Brincadas que foram introduzidas nas sessões familiares, ajudaram muito no processo de percepção do outro. 

Já para Joyce Suellen Lopes Dias, diretora da Escola Ceu EMEF em Perus, a participação nas Brincadas tem sido fundamental não somente pelas discussões que são levantadas durante as lives, como educação anti-racistas, desigualdade social e necropolítica, mas também por intervir de forma direta no auxílio às famílias em situação de maior vulnerabilidade. A Brincada de Apoio pode, mediante a arrecadação de montantes que foram revertidos em doações de cestas básicas para os alunos da escola municipal, suprir uma necessidade básica. "Nesse momento as famílias primordialmente estão com fome”, reflete Joyce.

Parceria entre a ONG Adess e a Brincada de Apoio na arrecadação e distribuição de alimentos, itens de higiene e brinquedos para  as famílias da Brasilândia 
Parceria entre a ONG Adess e a Brincada de Apoio na arrecadação e distribuição de alimentos, itens de higiene e brinquedos para  as famílias da Brasilândia 

Para Fernanda Liberali, a pandemia escancarou as desigualdades e injustiças sociais e que vivemos um momento muito difícil. “Criamos as Brincadas não porque achamos que tudo vai melhorar, mas justamente porque as coisas estão horríveis e precisamos criar uma condição de sobrevivência para as pessoas”, explica Liberali. Segundo ela, a ideia central do projeto é justamente fomentar a transformação por meio da construção do inédito viável de Paulo Freire e do brincar do Vygotsky. 

Questionada sobre as mudanças que podem ocorrer na educação pós pandemia, Fernanda acredita que a tecnologia chegou efetivamente para ficar nas escolas e que muitas coisas estão acontecendo de uma forma mais efetiva no espaço tecnológico. Todavia, se diz pessimista em relação às medidas governamentais para que tal transformação seja viável e afirma que “se o governo não investir uma grana pesada para construir a possibilidade de acesso em larga escala gratuito, a exclusão educacional vai ficar ainda maior e as diferenças seriam impensáveis”.

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