Professora trans é vítima de ataques após vídeo divulgado

Após dinâmica pedagógica, docente da rede municipal do Mato Grosso do Sul sofre ataques de grupos conservadores
por
Amanda Ródio Mores
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11/03/2025 - 12h

 

Postagem publicada por Nikolas Ferreira em seu perfil do Instagram/REPRODUÇÃO: @nikolasferreiradm (Instagram)

Na terça-feira (25), a professora Emy Matheus dos Santos, de 25 anos, revelou que pediu licença da escola municipal onde atuava em Campo Grande (MS). 

Com graduação em dança e teatro, Emy se identifica como travesti e foi integrada à rede de educação municipal após aprovação em concurso público. Após dias de planejamento pedagógico, a coordenação da Escola Municipal Irmã Irma Zorzi propôs uma recepção dos professores aos alunos mais novos no primeiro dia de aula com uma dinâmica interativa, vestindo fantasias. A atividade teve o aval da Secretaria Municipal De Educação de Campo Grande. Em nota ao portal G1, a pasta afirma que “o uso de fantasias e caracterizações é um recurso pedagógico adotado por professores”. O propósito de divertir as crianças, mais tarde acabou se tornando um problema para Emy. Ela foi vestida de Barbie, com uma peruca rosa, saia e botas de cano alto. Em entrevista exclusiva para a AGEMT, Emy diz que “as crianças gostaram e se divertiram com a fantasia”. Por isso, na noite de segunda-feira (10), ela compartilhou um vídeo em sua rede social mostrando essa interação.

No dia seguinte, uma parte do vídeo foi editada para remover seu contexto pedagógico, e acabou viralizando em diversos grupos conservadores da cidade e até mesmo entre os pais dos alunos. A professora, que já vinha recebendo ataques, revelou em entrevista que a situação piorou na quarta-feira (12), após uma postagem do deputado federal Nikolas Ferreira do PL de Minas Gerais. Nikolas publicou em seu Instagram um story com um corte do vídeo de Emy, com as frases “Porque nunca em asilos? Ou para doentes? Ou sem teto? Porque é sempre pra crianças?”.

A publicação fez o caso sair de Campo Grande e se espalhar pelo Brasil todo. Veículos de mídia do país inteiro repercutiram o vídeo, sem explicação alguma do contexto pedagógico da dinâmica, da qual todos os professores participaram. Emy rapidamente virou alvo de ameaças. Parlamentares a atacaram nos plenários da Câmara Municipal, referindo-se a ela no masculino e falsamente a acusando de “violar a inocência infantil”.

Emy revelou que não pode mais sair de casa por segurança. Apesar dela ter registrado as ameaças na polícia e a Secretaria Municipal de Educação de Campo Grande ter defendido o uso de fantasias como recurso pedagógico, a narrativa transfóbica rapidamente ganhou força e sobressaiu-se, reforçando a vulnerabilidade de pessoas transgênero nos espaços de trabalho.

Ela também conta que já sofreu outros casos de transfobia no âmbito escolar. A professora comenta que no ano passado, foi perseguida por uma professora religiosa, que desrespeitava seus pronomes em sala de aula e proferia “palavras de Deus” contra ela. Emy também diz que coordenadoras da escola constantemente se referiam a ela no masculino. 

Nikolas Ferreira (PL-MG), apontado por Emy como o causador do estopim para a maior parte dos ataques transfóbicos, já tem um histórico de divulgação e exposição de pessoas trans a ataques de ódio e violência. O deputado é réu em processo por exposição de uma adolescente trans nas redes sociais. Nikolas também já foi alvo de uma representação no conselho de ética por uma fala transfóbica no plenário, além de ter sido processado pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP) pelo mesmo motivo.