Problematizando os filtros do Instagram Stories

De início uma brincadeira, e agora necessidade para melhora da autoestima
por
Gabriella Maya
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21/09/2021 - 12h

Por Gabriella Maya

 

Os veículos de comunicação oprimem e controlam o corpo e a aparência das mulheres desde o seu surgimento, criando padrões de beleza praticamente inatingíveis e escravizando mulheres. Hoje, na era das redes sociais, essa questão se intensifica, com influenciadoras digitais e ‘publis’ de cirurgias plásticas aparecendo na nossa tela quase que diariamente. 

O Instagram é o quarto aplicativo mais baixado e usado no mundo, e também o mais problemático de todos eles. Nele é possível selecionar constantemente, e com cuidado, o que se quer postar e qual parte da vida compartilhar com os seguidores, sempre na procura por elogios, curtidas e novos seguidores.

Os filtros do Instagram começaram como uma forma divertida e inofensiva de "se fantasiar", com orelhinhas de cachorro, bigodes de gatinhos e óculos divertidos. Mas não demorou muito para surgiram os efeitos que transformassem completamente nossos rostos, aumentando a boca, afinando o nariz, puxando os olhos e maquiando a pele. O efeito "Kardashian" se popularizou no mundo inteiro e a Internet como intensificadora da sociedade e de suas rupturas, demonstrou isso como nunca antes.  

Por mais inofensivos que os filtros do Instagram possam parecer, eles transformaram a forma como as pessoas se enxergam ou como elas gostariam de serem vistas. Hoje em dia postar uma selfie sem nenhum filtro ou edição, se tornou um ato de coragem e quase um posicionamento político. As pessoas olham para suas imagens deformadas na tela do celular e enxergam isso como um upgrade de si mesmo, comparando sua real aparência com a versão computadorizada e nada humana que os filtros nos oferecem.  

Para refletir sobre essa questão, Maria Rosa Gomes e Andressa Bastos, duas psicólogas que tratam principalmente de questões sobre autoestima.

AgeMT: Na era das doenças mentais e baixa autoestima, na sua opinião profissional, os filtros do Instagram são um problema para a autoestima dos jovens?  

Maria Rosa Gomes: É interessante ressaltar que o uso dos filtros nos apps inicialmente tinha a proposta de diversão, era usado para brincar com amigos trocando partes do corpo humano como por exemplo o nariz, pelo nariz de um de gatinho. Porém com o passar do tempo foram sendo disponibilizados filtros para eliminar “imperfeições”. Mas essas correções começaram a se tornar uma mania entre os jovens. Existem aqueles que já apresentavam problemas com autoestima e por isso faziam uso dos filtros, e aqueles que estavam bem com sua aparência, mas que com o tempo passaram também a se sentirem diferentes e fora do padrão estético. Então a resposta a essa pergunta é sim, eles são um problema, entretanto eles não são sua causa mas sim seu recurso, o qual é facilmente disponibilizado e que colaboram, e muito, para que os jovens se sintam inadequados e busquem por uma perfeição que na verdade não existe. 

Andressa Bastos: Sim, eles são um problema, porque ali é como se fosse a busca pela pele perfeita, rosto perfeito, mostrar que estar sempre bem, mas quando na verdade, na adolescência, com a entrada da puberdade e todas as transformações de mentalidade, sentimentos e fisiológicos trazem uma série de transformações e qualquer defeito e imperfeição, que principalmente as meninas apresentam, elas tendem a se comparar com colegas. Os filtros ajudam os jovens a se sentirem mais porém estão mascarando uma realidade.

 

AgeMT: Por que será que as pessoas sentem essa necessidade de se esconder por trás de uma máscara? 

Maria Rosa Gomes: Vivemos em uma sociedade competitiva em que a indústria da beleza ganha milhões por ano com produtos cosméticos, roupas, acessórios e cirurgias plásticas. O ser humano está sempre a procura de ser aceito e amado e quando chega na adolescência essa busca se torna mais urgente pois precisam encontrar seu lugar, seu grupo, se firmarem, serem aceitos. Quando entram numa rede social e percebem que são muito diferentes do que vêem, usam as “correções” dos filtros para buscarem uma “perfeição”, querem se sentir adequados a um padrão de beleza irreal criado em uma realidade virtual. Ter uma boa auto-estima e assumir suas próprias características físicas e de comportamento é uma construção que começa desde criança e é validada pelas pessoas significativas de sua vida. 

Andressa Bastos: Pois é mais fácil de lidar com um mundo, principalmente nessa era digital que estamos vivenciando, onde tudo é informatizado, e as relações estão cada vez mais virtuais. Então as pessoas vestem uma máscara social para poder se relacionar com as pessoas e com o mundo. Elas sentem essa necessidade, porque ali elas podem colocar máscaras e fingir ser algo que não são.  

  

AgeMT: O número de cirurgias plásticas em jovens tem crescido de maneira surpreendente. O aumento foi de 140% só em 2021. Acha que as redes sociais influenciaram nesse crescimento?  

Maria Rosa Gomes: Sim. Fazer postagens recorrentes de fotos com filtros e ficar olhando para elas leva os jovens a uma comparação da imagem real com a imagem criada, passam a admirar a imagem criada e não se reconhecerem mais na imagem real. A cada vez que se olham no espelho passam a observar e desejar corrigir o “defeito” que vêem. Existe um transtorno chamado Dismórfico, nele a pessoa tem um foco obsessivo em um “defeito”, que pode ser pequeno ou imaginário, mas a pessoa passa horas por dia tentando corrigi-lo. Sendo assim estamos diante de uma questão importantíssima que requer atenção de pais, amigos, professores ou qualquer pessoa que perceba um comportamento exacerbado de um jovem nesse sentido. 

 Andressa Bastos:  Sim, as redes sociais nos aproxima de artistas e de pessoas que são consideradas padrões de beleza, e fazemos sempre essa comparação. Ficamos frustradas que não somos bonitas igual a artista que seguimos. Acompanhar essas pessoas com milhões de seguidores, considerada um ícone, uma pessoa bela, nos gera essa vontade de estar consertando o corpo. Queremos uma cirurgia de nariz, diminuir os seios, aumentar os seios, fazer lipo, deixar a cintura fina, enfim, muitos detalhes do corpo que não precisariam ser um problema, mas acabam sendo com essa comparação do ‘padrão de beleza’, onde quem está fora se tornar feio e precisa se corrigir para se tornar bonita, então as redes sociais influenciam muito essa necessidade de inclusão.  

No Instagram todos são perfeitos, ne? Precisamos nos conscientizar quanto à essa cultura doentia das redes sociais. Tá tudo bem não ter a pele perfeita, o corpo perfeito, afinal, quem decide o que o 'perfeito' não é mesmo?

A esquerda, psicóloga Maria Rosa Gomes, e a direita, psicóloga Andressa Bastos.