A discussão sobre o fim da obrigatoriedade das autoescolas para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) voltou à pauta em Brasília com reunião na terça-feira (2) com o secretário nacional de trânsito, Adrualdo Catão, apresentando a proposta do Ministério dos Transportes em audiência pública na Comissão de Viação e Transportes. De um lado, o Ministério dos Transportes estuda uma proposta administrativa que prevê a possibilidade dos candidatos se prepararem de forma independente ou com instrutores autônomos credenciados. De outro, na Câmara dos Deputados, tramita desde 2020 o Projeto de Lei 4.474, de autoria do deputado Kim Kataguiri (União Brasil-SP), que propõe mudanças semelhantes no Código de Trânsito Brasileiro. Apesar do avanço das conversas, nenhuma alteração está em vigor. No caso da proposta do Executivo, a minuta ainda não foi publicada e será debatida internamente pela Secretaria Nacional de Trânsito (SENATRAN) antes de uma eventual consulta pública.

O argumento central, tanto no governo quanto entre parlamentares defensores da mudança, é o de reduzir os custos para quem busca a habilitação. Estimativas trazidas pela SENATRAN apontam para uma queda de até 80% no valor final da CNH, hoje considerado proibitivo para parte da população. O modelo em estudo prevê a possibilidade de estudo teórico individual, material didático gratuito disponibilizado pelos órgãos de trânsito e aulas práticas com instrutores independentes credenciados. Atualmente, a legislação exige 45 horas de curso teórico e 20 horas de prática em Centros de Formação de Condutores (CFC). Há ainda exigência de taxas e três exames: aptidão física e mental, teórico-técnico e prova prática veicular.
Luiz Fonseca, instrutor de pilotagem há mais de 30 anos, especialista em trânsito e direção defensiva, enfatiza a importância das autoescolas e seus instrutores, principalmente na preparação de condutores para a prova teórica. “Não podemos simplesmente deixar que as pessoas façam o exame, o formador é parte muito importante pelo seu tempo de experiência, com ele o condutor tem a chance de questionar e perceber situações de consciência e mentalidade de como trabalhar com o veículo”.

Durante a audiência pública, Adrualdo Catão menciona o aprimoramento dos exames teórico e prático, não os tornando mais difíceis ou fáceis, mas tornando-os mais próximos do que é necessário para um modelo de segurança viária funcional. “Não é o suficiente, a prova não torna o candidato habilidoso, ela checa se ele está pronto ou não, só o exame é muito pouco”, frisou o especialista Luiz Fonseca.
Outro ponto destacado pelo representante do Ministério dos Transportes, é a possibilidade de escolha quanto à modalidade do curso teórico, que poderá ser realizado em formato EaD, de maneira síncrona ou assíncrona, tanto pela plataforma da SENATRAN, quanto em uma autoescola ou Escola Pública de Trânsito (EPT). Concluída essa etapa, o candidato deverá comparecer ao Detran para a coleta de biometria e o pagamento das taxas obrigatórias, procedimentos sintônicos ao modelo atual. Em seguida, o candidato realizará os exames médicos e a avaliação psicológica e, caso aprovado, o candidato prestará a prova teórica. A partir desse momento, o cidadão poderá optar pela carga horária destinada às aulas práticas, que variam de 0 a 20 horas, sob acompanhamento de um instrutor credenciado, seja autônomo ou vinculado a uma autoescola. Por fim, o processo se encerra com a prova prática de direção veicular.

Para o especialista Luiz Fonseca, há alternativas mais eficazes para reduzir o custo da CNH. Uma delas seria a criação do programa ‘Pró-Motorista’, nos moldes do ProUni (Programa Universidade para Todos). Outro levantamento feito por ele é a revisão das taxas cobradas de autoescolas e alunos, que, segundo ele, poderiam ser reduzidas para aliviar o alto custo. “O modelo ideal é a formação de condutores com mais conhecimento e informação. A legislação brasileira tem um ponto negativo onde não permite que o instrutor leve o aluno em uma grande avenida, como ele vai aprender? Ele vai ter que aprender sozinho”, finaliza.
“O problema é caso o projeto venha de uma vez, trazendo uma crise no mercado e uma formação para os condutores deficiente”, diz Natan Lopes, professor da Autoescola Pinheiros, segundo ele é importante a lei entrar em vigor com um processo progressivo. Caso o projeto de lei seja aprovado, segundo requerimento nº 4.129/2023 da FENAUTO (Federação Nacional das Autoescolas do Brasil) o impacto econômico seria negativo para milhares de profissionais do setor e muitas empresas do ramo enfrentariam desafios com a não obrigatoriedade das aulas.
Para o instrutor, a proposta traz dúvidas quanto a possíveis problemas no ensino dos condutores. ”A proposta que tira a obrigatoriedade da autoescola, simplesmente tira sua exigência. Não traz uma proposta eficiente para a ausência dela”, completa Natan. Ele também comentou a importância de resolverem a demanda das estruturas de tráfego e de outros meios de transporte, além dos automóveis.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o terceiro colocado no ranking em mais mortes por acidentes de trânsito, ao mesmo tempo é o quinto país mais caro para comprar e manter um automóvel, de acordo com levantamento da Scrap Car Comparison. Dados como estes aumentam o debate sobre a viabilidade do projeto de lei.