A Pinacoteca e seu relacionar com os seres

“Como museu público, a Pinacoteca tem o dever de estar em contato com a realidade do país e de apresentar da maneira mais democrática e plural possível”
por
Victória Toral de Oliveira
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29/06/2022 - 12h

Por Victoria Toral

 

  Foto: Victória Toral 

 

Olhar para fora de nossas bolhas faz com que consigamos enxergar além daquilo que nos rodeia. Provoca, de início, um estranhamento para nossa visão. Mas com o passar do tempo gera a expansão de nossos conhecimentos e assim, permite desenvolver um indivíduo com menos preconceitos. Compreender a presença das diferentes culturas existentes e ir atrás das que proporcionaram base para a formação da sociedade te leva a enxergar de maneira mais ampla a história do mundo. Mas com o modo de vida que temos nos dias de hoje, com a liquidez das relações e da busca pelo conhecimento, o número de pessoas consumidoras de conteúdos culturais, como maneira para buscar conhecimento não é algo grande. 

Exposições em museus são ótimas maneiras de proporcionar interações entre o homem e as múltiplas culturas. Poder apreciar o sentimento, o protesto e a história que o artista buscou apresentar em um material, como em pinturas, fotos, estátuas e outros projetos é uma das formas mais profundas de consumir diferentes mundos em um só local. Artistas, com estilos, visões e o pensar diferentes, abriram as portas para o raciocinar fora de nossas bolhas. 

Em São Paulo, com inúmeros museus presentes na cidade, a busca por entretenimentos culturais torna a lista de opções diversificadas. Museu como o Masp, na Paulista, o museu da Imagem e do Som, no Jardim Europa, o do Futebol, no Pacaembu, e a Pinacoteca, são bons exemplos para pessoas que buscam caminhos para expansão cultural. 

A Pinacoteca, por exemplo, fundada em 1905, e pertencente a Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, é um dos mais importantes museus do país. Localizada no Centro de São Paulo, o museu contou, em primeiro momento, com 26 pinturas, todas vindas do Museu Paulista da USP. E hoje em dia, apresenta um acervo com mais de 10 mil obras de arte. 

Composta por diversas exposições dentro de seu edifício, o museu proporciona a seus visitantes múltiplos modos de visão do mundo em apenas uma única visita. Thierry Freitas, Curador da Pinacoteca, conta, durante uma entrevista, que isso se dá por causa da diversidade e da pluralidade em seu acervo, que busca novas linguagens e novas perspectivas críticas sobre a sociedade brasileira e sobre o sistema de arte.  Com projetos ligados à arte visual, o museu traz ênfase em obras brasileiras, do século XIX até a contemporaneidade. Thierry fala, ainda, que isso se dá por conta do foco estar no Brasil, “ A Pinacoteca coleciona apenas artistas brasileiros ou artistas estrangeiros que produziram no Brasil, ou produções que versam sobre o Brasil… Em 2019, a gente comprou via programa de patronos, que é o nosso dispositivo Institucional para adquirir obras e continuar formando a nossa coleção, compramos as primeiras duas obras de artistas indígenas contemporâneos, do Denilson Baniwa e do Jaider Esbell.”

Mas a relação desse edifício com a sociedade não é focada apenas em abrir espaço para a visualização de obras magníficas. A Pinacoteca, além de proporcionar aos seus visitantes a relação do ser com as obras, permite que eles criem ali uma relação consigo mesmo e uma conexão com outros frequentadores. Por meio da transmissão de sentimentos, essa estrutura provoca uma nova e intensa socialização, que só é criada quando se está presencialmente no museu, um sentimento que não há adjetivação suficiente e, acredito que nem exista, para descrever. Uma sensação única a cada frequentador e consumidor das obras que ali estão presentes. 

O edifício é um ótimo ponto para se visitar, mas engana-se quem acredita que em apenas um dia é possível conhecer todas as exposições ali presente. Cada sala do museu é formada por grandes quantidades de trabalhos e em cada canto da Pinacoteca há informações para ser digerida. 

 

Foto: Victória Toral 

Os visitantes, sendo eles pais com seus filhos, namorados, amigos, ou até mesmo sozinho, buscam o museu como uma das maneiras para se entreter e ao mesmo tempo aprender. Mas, também, há aqueles que vão para conseguirem ótimas fotos. Com uma arquitetura de tirar o chapéu, a composição das obras com a estrutura do prédio dá àqueles que buscam o clique perfeito ótimos cenários para suas fotos. 

Mas, a verdade é que o museu carrega uma grande importância para a sociedade brasileira. E manter essa estrutura presente em nossa cultura permitirá continuarmos contando nossas histórias. “Como museu público, a Pinacoteca tem a função de divulgar nossa arte, mas também de formar público, tanto oferecendo dias gratuitos para a entrada, como cursos com vagas gratuitas para professores da rede pública ou visitas educativas focadas em determinados grupos, muitos deles em situação de vulnerabilidade social, que entram no museu pela primeira vez. Acho que, como museu público, tem o dever de estar em contato com a realidade do país e de apresentar da maneira mais democrática e plural possível.” ressalta Thierry. 

A cultura não pode e não deve ser esquecida, ela é a base para a formação do indivíduo, como explica Milene Chiovatto, coordenadora do Núcleo de Ação Educativa da Pinacoteca de São Paulo, em sua análise “A cultura é um direito. Ela aparece, ao lado de alimentação e saúde, por exemplo, na declaração dos direitos humanos, de 1948. E assim é, pois a formação cultural é parte constituinte da identidade de cada um. Não é possível separar o indivíduo de sua cultura. Nessa perspectiva, a arte é um dos aspectos culturais que participam daquilo que cada um de nós é.” 

E, bloquear a presença de certas classes para o consumo artístico provoca em toda a sociedade um atraso não apenas cultural, mas educacional. Como enfatizado por Milene, “A frequência cultural é, assim, um dos meios para fortalecer e repensar as identidades.”. Excluir qualquer que seja o indivíduo de vivenciar e compreender as diferentes bolhas existentes, através das artes visuais é colocar em xeque o crescimento social, pois, principalmente no cenário atual em que estamos, onde a estrutura das redes sociais, a volatilidade, o visual e a baixa presença de narrações ou expressões escritas estão em alta, a exposição é a forma mais provável de prender a atenção dos indivíduos, como explica Milene: “Numa sociedade midiática e imagética como a que estamos inseridos, as artes, principalmente as visuais, alcançam um outro patamar de importância, já que por meio da reflexão crítica sobre elas, podemos desenvolver um necessário discernimento sobre as imagens produzidas e difundidas no mundo, não nos deixando enganar , por exemplo por falsas informações (fake news); entendendo as imagens do mundo como uma construção intencional cujos bastidores apresentam sentidos muitas vezes diversos do que a imagem final aparenta difundir.” 

 

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