Pedregulho do rock

O compositor marcou geração com suas letras despojadas que empoderaram o rock brasileiro
por
Daniel Seiti, Luise Goulart e Rafael Felix
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09/04/2021 - 12h

               O ex-vocalista do Charlie Brown Jr., Chorão, completaria 51 anos de idade nesta sexta (9). O músico liderou a banda a um sucesso nacional astronômico desde o final da década de 90 até a sua morte, em 2013. 

            Alexandre Magno Abrão nasceu em 9 de abril de 1970, na cidade de São Paulo, onde residiu durante sua infância até se mudar para Santos, no litoral paulista. O curioso apelido que o acompanhou até o final de sua vida surgiu aos 14 anos de idade, criado pelos amigos que se referiam aos choros do jovem quando errava manobras em seu skate. Ali nascia o “Chorão”.

Começou sua carreira aos 20 anos, quando se juntou ao What’s Up. Nesse período, conheceu o baixista Champignon. Após o fim do grupo, a dupla buscou novos membros para a formação de uma nova banda. O conjunto foi completado por Renato Pelado (bateria), Marcão e Thiago Castanho (guitarras).

O nome Charlie Brown Jr. foi originado a partir do desenho “Charlie Brown”, que Chorão encontrou em uma barraca de água de coco. O “Jr.” significava que a banda seria a mais nova geração do rock brasileiro. O estilo musical era bem diverso, misturando elementos do hardcore e do reggae, junto com as influências estéticas advindas do skate.

Foto Charlie Brown Jr.
Charlie Brown Jr.  Foto: divulgação

A banda passou por diversas formações em sua extensa carreira, mas isso não impediu que o projeto se tornasse de grande sucesso no Brasil. Ao total, lançaram 11 álbuns de estúdio, além de três discos gravados ao vivo, recebendo títulos e premiações pelos trabalhos.

“O Chorão era um cara que entedia muito de som, sua genialidade musical era atemporal.  Ele ouvia muitas músicas e tinha um ouvido muito refinado. A gente gravava a voz dele e ele já orientava as próximas coordenadas para as demais vozes. Isso era de praxe, gravávamos, ouvíamos juntos e ele, de certa forma, já pré-mixava ali mesmo”, conta André Freitas, um dos produtores do álbum “La Família 013”, em entrevista à AGEMT.

Freitas relembra como o vocalista era muito exigente e autocrítico durante as tomadas de gravação do disco. “Ele gravava um trecho, ouvia no fone, ouvia na técnica e seguia. E eu, privilegiado por estar ali, aprendi muito”.

Em 6 de março de 2013, aos 42 anos de idade, Chorão é encontrado morto em sua casa, no bairro de Pinheiros, em São Paulo. Após a realização do exame toxicológico do corpo, constata-se que o artista sofreu uma overdose de cocaína.

Seu falecimento acontece em meio as gravações do disco que ainda não havia sido terminado. Freitas explica que “as vozes do álbum já haviam sido gravadas previamente, inclusive, junto de algumas faixas que estavam finalizadas e prontas para serem lançadas”.

O disco “La Família 013”, divulgado em outubro de 2013, foi o último trabalho do conjunto e recebeu uma indicação ao Grammy Latino na categoria de “Melhor Álbum de Rock Brasileiro".

“As músicas “Fina Arte”, “Um dia a gente se encontra” e “Meu novo Mundo”, que seriam os singles do disco, foram gravadas antes”.

“Depois do falecimento dele, entramos em uma rotina: trabalhávamos todas as tardes no estúdio pegando todas as músicas no computador e cobrindo com as guitarras”, conclui Freitas.

La Família 013
Capa do álbum "La Família 013" (2013).  Foto: divulgação

Apesar do fim da banda santista, ainda em 2013, após a morte do vocalista, seu legado segue preservado pelos ouvidos de uma legião de fãs, como o Naderson Henrique, administrador de uma das maiores páginas de fãs do Chorão no Facebook, “O Chorão me ensinou”.

"Ele [Chorão] não pode ser lembrado apenas quando chegar esta data [falecimento], ele é muito mais do que isso. Eu queria ajudar de alguma maneira, então criei a fanpage e 'tamo aí na atividade' até hoje”, explica Henrique para a AGEMT.

Residente em Natal (RN), o administrador da página detalha o motivo de tanto carinho pelo Charlie Brown Jr.

“Não importa o meu estado emocional, sempre vou ouvir Charlie Brown Jr., o Chorão sempre tem um conselho pra te dar e a banda tem uma música pra cada momento da sua vida.” Apesar de cada um ter uma relação diferente com as obras do Chorão, não há dúvida que o músico foi uma figura inspiradora para muitas pessoas. Henrique afirma que sua maior admiração pelo vocalista é devido a sua humildade.

“Ele sabia como conversar com a gente através de suas letras, nos aconselhando a não desistir dos nossos sonhos, mesmo que ainda esteja longe, pois como ele mesmo dizia: temos que ter força, atitude, coragem, respeito...”

Chorão
Foto: Jerri Rossato Lima

Em junho de 2020, o Charlie Brown Jr. se reunia para a realização de um tributo ao aniversário do Chorão, que teria completado 50 anos de idade. O grupo havia planejado uma turnê celebrativa em homenagem ao falecido vocalista para ser iniciada no mês de abril, mas, em função da pandemia de coronavírus, os shows foram adiados.

Contudo, os integrantes convidaram Egypcio, ex-vocalista da banda Tihuana, para assumir os microfones, realizando um show, transmitido através de uma live, para anunciar a adição. 

“Para mim, é uma grande honra. Estarei representando um brother, com quem viajei muito pelas estradas, nos shows e festivais. Será bacana, vou dedicar todo o meu trabalho e atenção a essa tour celebrativa e espero todos vocês nos shows assim que essa pandemia passar”, diz Egypcio à AGEMT.

O conjunto santista é um conhecido de longa data do convidado. Mesmo antes de sua participação em um show do Charlie Brown Jr., em 2014, Egypcio relata diversos encontros fora dos palcos ao longo dos anos.

“Fizemos muitos shows juntos. Pertencíamos [o Tihuana e o CBJr] à mesma gravadora, a Virgin Records, que ficava no Brooklyn (Nova Iorque, EUA), e a gente se encontrava frequentemente. Todos os nossos encontros por aí eram muito bacanas, sempre com muita festa e muita risada”, conta o vocalista.

Egypcio também reconhece a importância do grupo de seus anfitriões para o cenário musical nacional e a relevância de seu front man no meio. “Um letrista que falava a língua da rua, da garotada, do skate. Tudo isso marcou uma geração”.

 

Assista a entrevista com Chorão, durante o programa Ensaio de TV Cultura, em 2009, quando o vocalista nos 29:17 minutos comenta a briga com Marcelo Camelo, do Los Hermanos, e se autointitula “Pedregulho do rock”.

 

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