Parabéns, Juventus!

20 de abril: Moleque Travesso, 100 anos de momentos históricos e amor à camisa grená
por
Guilherme Lima Alavase
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22/04/2024 - 12h

O futebol na cidade de São Paulo nasceu elitizado, sendo praticado pelos jovens ricos e estrangeiros, sobretudo ingleses, que trabalhavam nas ferrovias e empresas inglesas instaladas na cidade.  

Por ser um esporte com regras simples, podendo ser praticado de forma improvisada em qualquer lugar, rapidamente o futebol se popularizou nos bairros periféricos e nas várzeas dos rios da cidade, por isso, foi apelidado de forma pejorativa e preconceituosa de varzeano. 

Seguindo os passos dos times da várzea, os trabalhadores começaram a jogar futebol como entretenimento nos horários de folga e nos finais de semana. Montaram times com os colegas de trabalho, adotando o nome da empresa, organizaram disputas contra as fábricas vizinhas e criaram torneios amadores. Quase sempre por iniciativa dos trabalhadores, os times de fábrica criaram uma tradição operária do futebol paulistano. 

Para a historiadora Fátima Antunes, a popularização do futebol e o sucesso dos times de fábrica criaram as condições para os primeiros passos no futebol profissional como conhecemos hoje. Os industriais logo perceberam o potencial do futebol, pois os times estampavam o nome da fábrica em seu uniforme, garantindo publicidade à sua marca.  

Para obter sucesso nos jogos, os empresários patrocinavam o time, contratando bons jogadores para trabalhar como operários e defender a empresa nos campeonatos. Para os bons jogadores, a contratação pela empresa como jogador operário permitia certa ascensão social, pois, além de receber uma premiação como jogador, recebia o salário como operário da fábrica, geralmente em ocupações menos penosas e mais bem remuneradas.

 

Camisa comemorativa do centenário do Juventus
Camisa comemorativa do centenário do Juventus - Foto: Instagram @oficialjuventus

 

A saga do Clube Atlético Juventus começou em 20 de abril de 1924, época em que o bairro da Mooca reunia diversas fábricas ao longo da linha do trem, e era ocupada por imigrantes, sobretudo italianos, que trabalhavam nas indústrias da região.  

A partir da união de dois times de várzea, criados por trabalhadores da empresa de tecidos da família Crespi no bairro da Mooca, o Extra São Paulo F.C. e o Cavalheiro Crespi F.C., criou-se o Cotonifício Rodolfo Crespi Futebol Club, em homenagem ao industrial italiano, patrocinador do time. 

 

dirigentes
Equipe e dirigentes do Cotonifício Rodolfo Crespi – década de 1920

  

Em 1925, o industrial, satisfeito com os resultados do time em campo, cedeu um terreno de sua propriedade, situado na atual Rua Javari, para a construção de um campo de futebol, com arquibancadas de madeira, onde o time mandava os seus jogos. Anos mais tarde, o campo da Rua Javari passaria por reformas e, em 1941, o estádio Conde Rodolfo Crespi foi inaugurado. Embora utilizado pelo clube, o estádio pertencia a família Crespi. Somente em 1976 o clube comprou o estádio da antiga empresa.

 

 

Torcedores acompanham jogo do Juventus - década de 1930
Torcedores assistindo um jogo do Juventus - década de 1920 

 

  

 Em março de 1930, o conde Rodolfo Crespi, presidente do clube, resolveu rebatizar o time, adotando o nome de Juventus, em homenagem ao famoso time italiano. Como seu filho Adriano era torcedor da Fiorentina, adotaram a cor grená e branca para o uniforme. 

  

Entre tantos momentos que orgulham os torcedores juventinos, um é especial. No dia 14 de setembro de 1930, o time estreava na elite do futebol profissional de São Paulo. Por ser o mais jovem clube, era conhecido como Garoto, e em um jogo realizado no Parque São Jorge, conhecida popularmente como fazendinha, derrotou o forte time do Corinthians. A ousadia do Garoto da Mooca foi chamada de uma grande travessura, imortalizando o apelido de Moleque Travesso.  

  

Nestes cem anos de lutas e glórias, o Juventus revelou grandes jogadores para o futebol brasileiro, tais como: Julinho Botelho (disputou a Copa de 1954), Hércules (jogou a copa de 1958), Lima (jogou a Copa de 1966) e Félix (goleiro tricampeão na Copa de 1970 no México) e mais recentemente, Thiago Motta que jogou no Barcelona e PSG e Luisão, zagueiro da seleção brasileira e ídolo do Benfica de Portugal. 

 

Assistir aos jogos do Juventus na Rua Javari é como voltar no tempo do futebol raiz. Arquibancadas de cimento rústico, poucos banheiros, corredores estreitos e jogos geralmente às 10 horas da manhã, terminando ao meio-dia com sol a pino, pois o estádio não tem iluminação para jogos no final da tarde ou à noite, sem contar que os ingressos só podem ser adquiridos em dinheiro vivo. À parte os inconvenientes, os torcedores acompanham os jogos colados ao alambrado, perto dos jogadores, exercendo grande pressão nos adversários.

 

Torcedores acompanham jogo do Juventus - década de 1930
Torcida acompanhando o jogo no Estádio da Rua Javari – Foto: The 360

 

Foi na Rua Javari que um menino de 19 anos fez o gol mais bonito de sua longa carreira. Pelé deu três chapéus seguidos na zaga, antes de vencer o goleiro juventino, garantindo ao Santos a vitória por quatro a zero. Este gol de placa ficou apenas na memória de quem estava na Rua Javari, pois as emissoras de televisão não fizeram a cobertura deste jogo. 

  

Atualmente, podemos ver nas arquibancadas torcedores com camisetas estampadas com a frase: “ódio eterno ao futebol moderno” demonstrando que parte dos torcedores respeita e idolatra a história operária do clube, e assim querem se manter. Outros torcedores defendem que o estádio se modernize, que tenha iluminação para os jogos noturnos, e que amplie a sua capacidade. Defendem melhorar o estádio, sem descaracterizá-lo ou erguer outra coisa em seu lugar.

  

A discussão entre modernidade e tradição parece não ter consenso. O único consenso é no início, no meio ou no final do jogo, passar na banquinha do Sr. Antônio, dentro do estádio, e comprar o famoso cannoli. O doce típico italiano é vendido na Rua Javari há mais de 50 anos. 

  

E por falar em aniversário de 100 anos, o presente mais esperado pelos torcedores seria voltar à série principal do Campeonato Paulista, mas o clube bateu na trave. Na reta final do Campeonato Paulista da série A2, o Juventus conseguiu passar de fase, derrotando a Ferroviária de Araraquara na disputa por pênaltis, após empatar em casa por 1 a 1 e segurar um novo empate em 0 a 0 na casa do adversário. Nos pênaltis o Moleque Travesso ganhou por 3 a 1.  

 

Na semifinal enfrentou o Velo Clube de Rio Claro. Se vencesse o duelo, garantiria, não apenas a vaga para a final do Campeonato, mas também garantiria a sua volta ao Campeonato Paulista da primeira divisão em 2025, depois de 16 anos amargando a segunda e terceira divisão do futebol paulista. No primeiro jogo, na Rua Javari, O Juventus tomou um gol aos dois minutos do primeiro tempo, após um erro na saída de bola da defesa juventina. O Moleque Travesso pressionou o adversário, mas não conseguiu reverter o placar.

No segundo jogo, na cidade de Rio Claro, o Juventus, apesar de lutar muito, apenas empatou, sem gols, deixando de presentear a sua apaixonada torcida.

 

Não faltou empenho aos jogadores e, sobretudo, apoio da torcida juventina. Ao final da jornada, os torcedores reconheceram o empenho e compreenderam que o presente, tão desejado, ficará para o próximo ano.