O trabalho dos sepultadores (também conhecidos como coveiros) tem se expandido desde que o surto do coronavírus tomou conta do país. Antes pouco mencionado, o serviço prestado por eles hoje está em evidência. Estudos realizados recentemente estimam que esses profissionais recebam salário de R$ 1.000 a R$ 1.500, incluindo adicional de insalubridade.
Com muitas mortes em decorrência deste novo vírus, diversos cemitérios foram obrigados a não realizar velórios e dobraram o trabalho dos coveiros, que enterram muitas vezes o triplo de pessoas que seriam enterradas em um dia “normal”. Este cenário expôs à sociedade estes profissionais, que geralmente não são bem vistos.
A psicóloga Stéfany Cruz realizou um estudo sobre esta categoria profissional. “O que eles mais reclamaram foi da questão da invisibilidade social, o salário baixo, o preconceito por lidar com a morte, o adoecimento mental e o alcoolismo. Relataram também que não tinham segurança dentro dos cemitérios, com alguns episódios de violência, e a falta de equipamentos de segurança”, comentou Stéfany em entrevista à Agemt.
Para o ingresso na profissão, não é necessário ter o ensino médio completo. A maioria dos profissionais possui apenas o ensino fundamental incompleto. O principal motivo da adesão seria para obter uma fonte de renda, embora a adesão fosse baixa.
Em tempos de pandemia, alguns cemitérios, como o da Vila Formosa, na zona leste de São Paulo, considerado o maior da América Latina, estão fazendo um enterro a cada 24 minutos, sobrecarregando o trabalho dos sepultadores. Existem poucas mulheres na função. A idade média desses profissionais está entre os 33 e os 59 anos de idade.
Outro fator interessante apontado por Stéfany é a necessidade de vigor físico para a execução dos serviços. Os trabalhadores são acometidos por muitos acidentes de trabalho e doença. “O que pude perceber claramente foi a questão do alcoolismo e de doenças na coluna, devido ao peso dos caixões e esforço físico na abertura das covas, e também no fechamento delas. Houve casos de exumação de corpos em que eles não tinham máscaras de oxigênio, somente as básicas, que protegem boca e nariz, mas não inibem o odor. O cheiro era muito forte e um dos mais difíceis de suportar”, emendou.
Vista como uma profissão com baixa visibilidade social, os seus adeptos já relataram para diversos jornais o fato de serem invisíveis para a maioria das pessoas. Este quadro teve uma relativa melhora nesse tempo de pandemia, pois, de certa forma, os olhos da população foram voltados para este tipo de serviço.
Há uma grande necessidade, como dito por Stéfany, de se ter força física. O trabalho é exaustivo e geralmente exposto ao calor. Estas características, somadas à baixa remuneração e aos estigmas que sofrem, fazem com que muitos desistam da profissão em apenas uma semana ou um mês de trabalho, por medo ou preconceito, algo incomum em outros serviços.
Nas redes sociais têm circulado diversas fotos que mostram que a demanda por sepultadores subiu de forma elevada. Em algumas cidades, inclusive, há imagens de caixões empilhados e nenhuma pessoa presente para uma “despedida”, tornando a profissão de certa forma “melancólica” para aqueles encarregados de enterrar os mortos.
O que Stéfany ressalta de importante é o desejo de mais qualidade no trabalho manifestado pelos sepultadores: “Todos com os quais tive contato desejam apenas uma remuneração maior, mais respeito por parte das pessoas, mais segurança no trabalho e mais condições de trabalho 'dignas', pois acreditam que são invisíveis em todos os sentidos”, completa.
Talvez se possa ver em algum futuro próximo uma outra percepção destes profissionais, pois a pandemia terá “efeitos colaterais” em diversas áreas de atuação e do conhecimento, fazendo com que algumas ocupações possam ser pensadas, e, no caso dos sepultadores, que os cemitérios e crematórios ofereçam as condições de trabalho que eles desejam.