Os prejuízos da China pós-coronavírus

por
Fabrício Indrigo
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15/05/2020 - 12h

A segunda maior economia do planeta está enfrentando uma situação que ameaça todos: a desaceleração econômica, cujo principal agente causador é a pandemia da Covid-19. O surto da doença não atinge apenas o setor econômico, como também o social.

Em território chinês, estima-se que até o dia 20 de abril houve um total de 84.237 contaminados, 77.084 curados e 4.642 mortes. Diversas províncias foram bloqueadas, como Habei, cuja capital, Wuhan, foi o epicentro da doença e supostamente o local onde se originou o corona. Devido ao fechamento dessas províncias, muitas empresas e indústrias acabaram por demitir funcionários. É necessário lembrar que a China ainda é considerada um país em desenvolvimento, com mais de 5,5 milhões de pessoas abaixo da linha da pobreza extrema (estabelecida pelo governo em 2.300 iuanes, cerca de US$ 330 por ano). Além do aumento do desemprego, houve cortes de salários após o surto do coronavírus.

Pessoas aguardando transporte em Wuhan (Foto:OlharDigital)
Pessoas aguardando transporte em Wuhan (Foto: OlharDigital)

Com isso, o Partido Comunista da China provavelmente não conseguirá cumprir a promessa de transformar o país em uma “sociedade de classe média” até o fim deste ano e deve enfrentar uma instabilidade social jamais vista nas últimas quatro décadas. Entre dezembro e fevereiro, os dados oficiais do governo indicam um acréscimo de 5 milhões de pessoas no contingente de desempregados. 

O banco Nomura, conhecido por sua visão pessimista dos fatos, estima perda de 18 milhões de vagas de emprego no setor de exportação chinês, que representa um terço da mão de obra. Essa possível explosão do desemprego afeta não somente o governo chinês, como os governos mundiais, visto que a China é grande parceira comercial de inúmeros países, como é o caso do Brasil.

Todas essas perspectivas trazem um fato: o PIB da China contraiu-se em 6,8% no primeiro trimestre deste ano, segundo dados do Gabinete Nacional de Estatística. É o primeiro recuo desde 1976, ano da  morte de Mao Tsé-Tung e de seu primeiro ministro Zhou Enlai, além de ao menos  250.000 pessoas, devido a um terremoto na região de Tangshan. Nessa ocasião o PIB encolheu 1,6%. O PIB registrado neste trimestre também representa a menor marca desde 1961, quando a economia chinesa despencou 27,3%, devido, segundo historiadores, a políticas equivocadas do líder da revolução.

Desde então, a economia do país tem passado ilesa e com índices extremamente positivos perante as últimas crises mundiais: “torres gêmeas em 2001” (+ 8%), “crise de 2008” (+ 9%) e a recente “guerra comercial com os EUA” (+ 6,7%). O declínio do primeiro trimestre, apesar de esperado, pode prenunciar uma crise sem precedentes. 

Os setores que levaram a esse resultado no primeiro trimestre foram a indústria (que abrange atividades de manufatura, mineração e serviços públicos), com recuo de 13,5%, as vendas no varejo (-20,5%) e  os investimentos em ativos fixos (despesas com itens que incluem infraestrutura, propriedades, máquinas e equipamentos), com queda de 24,5%. Esses números catastróficos, somados à desaceleração da economia em virtude da guerra comercial com os EUA, ligaram o alerta em Pequim.

Apesar dos dados ruins, o governo mantém um discurso otimista em relação à recuperação. As autoridades afirmam que as consequências da crise econômica são “de curto prazo e controláveis”. 

O economista-chefe da China International Capital Corporation, Liang Huang, afirma que, se a situação se mantiver estável, o país conseguirá um crescimento na casa dos 6%. No entanto, agências internacionais calculam uma expansão de “apenas” 4,8%, o que seria o menor índice anual das últimas três décadas “Precisamos nos preparar para uma crise longa”, disse o conceituado economista Andy Xie, em entrevista ao Valor Econômico, alertando que a recuperação total da economia deverá demorar cerca de uma década.  

O governo chinês também deverá se preocupar com o boicote de economias importantes, como Japão e EUA, que planejam remanejar empresas que hoje operam na China. O Japão inclusive já destinou cerca de US$ 2,2 bilhões do pacote recorde de US$ 1 trilhão em estímulos à economia após o baque causado pela pandemia do coronavírus.      

Esses US$ 2,2 bilhões são divididos da seguinte maneira, US$ 2 bilhões serão destinados para empresas que desejem retornar ao Japão, e os outros US$ 200 milhões para empresas que desejem se mudar e se instalar em outros países. A situação dos americanos é parecida: no mesmo dia em que o Japão anunciou o pacote, o diretor do Conselho Econômico Nacional da Casa Branca, Larry Kudlow, afirmou que os EUA devem pagar custos de mudança de qualquer empresa americana que decida sair da China.

A Covid-19 assombra o mundo: mortes, desemprego, prejuízos ao bem-estar (como saúde mental) estão sendo geradas pela pandemia. O momento é de reflexão e união. A China é acusada de ocultar dados sobre essa doença e enfrentará grande oposição dos líderes mundiais nos próximos meses. A pergunta que fica é: o que o futuro nos reserva? Ficaremos todos bem?