“Os constrangimentos e humilhações se dão, agora, no ambiente virtual”

Profissionais contam que, apesar do ambiente caseiro muitas vezes ser um porto seguro, o assédio persiste no trabalho à distância
por
Leonardo Matias Duarte e Rafael Duarte Casemiro
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04/07/2021 - 12h

 

Katiúscia Alves, 37 anos, professora na Escola Genêsis, relatou já ter sofrido, e conhecer muitos colegas que também sofreram algum tipo de assédio, seja ele moral ou sexual. A professora de matemática não é uma exceção, pois, segundo levantamento do Datafolha, uma em cada quatro mulheres foi vítima de algum tipo de violência no Brasil durante a pandemia da Covid-19. A pesquisa concluiu que 19% das 2.079 mulheres ouvidas sofreram ofensas verbais dentro de suas próprias casas, com o agressor sendo alguém conhecido. Em mulheres acima de 50 anos, cresce o número de participações de filhos e enteados nas agressões. O levantamento mostra também um avanço nas subnotificações de casos de violência doméstica, devido à um maior tempo que passam  junto de seus agressores.

“Acho que surge uma nova modalidade de assédio, que se esconde atrás da pandemia e da necessidade de manter negócios abertos e lucrando", a pesquisa do Datafolha apontou ainda o fato das mulheres vítimas de assédio doméstico serem as que mais perderam renda e ficaram desempregadas durante a pandemia.

Alves relata também a dificuldade das mulheres de associar as tarefas de casa com o trabalho e a criação dos filhos, “tivemos o bônus desse período passar a ser integral e associado a tantas outras demandas, como lavar, passar e aprender tudo sobre as tecnologias, sobre as plataformas, e sobre como dar aula remotamente.”

Simone Figueiredo, 48 anos, sócia da Build Up Carreira e Desenvolvimento, tem 20 anos de carreira corporativa em RH e hoje trabalha com o desenvolvimento de profissionais. Ela conta que, apesar de grata por ter mais tempo com a família, teve dificuldades em se adaptar ao trabalho a distância no começo da pandemia, pois se sentiu esgotada devido ao um número desnecessariamente maior de reuniões e brinca com como foi surpreendida com a mudança para o trabalho a distância, “Dormi no modelo 100% presencial e acordei no 100% home office”.

Figueiredo confessa que, assim como muitas das vítimas, não tinha consciência quando sofreu assédio moral no seu primeiro emprego, “Isso ficou claro pra mim muitos anos depois, quando já não estava mais naquela empresa.”

Com sua experiência em lidar com funcionários e funcionárias em assuntos de violência, ela nota que os maus tratos ainda são muitos e as práticas do passado continuam acontecendo, porém de maneiras diferentes, “Os constrangimentos e humilhações se dão, agora, no ambiente virtual”, queixa Figueiredo sobre a permanência dessa violências. “Tem ainda a questão da privacidade com uma possível obrigatoriedade de deixar a câmera aberta em reuniões ou a exigência de estar conectada fora do horário de trabalho”

Por fim, em um desabafo sobre toda a situação vivida por trabalhadores, principalmente as mulheres, no momento de pandemia, ela diz, “O cansaço pesou. E isso é humano, não somos robôs. Posto tudo isso, eu diria que não, o ambiente caseiro não tornou o trabalho mais confortável.”

 

 

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