Por Helena Barra
A mobilidade elétrica já faz parte do cotidiano de milhões de pessoas na América Latina — e, embora os investimentos públicos impulsionem grandes frotas de ônibus elétricos, é nas ruas que essa transformação se revela de forma mais íntima. É no trajeto da faculdade, na volta de uma festa, na pressa para chegar ao trabalho ou na tentativa de driblar o trânsito impossível. Para o estudante de jornalismo da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), Davi de Almeida, os patinetes e as bicicletas elétricas representam justamente essa mistura de liberdade, improviso e modernização da cidade. Ele começou a usar patinetes elétricos no início de 2024, quando percebeu que eles estavam cada vez mais presentes no caminho entre sua casa e a universidade. O que chamou sua atenção foi a praticidade. É possível encontrar esses transportes em praticamente qualquer lugar. Eles ocupam a cidade de um jeito muito prático. Para ele, o transporte elétrico virou uma espécie de atalho emocional e físico — uma forma de escapar tanto do trânsito quanto da rotina pesada de São Paulo.
Além da sensação de liberdade Davi reconhece a importância ambiental. Diz que é uma forma de evitar os transportes a combustão ajudando o meio ambiente usando patinete, bicicleta, essas opções elétricas. Essa motivação ecológica tem guiado não apenas jovens como ele, mas também governos que buscam reduzir emissões de carbono e melhorar a qualidade do ar. Em várias cidades latino-americanas, ônibus elétricos substituem gradualmente veículos antigos movidos a diesel, e bancos públicos, como o BNDES, financiam a modernização das frotas.
Desde 2017, a América Latina já investiu mais de R$ 23 bilhões em transporte público elétrico, com destaque para Santiago, Bogotá e São Paulo. Os grandes números mostram a direção de um futuro mais limpo. Mas, nas calçadas e ciclovias, o impacto aparece de forma muito mais pessoal — e às vezes contraditória.
Mas, se a mobilidade elétrica já representa um avanço coletivo, ela também apresenta obstáculos muito concretos no dia a dia. A primeira barreira é o preço. Embora os patinetes e bikes elétricas sejam acessíveis para trajetos ocasionais, tornar esse uso cotidiano ainda é impossível para grande parte da população. Usar entre um passeio ou outro é viável, mas colocar isso na rotina é irreal. Não combina com a realidade das pessoas. O custo por minuto e as tarifas por desbloqueio transformam o transporte elétrico individual em um meio prático, mas caro.
A segunda barreira é a dependência total dos aplicativos das operadoras privadas. É frustrante apostar em um meio de transporte que, como ele diz, pode simplesmente parar de funcionar sem aviso. Foi o que aconteceu numa noite voltando de uma festa na Vila Madalena. Ele desbloqueou o patinete, seguiu viagem pela Avenida Sumaré e, de repente, o veículo travou. O aplicativo alegava falta de saldo, embora ele tivesse acabado de recarregar. Teve que abandonar o patinete e seguir metade do caminho a pé. No meio da madrugada. Diz ter sido uma experiência frustrante. Apesar das falhas, ele também relembra de trajetos em que tudo funcionou perfeitamente. Conta que chegou a ir do Itaim até Perdizes rapidinho. Quando o serviço funciona bem, parece que a cidade se abre. A presença constante desses veículos nos bairros, a facilidade para encontrá-los e a possibilidade de escapar do trânsito tornam a experiência sedutora, especialmente para quem vive numa metrópole em que carro, ônibus e metrô nem sempre dão conta.
Essas experiências individuais se conectam a uma discussão maior sobre como financiar e democratizar a mobilidade elétrica. No transporte público, o avanço ocorre graças a grandes financiamentos e políticas específicas. Mas, no transporte individual — patinetes e bikes de aluguel —, o usuário ainda arca com quase todo o custo. Especialistas afirmam que, se esses modais fossem integrados ao sistema público, subsidiados ou regulados como parte essencial da mobilidade urbana, poderiam se tornar mais acessíveis e confiáveis.
No final, a trajetória de Davi mostra exatamente onde estamos na transição energética urbana: em um momento intermediário, em que a tecnologia já está nas ruas, mas a acessibilidade e a confiabilidade ainda não acompanharam o avanço. Davi segue usando os patinetes elétricos porque, apesar de tudo, eles oferecem algo que nenhum outro transporte oferece: movimento livre numa cidade que parece sempre travada e segue achando que é uma forma de acessar frestas da cidade que nenhum outro transporte consegue.