Por Luiza Zequim
O primeiro gesto da manhã, antes mesmo de escovar os dentes, é verificar o celular. A última coisa antes de dormir é uma rolagem final pelo feed, muitas vezes prolongada até a madrugada. Esta é a rotina de Sofia Molim, uma estudante paulista de 21 anos da faculdade de administração da FGV (Fundação Getúlio Vargas). Essa prática descreve um ciclo vicioso que muitos jovens e adultos não conseguem escapar na era digital. O que começou como entretenimento se tornou uma fonte de ansiedade e perda de produtividade sem fim. Uma pausa no almoço para relaxar se torna mais 15 minutos vidrada em uma tela com vídeos super estimulantes. E a dependência digital vem acompanhada da constante sensação de estar perdendo algo, a popular "FOMO" (Fear of Missing Out).
A jovem descreve como a sua autoestima se tornou submissa à validação digital, às curtidas e aos comentários. Para ela, ver a vida aparentemente “perfeita” de colegas e influenciadores gera uma comparação exaustiva que afeta seu bem-estar. Porém, ela compartilha que o impacto mais concreto é no seu desempenho acadêmico. Horas que deveriam ser dedicadas aos estudos de gestão e finanças são perdidas em filmagens curtas e discussões banais online. A questão se tornou um problema diário quando o consumo de produtos digitais começou a ser incontrolável e inconsciente. Sempre há espaço para um checada nas mensagens, nas fotos no Instagram ou nos vídeos rápidos do TikTok.
Embora comum, o caso da estudante não é isolado. O Brasil é o terceiro país do mundo onde as pessoas passam mais tempo em redes sociais, o enraizamento da doença acaba acarretando um aumento considerável nos laudos psiquiátricos e no consumo de remédios com efeito calmante. Um levantamento do Instituto Cactus, em parceria com a AtlasIntel, revelou que o uso excessivo das plataformas está associado a 45% dos casos de ansiedade em jovens de 15 a 29 anos.
O aumento na procura por ajuda é visível. Ambulatórios especializados em dependência digital, como o da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), registraram um aumento de 400% no número de atendimentos entre 2023 e 2024. Agora, a adversidade até ganhou um nome: nomofobia, o medo irracional de ficar sem o celular. Os sintomas relatados por cidadãos ao redor do mundo são claros: ansiedade, irritabilidade quando desconectado e uma incapacidade de controlar o tempo gasto nas telas.

Hoje em dia, as plataformas são desenhadas para o engajamento máximo, utilizando algoritmos que fornecem doses constantes e escassas de dopamina para que o cérebro sempre queira mais do que é possível consumir e isso torna quase impossível conseguir uma solução por conta própria
A estudante paulista conta que já tentou se afastar, desinstalando aplicativos, mas a pressão social e o sentimento de exclusão a fizeram voltar. Ainda que tenha nome e seja reconhecida por órgãos competentes, os afetados pela condição nociva sofrem com um fator indispensável: o silêncio. Muitas vezes, este novo vício não é sonoro como o alcoolismo ou a compulsão por drogas. Os pacientes sofrem de forma silenciosa e muitos demoram a identificar a origem do cansaço extremo, da falta de atenção, da queda na produtividade, do estresse constante e da falta de um estímulo em atividades do mundo real. Embora ainda seja difícil para muitos aceitar e acolher a questão, ela deve ser tratada pelo que é: um vício. Uma adicção não é curada rapidamente e os afetados por ela estão sempre sujeitos a recaídas, mas ignorar o problema invalida a exaustão mental e faz com que a vida de quem lida com ele diariamente seja ainda mais complexa.