Por Rafaela Dionello e Clara Maia
A relação entre a forma como as pessoas se vestem e a economia é complexa e multifacetada e mesmo dita como uma tendência passageira, o recession core nos explica muito sobre a situação atual do mundo.
A economia influencia diretamente o comportamento de consumo das pessoas, inclusive na escolha de suas roupas e estilo de vestimenta. Traduzido para o português, recession core seria algo como 'tendência da recessão'. “A moda invariavelmente é um reflexo da política e da economia, e por isso esse momento que observamos na indústria não deve ser tratado como somente uma tendência de vestuário”, diz o professor de História da moda, Paulo Mendes.
E sob a constante e muito real crise econômica, a moda tem, naturalmente, reagido. Se manifestando através de uma estética minimalista que chegou até nos tapetes vermelhos de Hollywood. As celebridades estavam deixando de lado os colares vistosos de seus looks de red carpet, optando por deixar o colo nu, combinado a joias pequenas e discretas apenas nas orelhas.
“Em períodos de prosperidade econômica, há uma tendência a seguir as últimas tendências, com uma maior demanda por roupas da moda e produtos de luxo. Por outro lado, durante tempos econômicos difíceis, as pessoas tendem a optar por roupas mais duráveis e clássicas”, afirma o professor.
E porque as celebridades deixarem de usar jóias opulentas em suas produções para o tapete vermelho é um sinal da recessão? Enquanto os menos afortunados se vestem de forma mais modesta por necessidade, os super ricos fazem o mesmo para passar despercebidos. O luxo silencioso vem como uma forma ‘menos agressiva’ de continuar consumindo luxo em períodos conturbados, usando peças que chamam menos a atenção.
Os desfiles da Miu Miu e Saint Laurent para outono/inverno 2023, apesar de não serem os únicos, são os melhores exemplos quando o assunto é esse luxo velado das grandes marcas. A Recession Core pode ser comparada a estética old money, que busca peças sem logo mas que só um bom entendedor de moda sabe identificá-las, com isso, acabam gerando mais distinção sobre as outras classes que usam a logo como ostentação. O reflexo da crise acaba impactando muitas marcas de luxo por não ser empático salientar a opulência em meio a uma crise financeira.
“A economia também influencia a forma como as pessoas valorizam e percebem as marcas de moda. Durante tempos difíceis, as pessoas podem valorizar mais a qualidade, a durabilidade e a autenticidade das peças em vez de seguir tendências passageiras”, conclui Livia Lira, que trabalha com Marketing de moda.
O que está acontecendo agora não é diferente do que aconteceu há 15 anos atrás: “A indústria deve se adaptar rapidamente às mudanças nas preferências e necessidades dos consumidores, buscando soluções criativas para se manter relevante e atrativa”, diz Paulo.
Outro fator estético que acendeu os alertas do recession core foi a volta das tendências ligadas principalmente aos anos 2010, ano esse que sucede a crise de 2008. Na época, A Grande Recessão acabou com a estética exagerada da noite para o dia, os logotipos desapareceram e no lugar chegaram as cores sólidas e cortes de alfaiataria, adotando uma estética business para as vestimentas. Até Stefano Pilati, que tinha se alinhado com o glamour sórdido que era a assinatura de YSL, estava apostando em roupas reais para mulheres reais: “Acho que atemporalidade é uma boa mensagem por enquanto, não?”
O que podemos esperar nas próximas semanas de moda?
Na temporada de inverno 2023, o Quiet Luxury veio não só através do minimalismo como nas peças das coleções da Miu Miu e Saint Laurent, ele também se fez presente nas passarelas com apresentações intimistas e sem artifícios externos. O show fica por conta das roupas. Isso foi frequente em diversas marcas na temporada.
Outro efeito estético que acendeu os alertas do recession core foi a tendência dos infláveis. Diversas marcas como Prada, Rick Owens apresentaram criações “acolchoadas”, sejam nas passarelas ou no ready-to-wear, com aspecto inflável e lúdico. Para influenciadores e comentaristas de moda nas redes sociais, a associação entre a inflação e peças infláveis é clara.
Parece estranho tratar o real problema de uma iminente recessão econômica a nível mundial como mais uma estética passageira das redes sociais porém a relação entre a economia e a forma como as pessoas se vestem é dinâmica e está em constante evolução. A nossa entrevistada Livia Lira fala mais sobre como tendências de moda se moldam através do cenário que estamos vivendo, confira:
Moda, economia e sustentabilidade:
Dentro desse cenário onde, as pessoas acabam buscando um melhor custo-benefício e evitando compras impulsivas, o comportamento de consumo consciente pode ser algo que se instale nas pessoas uma vez que durante crises econômicas ou em resposta a preocupações ambientais, há um aumento no interesse por moda sustentável e ética: “As pessoas podem se tornar mais conscientes das condições de trabalho na indústria da moda, optando por marcas com práticas responsáveis. Além disso, há uma crescente tendência de reutilização, vintage e upcycling, onde as pessoas buscam roupas de segunda mão e dão preferência ao consumo consciente em vez do consumo excessivo”, acredita Paulo.
A moda sustentável tem ganhado destaque nos últimos anos, e sua relação com a economia é bastante relevante. Com o aumento da conscientização ambiental, os consumidores estão exigindo uma indústria da moda mais ética e sustentável e embora a moda sustentável tenha um custo maior para ser produzida, peças mais duradouras e de melhor qualidade saem como efeito desse trabalho.