O falso Oscar da diversidade

Especialistas de cinema vêem a premiação como um marco pontual na história, não uma realidade da academia
por
Daniel Dias, Felipe Albanez, Leonardo Cavazana e Rafael Monteiro
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15/04/2021 - 12h

No último dia 15 de março foram anunciados os indicados da 93ª edição da maior premiação   do cinema, que será realizada no dia 25 de Abril. Por conta das indicações, este já se trata do  ¨Oscar¨ com maior diversidade de todos os tempos, contando com duas diretoras concorrendo a melhor direção pela primeira vez na história, um ator asiático (Steven Yeun), assim como um muçulmano (Riz Ahmed), também os primeiros a concorrer a categoria de melhor ator.

Além da diversidade de concorrentes nas principais categorias, essa edição também será marcada, por ser feita em plena pandemia global, assim como outras premiações já feitas ao longo do ano de 2021: Globo de Ouro (Golden Globes) e Critics Choice Awards (Critics Choice Awards), falando de cinema e séries, e o Grammy (The GRAMMYs) , de música. O Oscar contará com público de forma presencial, sendo os indicados, seus convidados e os apresentadores que irão compor a plateia.

Ainda sobre as categorias, para melhor direção, a mais diversa, temos ¨Chloé Zhao¨ (Nomadland), a favorita a levar a estatueta, pois levou o Globo de Ouro e o Critics Choice Awards, uma diretora chinesa sendo a segunda asiática na história a concorrer nessa categoria, ¨Emerald Fennell¨  (Bela Vingança), que fez história junto com a diretora chinesa, ¨Lee Isaac Chung¨ (Minari), outro com raíz asiática, porém nascido nos EUA,  ¨Thomas Vinterberg¨ (Druk: mais uma rodada), um diretor Dinamarquês e ¨David Fincher¨ (Mank), um diretor mais recorrente na premiação.

diretores indicados
diretores indicados (imagem: Google imagens.)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Mesmo entrando para a história com duas indicadas, esse prêmio poderia ser ainda mais histórico e diverso, pois uma das cotadas a estar entre elas, era a atriz e diretora ¨Regina King¨ (Uma Noite em Miami), que já conquistou a estatueta de melhor atriz coadjuvante em 2019, e ficou de fora para melhor direção.

Para Melhor Ator, ¨Chadwick Boseman¨ (A Voz Suprema do Blues), favorito a levar o prêmio, sendo esse póstumo, já tendo levado tanto o Globo de Ouro como o Critics Choice, ¨Riz Ahmed¨ (Som do Silêncio), o primeiro Muçulmano a receber uma indicação, ¨Steven Yeun¨ (Minari), o único asiático até hoje a concorrer à melhor ator, ¨Anthony Hopkins¨  (Meu Pai), o ator mais velho de toda a história a ser indicado, e ¨Gary Oldman¨  (Mank), concorrem a estatueta.

Chadwick Boseman
Chadwick Boseman (imagem: Google imagens) 

 

 

 

 

 

 

 

Já para melhor atriz não temos tanta diversidade como nas anteriores, mas contamos com duas atrizes negras concorrendo, além disso, não temos uma favorita para ganhar. ¨Viola Davis¨  (A Voz Suprema do Blues), que com essa indicação, se tornou a mulher negra mais indicada da história do Oscar, ¨Andra Day¨  (United States vs. Billie Holiday), que ganhou o Globo de Ouro, ¨Carey Mulligan¨ (Bela Vingança), que ganhou o Critics Choice, ¨Vanessa Kirby ̈  (Pieces of a Woman) e ¨Frances McDormand¨(Nomadland) estão na disputa.  

atrizes indicadas
Carey Mulligan (esquerda) Viola Davis (direita)  (Imagem: divulgação)

 

 

 

 

 

 

 

 

Mesmo com a grande diversidade que esse Oscar apresenta, alguns especialistas em cinema crêem que isso não passa de uma forma da Academia se adequar à nova realidade mundial, faltando uma gama maior de representatividade.

Para Isabel Wittmann, crítica de cinema e criadora do podcast ¨Feito por Elas¨ que debate e divulga mulheres no cinema, o que ocorreu esse ano é sim algo importante porém que ainda não representa algo concreto e realista. 

"São marcos importantes, sem dúvida, mas pontuais quando se trata de refletir se a academia está, de fato, permitindo mais diversidade. Todos os anos temos dados e estatísticas como esses."

Lembrando o caso da diretora de fotografia ¨ Rachel Morrison¨ em 2018, que parece ter sido um ponto único na história.

 "Em 2018, por exemplo, tivemos Rachel Morrison sendo a primeira mulher indicada a melhor fotografia em 90 anos de premiação. De lá pra cá seguimos sem outras mulheres sendo indicadas na categoria"

Sobre as indicações do Oscar desse ano, Wittmann lembrou do caso do filme "Nunca, Raramente, Às Vezes, Sempre" dirigido por ¨Eliza Hittman¨ que ganhou diversos outros prêmios mas ficou de fora da premiação.

Isabel Wittmann
Isabel Wittmann (imagem: Instagram)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

"Um votante afirmou que se recusou a assistir, porque a trama discute o direito ao aborto. Por isso, sou particularmente descrente em relação a esses marcos individuais, ainda que eles sejam significativos e dignos de comemoração." 

Reforçando, novamente, como muitas vezes a Academia traz grandes números de diversidade somente quando a interessa. 

"Não podemos esquecer que um ano antes da vitória de Parasita (Parasite), Green Book havia sido consagrado o grande vencedor, um filme não só desinteressante em termos de forma e narrativa, mas com discurso racista." 

"Acho que movimentos como #OscarSoWhite e Me Too são importantes para trazer visibilidade à discussão, mas em ambos os casos, com recorte étnico-racial ou de gênero, a equidade está ainda muito distante." relembrando dos momentos que marcaram os últimos anos.

E finalizou dizendo qual seria a verdadeira prova de uma mudança por parte dos votantes 

"Creio que eles só indicariam uma real mudança estrutural se essas indicações fossem mais numerosas, se repetissem todos os anos e resultassem em prêmios rotineiramente"

Márcio Rodrigo Ribeiro, ex jornalista com passagens pela Fundação Bienal de São Paulo, jornais Gazeta Mercantil e Valor Econômico e da Revista Forbes, atual docente de Distribuição e Produtos Audiovisuais e Análise Fílmica no curso de cinema na ESPM, segue o mesmo caminho de Wittmann e crê que o que estamos vendo neste ano, não confirma que o Oscar está se abrindo para diversidade. "Não tem nada que se celebrar essa diversidade, tem que cobrar mais e mais, é muito pouco o que temos".

Já sobre a abertura da Academia para filmes estrangeiros, Ribeiro traz sua opinião e explicação para o assunto, dando como exemplo dois filmes que fizeram sucesso no ano passado , sendo um deles " O Tigre Branco" ( The White Tiger, Trailer) que está concorrendo ao Oscar de melhor roteiro adaptado. "Quando por exemplo a  Disney vai lá e decidi fazer um live action/remake de "Mulan" (Mulan Trailer), não é porque  ela acha incrível a história, mas sim porque ela precisa de qualquer maneira entrar no mercado chinês que é um mercado de 600 milhões de ingressos, quando a gente tem um filme como o "Tigre Branco" de certa maneira eles estão tentando entrar  no mercado indiano, que é um mercado de 1 bilhão e 300 milhões de ingressos é disso que estamos falando”, ressalta Ribeiro.

capa tigre branco
Capa de O Tigre Branco (imagem: divulgação)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  

 

 

 

 

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