O andamento da educação estadual em São Paulo

A estrutura e a falta de professores nas escolas estaduais
por
Ana Beatriz de Assis
Laís Bonfim
|
07/06/2022 - 12h

 

 Depois de quase dois anos sem aulas presenciais, as escolas estaduais voltaram com suas atividades no começo deste ano. Junto com a volta para as salas de aula, problemáticas que já eram decorrentes no período pós-pandêmico se agravaram ainda mais depois do isolamento social, além de favorecer a inserção de novos problemas para a comunidade acadêmica. A E.E Fernando Gasparian, localizada na região do Campo Limpo na zona sul de São Paulo, foi uma das escolas que sofreu no período de transição entre o EAD e a volta ao presencial. A unidade já enfrentava problemas de estrutura, violência e a insalubridade do ambiente escolar antes da pandemia.

 Segundo denúncias de alunos do colégio, o início das aulas foi muito desorganizado. Eles não tiveram aula de história, português e nem de tecnologia por cerca de um mês e meio, o que desmotivou os alunos no que parecia ser um novo começo. Além disso, alegaram a troca constante de docentes de matemática, no intervalo de cinco meses, os alunos tiveram o total de três professores para a disciplina. "Acredito que fomos muito prejudicados, tenho muito contato com estudantes de outras escolas e eles estão muito mais avançados do que nós", alega Fábio (não foram citados sobrenomes dos entrevistados, para preservar suas identidades)  de 13 anos e estudante da escola citada. Ele cursa o 8º ano do fundamental e já sente certa disparidade nos sistemas de ensino. O vice-diretor do colégio, Gilmar, admite a falta de docentes: "infelizmente muitas turmas ficam com disciplinas sem professores [..] em termos práticos às vezes não se encontram professores disponíveis para lecionar aulas para as disciplinas"    

 Rozana, ex-presidente da UBES (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas) e  militante pela educação, acredita que o motivo pelo afastamento de professores nessas escolas é uma série de variáveis, um deles é o modo como as escolas são esquematizadas: "São padrões produzidos numa escola pública: parece uma prisão, são sempre cinzas e com grades. Lugar onde os estudantes não se sentem confortáveis, muito menos estimulado pra tá ali”.

 

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Comentário sobre a escola E.E Fernando Gasparian. Reprodução: Google

 

 “Sim, a escola tem grades,  temos também sistema de monitoramento por câmeras, alarmes, tudo  para proteger o ambiente escolar.... Sobre o uso de drogas: Nunca vi nenhum aluno usando. Falar que os professores não ensinam nada é muito genérico, até porque eu leciono nesta unidade escolar, desde 2009” Reponde Gilmar ao comentário. Luiz, aluno de 13 anos, foi questionado se sentia-se seguro na escola com essa configuração: “Não muito, tem muitas brigas, na hora de usar banheiro tem meninos que atrapalham, chutam portas e as sujam, e acaba sendo chato e desconfortável” 

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Fotos cedidas por alunos, denunciam ambiente desconfortável para ser usufruído) 
  
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Fotos cedidas por alunos, denunciam ambiente desconfortável para ser usufruído) 
  

 

A violência é outro ponto que surge na entrevista com os alunos, citam que as brigas são constantes. Larissa, de 13 anos, cita que sente falta de vigilantes e detectores de metais em sua escola. Não é de hoje que as escolas públicas são tidas como violência, é uma pauta antiga que alimenta um arquétipo sobre o ensino público. Rozana acredita que esse esteriótipo violento, vem de uma raiz racista: “Por ser uma escola majoriatoriamente de jovens negros, sempre olham esses jovens como perigosos.” Ela ressalta ainda, que a realidade com qual esse estudantes convivem , fazem com que a violência- tendo em vista a inserção em um ambiente insalubre - seja sua linguagem mais intrínseca.

 Segundo os dados do Placon (Plataforma Conviva), sistema em que são registradas as ocorrências escolares, são 108 ocorrências, em média, de agressão física a cada dia letivo nas escolas paulistas. Em comparação com o ano de 2019, o registro de agressões físicas aumentaram 48,5%, de acordo com a Seduc-SP, Secretaria da Educação do Estado de São Paulo.

 

 

  • O que gera a falta de professores?

 De acordo com as informações da Seduc-SP, quatro das aulas do itinerário informativo estão sem professores. Revelado em 8 de abril deste ano, os itinerários formativos do Novo Ensino Médio mostraram que são 44.939 aulas não atribuídas na rede. A falta de professores ocorre pelo aumento das agressões no ambiente escolar, a falta de estrutura, o aumento da carga horária de trabalho combinado com baixos salários e a pausa dos concursos públicos, sendo o último realizado em 2018.

 Sobre agressões, a professora da rede estadual há 17 anos, Renata Muniz leciona na PEI- E.E Willian Rodrigues Rebuá e conta sua experiência nessa escola e na anterior, a qual era funcionária antes e durante a pandemia. ”Essa semana eu vi dois casos: uma diretora que foi enforcada e uma professora que foi esfaqueada. A escola que eu estou tem câmera, inclusive na sala, então se acontecer alguma coisa, tem como ver na câmera, mas aonde eu estava não tinha nenhuma, tanto que eu sofri agressão, bateram uma porta em mim [...] e minha amiga foi agredida também, tive que levar ela até a delegacia, inclusive”. A professora contextualizou as agressões, a porta foi empurrada por alunos que ficaram no corredor após ela adentrar a sala de aula, e  sua amiga foi arranhada por não olhar o caderno de uma aluna. 

  Além do ambiente inseguro, Muniz disserta sobre a estrutura das escolas: “A escola anterior era bem precária, a gente  foi receber os materiais para o ensino online no ano passado, então em 2020 não tinha material [...] Agora, essa é ótima! Ela é de período integral desde 2012, então foi uma das pioneiras do Estado e recebeu um amparo, um respaldo e a parte financeira. Nós temos dois laboratórios: um seco e outro molhado; então  tem aula prática mesmo, eu sou professora de aula prática; a gente tem anfiteatro, todas as salas têm televisão, data show, internet, e é uma escola de período integral de um público, só tem ensino médio na minha escola.”

 O governo do estado ampliou o Programa de Ensino Integral (PEI) nos últimos anos, de 394 escolas para 2.050. Diante disso, a professora estadual aponta o problema dessa rápida mudança: “ As escolas viraram PEI de dois períodos, então, de manhã tem o fundamental das 7:00h às 14:00h e a tarde o médio das 14:15h às 21:15h. Eu, por exemplo, saí de uma escola que se tornou PEI desse jeito e fui para minha escola que tem um período só;  eu saio às 16:30h e lá eu sairia às 21:15h. Então, teve muitos professores que saíram porque eles não querem a PEI. Onde eu estou tem toda uma estrutura, há uma cobrança muito maior do que em uma escola regular, mas eu tenho a parte física, ao contrário de  uma escola que virou PEI de 2021/2022, então os professores saem mesmo.”

 Outro fator que contribui para a falta de professores é o baixo salário, o jornal CartaCapital revelou que, em suas pesquisas, há professores recebendo abaixo do que a  Lei n. 11.738/2008, do Piso Salarial Profissional Nacional, propõe. Esse fator não é  recente. “Eu lembro do meu ensino médio, tinha muita aula vaga por conta da falta de professor. Na época, o problema maior era falta do salário dos professores, e eles paravam de trabalhar porque não recebiam e a condição das escolas eram precárias, e nós começamos uma ocupação por causa do salário dos professores para voltarmos a ter aula. Então,  seja qual for o motivo que faça ocorrer essa realidade, é muito grave.” diz Rozana Barroso, de 23 anos. 

 Como um modo de melhorar o cenário da educação estadual em São Paulo, a secretaria da educação criou, em 2019, o programa  CONVIVA SP, além de fazer pesquisas regularmente. O Programa de Melhoria da Convivência e Proteção Escolar (CONVIVA SP) foi criado com a proposta de criar um ambiente de aprendizagem solidário, colaborativo, acolhedor e seguro nas escolas. Ele é composto por projetos e ações articuladas entre: convivência e colaboração, articulação pedagógica e psicossocial, proteção e saúde, e segurança escolar.

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Arte: Laís Bonfim/ Fonte:https://efape.educacao.sp.gov.br/convivasp/