Moradores e comerciantes do distrito Cidade Ademar, na zona sul de São Paulo, estão sendo retirados de suas casas devido à construção do terminal de ônibus Jardim Miriam. A desapropriação dos 126 imóveis particulares na área de mais de 18 mil metros quadrados foi estabelecida pelo decreto 61.529/22 publicado pelo prefeito Ricardo Nunes.
A população denuncia que o processo se deu sem diálogo com a comunidade e as associações de bairro, que foram surpreendidas com o decreto. “Os moradores sequer foram consultados e não estão sabendo até agora”, afirma Maria Emília Moraes, professora aposentada da rede municipal de São Paulo. “Isso não é nenhum pouco democrático”.
Maria conta que se mudou para a região ainda criança, quando sua família, vinda de Minas Gerais, conseguiu comprar um terreno “com muito sufoco”, após anos residindo em moradias irregulares. A professora ainda aponta que a prefeitura não apresentou estudos sobre o impacto ambiental da construção.
Apesar de serem favoráveis à construção de um terminal na região, os moradores defendem que o terminal seja remanejado para um local em que a desapropriação não seja necessária. “Isso se chama dignidade, todos nós temos direito à moradia", diz Maria Emília.
O professor de matemática das redes municipal e estadual, Paulo Lima, compartilha do mesmo sentimento. “Nós queremos um terminal, mas em um local correto”.
Paulo afirma que, de acordo com o Plano Diretor Estratégico da cidade de São Paulo (PDE), o terminal estava planejado para ser construído em outro endereço. “Era para ser feito atrás do Poupatempo do Jardim Miriam”, se referindo à área entre as Avenidas Cupecê e Leopoldo Luganes.
O endereço atual, há cerca de 1km do que foi previsto no PDE, também está localizado na Avenida Cupecê, porém, entre as ruas Rua Luís Stolb, Antônio Bispo de Souza e Franciso Alves de Azevedo. “Se mexe no Plano Diretor sem que a Câmara e a população saibam”, acrescenta Paulo.
O professor também denuncia o fato de que os moradores não foram notificados pela prefeitura. “Uma falta de respeito e diálogo. Porque não chamaram os moradores para serem ouvidos?” questiona. “Em cada imóvel ali moram mais de quatro, cinco famílias. No fundo, milhares de pessoas serão impactadas.”
O advogado Maurício Canto, coordenador da Associação em Defesa dos Direitos Previdenciários dos Advogados (ADDPA - IPESP), considera que o decreto possui "vícios de ilegalidade", violando não só o estatuto da cidade – que define diretrizes para a execução da política urbana – como os direitos humanos. "O Plano Diretor é muito claro de que essa garagem deveria ser construída em outro local”, afirma. “O princípio da dignidade humana envolve a moradia”.
Apesar do processo não ser de competência estadual, na última quarta-feira, 21, moradores se manifestaram contra a desapropriação em uma audiência pública organizada pelo deputado Carlos Giannazi (PSOL) na Assembleia Legislativa. Já na Câmara Municipal de São Paulo, o vereador Celso Giannazi (PSOL) apresentou o PDL 87/2022 que revoga o decreto da prefeitura.
“O processo de desapropriação nesta área necessita de maior motivação devido ao inevitável impacto direto nos direitos fundamentais à moradia e à propriedade de centenas de famílias e comerciantes”, versa a justificativa do projeto. “Imprescindível se faz, também, a elaboração do estudo de impacto ambiental devido ao grande impacto no meio ambiente que será causado por conta do terminal de ônibus.”
Em nota, a SPtrans alegou que está adotando as providências necessárias junto à Subprefeitura da Cidade Ademar para realizar uma reunião com a comunidade local nas próximas semanas. Além disso, que está licitando estudos ambientais e territoriais para a implantação do Terminal Jardim Miriam.