A deputada federal, Célia Xakriabá, se tornou na quarta-feira (15) a primeira liderança indígena a presidir uma comissão no Congresso Nacional. Ela irá assumir o papel de presidenta da Comissão Amazônia e Povos Originários Câmara dos Deputados (CPOVOS). Um marco histórico para a política brasileira.
A comissão foi criada a partir do desmembramento da Comissão de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional. O colegiado terá como papel discutir e votar propostas relativas ao desenvolvimento da região amazônica e a defesa dos mais de 300 povos indígenas que vivem no Brasil.
Já na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara, algumas organizações ambientalistas manifestaram preocupação com a escolha, para a presidência, deputado José Priante (MDB-PA) que defende o garimpo em Terras Indígenas.
“No momento em que a crise climática exige do Congresso Nacional a promoção de avanços na proteção socioambiental, causa preocupação que a presidência da comissão não esteja com um parlamentar com histórico de atuação no tema”, afirmou Maurício Guetta, do Instituto Socioambiental (ISA), ao Metrópoles. “Esperamos que sua gestão seja marcada pela prevalência dos consensos e pela contenção dos graves retrocessos em tramitação”.
Em seu primeiro mandato, Célia ressaltou que pretende fazer do colegiado um espaço de debates que esteja além das fronteiras da Amazônia. "Pautaremos a importância de todos os biomas brasileiros, de povos originários, de povos e comunidades tradicionais. Nós não precisamos ser da Amazônia para defender a Amazônia. Não precisamos ser do cerrado para defender o cerrado. E, neste momento, esta comissão tem um caráter muito importante porque ela vai dar contorno a outras comissões – de Meio Ambiente, de Direitos Humanos", citou, ao mencionar o percurso legislativo de propostas que afetam diferentes áreas.
Célia informou que a luta contra o Projeto de Lei (PL) 490, que pretende barrar as demarcações de TIs; a implementação da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de TIs (PNGAT); o combate ao racismo; e a defesa dos direitos das mulheres indígenas serão prioridades da frente parlamentar.
Em conversa com o Brasil de Fato, a deputada ressaltou seu compromisso na promoção de diferentes interlocuções no âmbito das tarefas do colegiado. "Entender a presença indígena aqui é também entender que precisamos criar diálogos. Esta casa se tornou uma casa árida, onde se tem pouco diálogo. Quero dizer ainda que nós, povos originários, que não somos nem 1% da população brasileira, protegemos mais de 80% da biodiversidade. Isso significa que nem sempre quem é maioria está fazendo melhoria. Estamos aqui convocando os parlamentares a fazerem parte dessa melhoria."
Terras indígenas combatem a crise climática.
A proteção das Terras Indígenas demonstra ser essencial para frear o desmatamento fomentado pelas grandes corporações, madeireiros e garimpeiros. Hoje, as TIs e Unidades de Conservação cobrem mais de 42% da Amazônia Brasileira. Enquanto 20% da floresta amazônica foi desmatada nos últimos 40 anos, as Terras Indígenas na Amazônia Legal perderam apenas 2% de suas florestas originais – Instituto Socioambiental (ISA).
Outro ponto importante é que por meio dos chamados rios voadores, em que árvores amazônicas possuem participação fundamental, elas reciclam a umidade que recebem do Atlântico e "disparam" para a atmosfera grande carga de umidade, que viaja milhares de quilômetros até cair em forma de chuva em diversas regiões do país, abastecendo importantes bacias hidrelétricas. "A do Paraná principalmente, que tem um monte de hidrelétricas, uma depois da outra. Se não tiver essa quantidade de água transportada pelos rios voadores, não vai encher reservatórios e não vai produzir energia", analisa Philip Fearnside, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).
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A frente indígena tem importância estratégica no governo Lula, que nos primeiros dias de seu governo, sinalizou com a demarcação de 13 novas terras indígenas. O Congresso também tem a maior representação de indígenas na atual legislatura, tornando-se um espaço de relevante discussão para o desenvolvimento de uma política comprometida na defesa dos povos da floresta e desenvolvimento econômico sustentável.
O assessor político da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Paulino Montejo, diz enxergar a chegada de Xakriabá à presidência da comissão como a descoberta de mais um espaço para demonstrar que as lideranças do segmento podem exercer protagonismo naquilo que diz respeito à sua própria agenda.
A criação da CPOVOS - Comissão Amazônia e Povos Originários Câmara dos Deputados e a escolha de Célia Xakriabá para presidir o colegiado conta com o apoio também de servidores da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) que atuam no movimento organizado em prol de políticas públicas consistentes para o órgão.
"Não serei somente uma pessoa indígena a presidir a comissão: serão 900 mil cocares que assumem a comissão comigo", disse a parlamentar, em um discurso que agitou dezenas de apoiadores que compareceram à sessão para prestigiá-la. Célia Xakriabá (CPOVOS).
Referências:
Instituto Socioambiental - socioambiental.org
Brasil De Fato - brasildefato.com.br
Made For Minds - dw.com