MODA COMO INSTRUMENTO DE MANIFESTAÇÃO NA GUERRA DA UCRÂNIA

Marcas internacionais e personalidades manifestam repúdio ao conflito e fortalecem a influência social e política da moda
por
Beatriz Tiemy Nichioka
Ricardo Dias de Oliveira Filho
|
26/04/2022 - 12h
Reprodução: @vogueczechoslovakia / @brunakazinoti (Instagram)
Reprodução: @vogueczechoslovakia / @brunakazinoti (Instagram)

“Uma guerra que já havia sido cantada pela Rússia há muito tempo, tanto pela anexação de territórios quanto pela aproximação cada vez maior da Ucrânia em relação à OTAN e à União Europeia, esses são os principais motivos para o início do conflito", relatou Carla Cristina Garcia, mestre e Doutora em Ciências Sociais.

A invasão da Ucrânia por tropas russas ocorreu no dia 24 de fevereiro, em plena Semana de Moda de Milão. O papel político e social da moda como meio de transmitir uma mensagem ao mundo se concretizou nos desfiles. Giorgio Armani, por exemplo, demonstrou apoio à Ucrânia desfilando sua coleção em completo silêncio que, segundo o designer, foi uma ação em respeito às pessoas envolvidas na tragédia no país. Mais um exemplo notável foi o desfile da grife espanhola Balenciaga, que fez referências a refugiados, com a presença de peças práticas de serem vestidas, dobradas e reduzidas, como trench-coach. A praticidade e facilidade de compactação e armazenamento sugerem uma vida em constante movimento ou, até mesmo, nômade. Outras referências foram a bolsa desfilada, que se assemelha a um saco de lixo, e modelos desfilando de toalha e peças íntimas, assimilando a pessoas que tiveram que deixar suas casas às pressas - correlação direta à situação entre Rússia e Ucrânia.

Além das manifestações no grande palco midiático das passarelas e desfiles, a moda se faz presente como uma importante ferramenta de mobilização em períodos de conflitos, guerras e crises. Empresas e marcas ligadas aos setores da moda optaram por responder ao conflito suspendendo suas atividades na Rússia. A revista Vogue ucraniana fez uma publicação nas redes sociais, pedindo o embargo à exportação de todo tipo de itens de moda e bens de luxo, que serviu como apelo para grandes marcas e grifes citadas tomarem um posicionamento diante de toda a situação. A grife Hermes foi a primeira a se pronunciar e anunciar o fechamento de suas lojas russas, além de paralisar todas as suas atividades no país. A Chanel, que também fechou suas lojas em território russo, doou dois milhões de euros com intuito de ajudar refugiados nas fronteiras da Ucrânia. A Adidas suspendeu a parceria com a União Russa de Futebol, além de doar cem mil euros, roupas e calçados para institutos que oferecem apoio às crianças refugiadas.

A especialista em História da Moda, Laura Ferrazo, ressalta que a moda possui diversas maneiras de manifestação: “Eu acho que o mundo da moda tem muita influência, é importante a manifestação de muitas formas. Os desfiles que fazem referências, homenagens ou críticas à guerra, mas também os boicotes às vendas de produtos e importação de matérias-primas”. 

Membros da indústria da moda iniciaram um manifesto contra a guerra, contando com um abaixo-assinado firmado por mais de 1.500 profissionais de todos os ramos, desde a fotografia até a direção criativa: "Como designers, estilistas, fotógrafos, professores, estudantes, pesquisadores, modelos, artistas, designers gráficos, diretores criativos, agentes, escritores e editores, lutamos continuamente por um mundo onde a expressão criativa, o intercâmbio cultural e a colaboração possam florescer. A violência da invasão na Ucrânia vai contra tudo o que defendemos. Esta guerra não traz nada além de destruição, sofrimento e tristeza", diz o manifesto.

“A moda tem poder. A moda é uma indústria de trilhões de dólares, com gigantesca influência cultural, econômica e até política. Em tempos de crise, é fácil descartar esse poder, chamá-lo de supérfluo, frívolo, surdo, hipócrita ou não-essencial. Mas nossas cadeias de suprimentos conectam países em todo o mundo, nossa mídia alcança massas de seguidores em todos os lugares, nossa linguagem compartilhada de criatividade é universal. Somos uma indústria repleta de talentos, habilidades, redes e conexões. Essas ferramentas sempre podem melhorar a vida das pessoas ao nosso redor – seja em larga escala ou íntima. Onde quer que você esteja hoje, não vire as costas, não feche os olhos”, ressalta o texto.