Medição de temperatura é ineficaz para detecção da Covid-19

Pessoas assintomáticas podem passar pela triagem, aponta especialista
por
Esther Ursulino
|
26/05/2022 - 12h

Por Esther Ursulino

Durante a pandemia da covid-19 diversos estabelecimentos adotaram a medição de temperatura como uma das principais formas de tentar controlar a disseminação do vírus. Entretanto, especialistas apontam que esse protocolo de segurança é falho, visto que quando os termômetros são utilizados de forma incorreta apresentam resultados imprecisos. Além disso, alguns contaminados podem passar pela triagem, pois nem todos os infectados têm febre.

Os termômetros infravermelhos, também conhecidos como pirômetros ganharam popularidade durante a crise sanitária ocasionada pelo novo coronavírus. Isso se deve, em parte, pela vantagem que esses aparelhos têm sobre outros métodos de medição de temperatura: não precisam ter contato direto com o corpo da pessoa aferida – característica importante em um contexto de distanciamento social.

Mesmo fazendo a leitura à distância, esses aparelhos viraram alvo de notícias falsas. Uma delas dizia que o laser emitido por eles seria capaz de atingir a glândula pineal e trazer prejuízos à saúde. Por isso, os pirômetros não deveriam ser apontados para a testa, e sim para o pulso. Fernando Lang, que é professor de física da UFRGS, desmente a peça de desinformação. Segundo o docente, o laser dos termômetros infravermelhos não tem poder de penetrar nos objetos. Ele funciona apenas como uma mira para indicar a área que se deseja medir a temperatura, podendo ser desligado sem afetar o resultado da aferição. Portanto, não prejudica a saúde. 

Lang também explica que os pirômetros nada emitem, pelo contrário, são receptores. Quando apontados na direção de uma superfície, apenas fazem uma análise da radiação infravermelha que é emitida pelo corpo humano – e por qualquer objeto do cotidiano, sem exceção – resultando em uma medida de temperatura. Ou seja, o laser não é o responsável por fazer a leitura, e sim o sensor desse tipo de aparelho.  

A circulação de fake news relacionadas ao funcionamento dos pirômetros fez com que muitas pessoas passassem a apontá-los para o pulso em vez da testa, o que de acordo com o físico da UFRGS provoca uma leitura imprecisa: “A testa é um dos lugares corretos (o interior da boca, o reto, embaixo das axilas são outros) para se detectar o estado febril, pois ali a temperatura é mais elevada que em outras partes expostas do corpo. (...) O pulso apresenta temperatura cerca de 2°C inferior à temperatura de outras partes do corpo utilizadas para estabelecer se uma pessoa está em estado febril. Portanto, é completamente sem sentido apontar o termômetro para o pulso.”

Além disso, os manuais desses aparelhos indicam explicitamente que a medição deve ser feita pela testa, como pode ser lido na página 7 do Termômetro Incoterm: https://www.incoterm.com.br/media/2013/10/manual-tci1000.pdf. Na mesma página há um alerta: “Tentar realizar uma medição em qualquer outro local no corpo poderá resultar em uma leitura imprecisa”. 

Outros fatores devem ser observados para que não haja interferências no resultado da aferição: 

  1. A triagem deve ser feita em um local livre de correntes de ar, em que a temperatura ambiente não seja inferior a 25°C. 

  2. O pirômetro utilizado deve ser de uso clínico, projetado para medir a temperatura do corpo humano. Os termômetros infravermelhos utilizados pela indústria não servem para este fim. 

  3. O pirômetro deve estar posicionado a uma distância de 4 a 6 centímetros em relação a testa da pessoa que terá a temperatura aferida. 

  4. A pele da testa deve estar seca e sem obstáculos

  5. A lente frontal do termômetro deve estar seca e limpa 

  6. Se o termômetro for híbrido, ou seja, que mede a temperatura de objetos e pessoas, é preciso configurá-lo para o modo “body” (corpo)

  7. As medidas de temperatura devem ser feitas em no mínimo três minutos após a prática de exercícios físicos

Tendo em vista a quantidade de cuidados necessários para que o resultado mostrado pelo pirômetro seja preciso, o médico infectologista Marcelo Otsuka diz que, comparado aos termômetros clássicos, os termômetros infravermelhos não tem uma acurácia tão boa. 

Otsuka salienta que, mesmo se tivessem uma boa capacidade de aferição, ainda seria questionável adotar a medição de temperatura como único protocolo de segurança. "Muitas pessoas podem ter o vírus, podem estar transmitindo, e não ter sintomas, inclusive não ter febre. (...) Ter a temperatura como parâmetro é uma possibilidade, mas isso nunca deve ser considerado como parâmetro único.” Por isso, para o médico infectologista, é importante que esta medida seja somada a outros protocolos de segurança, como os inquéritos epidemiológicos, a testagem, a higiene das mãos e o uso de máscaras – em especial por pessoas com comorbidades.

Segundo Rosana Richtmann, infectologista do instituto Emílio Ribas, o vírus está circulando menos, mas ainda  circula. Por isso, é importante que a população esteja com a vacinação contra a covid-19 em dia.  A médica ainda ressalta que pessoas vacinadas também podem transmitir o vírus. Portanto, é importante que a imunização seja adotada junto a outras medidas de segurança. 

 

termômetro infravermelho