Mania de você: o legado de Rita Lee

Como a cantora influenciou, com seu talento e rebeldia, a trajetória do rock nacional
por
Bianca Athaide
|
23/06/2023 - 12h

A morte da cantora Rita Lee na primeira quinzena de maio, deixou o país de luto. Sua personalidade teve enorme importância na evolução do rock brasileiro, graças à sua liberdade e irreverência. O posto de “rainha do rock brasileiro” e “padroeira da liberdade” foi dedicado a Rita, resultado de sua personalidade moderna, criativa, revolucionária e transgressora que inspirou - e continua inspirando - milhares de pessoas.

Iniciando sua carreira com apenas 16 anos, na passagem dos anos 60, a cantora descendente de imigrantes americanos, participou de um trio de vocais femininos, batizado Teenage Singers . Não se identificou com a “caretice” do grupo e acabou saindo. Pouco tempo depois, ajudou a criar o inovador grupo “Os Mutantes”, no qual consagrou seu nome. 

A onda extremamente criativa e experimental da banda foi interrompida pelo conturbado  relacionamento de Rita com o então guitarrista e compositor Arnaldo Baptista. O fim de sua união coincidiu com o fim do grupo - uma perda imensurável para a cultura do Tropicalismo na esfera musical do Brasil. 

Em 1979, a cantora encaminha cada vez mais sua carreira para o viés solo. Após a breve criação do grupo Tutti Frutti, que teve como destaque o álbum Fruto proibido, de 1975, que trouxe a faixa “Agora só falta você”, Rita iniciou a composição de muitos hits conhecidos, com uma pegada mais pop rock, junto com seu marido Roberto de Carvalho. 

O mestre em composição musical pela City University of New York, Pedro Augusto Ramos, professor da Faculdade de Música e Conservatório Souza Lima afirma: “A Rita Lee foi muito mais do que uma roqueira. Claro, considerada a rainha do rock, pelo histórico, mas ela foi muito mais do que isso: para o século 20, similar ao que Chiquinha Gonzaga foi para o século 19. A música, querendo ou não, até hoje é um mundo mais masculino. dominado por homens, e a Rita foi além, foi uma pioneira no rock brasileiro, uma grande compositora: com composições que vão do rock, passando pela bossa nova, passando pelo pop e muitas baladas lentas.”

Somado ao seu legado musical, a cantora também deu o tom da chamada contracultura brasileira durante um longo período de tempo. Desafiando normas sociais impostas, defendendo a liberdade de expressão e dos direitos LGBTQIAP+, Rita inspirou milhares de fãs a se libertarem de paradigmas arcaicos sobre sexualidade, questão de gênero e feminismo. O professor exemplifica: “Eu acho que ela tem muito valor como mulher, sobrevivendo nesse mundo artístico - não só sobrevivendo mas tendo muito sucesso nesse meio - Ela era uma cantora, mas também tinha um pacote completo: sempre muito irreverente e leve. Em seus livros publicados e suas entrevistas podemos ver uma mulher muito ativa no papel de libertadora e modelo para muitas outras mulheres.” 

Ao analisar as letras de suas músicas, fica evidente que Rita sabia da importância da igualdade de gênero, da luta por reconhecimento e da necessidade de quebra de tabus muitas vezes opressores às mulheres. Obras como “Ovelha Negra” e “Erva Venenosa” - hits nacionais, conhecidos no país inteiro -  além de se destacarem pela qualidade musical, têm letras abarrotadas de mensagens de empoderamento feminino. Assim, além da conquista dos holofotes para seu próprio nome, Rita também escancarou portas para uma geração de artistas que viriam - entre elas, uma de suas pupilas do rock nacional, a cantora de rock baiana Pitty. 

Nas suas redes sociais, no dia em que a morte de Rita foi anunciada pelos seus filhos, a cantora publicou: “Sou fruto do legado de Rita Lee”. Em outra ocasião, durante um de seus shows, ela exclamou para o público: “Como assim? Como você é baiana e roqueira? Eu falei: 'é o seguinte: sou filha da Rita Lee com o Raul Seixas. Os dois se encontraram um dia no plano astral. Eles não sabem, mas sou filha dos dois". 

Desafiando estereótipos, chutando portas e abrindo caminhos, Rita Lee continua inspirando e ecoando pelos quatro cantos do Brasil. Seu legado e voz marcaram a história cultural e social do país. Sua coragem, rebeldia e autenticidade vão ser sempre suas características mais fortes, lembradas e celebradas pelos milhares de fãs. O entrevistado ainda finaliza com: “A Rita, eu acredito que está no panteão ali dos grandes compositores da música popular brasileira e também no campo do feminismo representou muito.” 

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