No ano em que se completam os 60 anos do Golpe Militar de 1964, um dos períodos mais trágicos da história da política brasileira, o Memorial da Resistência de São Paulo, museu da Secretaria de Cultura, Economia e Indústria Criativas do Governo do Estado de São Paulo organiza uma exposição temporária que mostra o papel das mulheres nesse período. “Mulheres em Luta! Arquivos de Memória Política” conta com a curadoria da pesquisadora Ana Patos e registra através de fotos, frases e depoimentos como foi a atuação das mulheres vítimas da Ditadura e relata a luta da União das Mulheres de São Paulo em busca de seus direitos naquela época.
Localizado na região central de São Paulo, próximo à Estação da Luz e do Museu da Língua Portuguesa, o Memorial da Resistência inaugura mais uma exposição sobre os tempos da Ditadura Militar, mas sob uma perspectiva diferente desse período. A intenção dessa mostra é focar na figura da mulher em meio a tanta tortura e represália, mostrando a união das mulheres. A busca por seus direitos e as manifestações a favor dos presos políticos mostram a força que esse grupo possuía desde esse tempo.
Com a vasta opção de arquivos, é possível conhecer e contemplar a história de diversas mulheres. Pode-se destacar a de Inês Etienne Romeu (1942-2015), a única sobrevivente da Casa da Morte de Petrópolis-RJ, um centro clandestino criado pelo Centro de Informações do Exército (CIE) para torturar pessoas contrárias ao regime militar. Através do depoimento de Inês à Comissão Nacional da Verdade (CNV), foi possível saber quem atuava na Casa da Morte. Fica disponível ao visitante da exposição ler sobre cada torturador, cada preso e o que ocorria em determinado lugar.
Cada espaço possui imagens marcantes, textos e áudios explicativos e até mesmo alguns poemas da sergipana, pensadora negra, poeta e militante Beatriz Nascimento, que retrata bem as formas de resistência à violência e impunidade.
Os grupos femininos de militância se tornaram mais fortes em meados dos anos 70. As ideias do Clube de Mães da Zona Sul e as pautas femininas da União de Mulheres de São Paulo conversavam entre si e buscavam, principalmente, moradias dignas, educação e saúde. A força política dessas mulheres se uniu a outras causas, como as da comunidade LGBTQIA+.
Até hoje, a União de Mulheres de São Paulo segue defendendo e atuando em prol dos direitos femininos. Há 40 anos de sua fundação, a associação preza em chamar atenção aos desafios enfrentados ao longo do tempo, buscando a igualdade entre os gêneros.
Segundo o Relatório da Comissão da Memória e Verdade da Prefeitura de São Paulo, a junção das feministas com os movimentos populares e sociais, dirigidos por mulheres ou com presença massiva dessas em seus quadros, aumentou as reivindicações desses movimentos quando começaram a acrescentar à luta inicial e outras dimensões da luta política, como o debate da dupla jornada de trabalho, da necessidade de socialização do trabalho doméstico, do salário igual para trabalho igual e da transformação da qualidade da relação entre homens e mulheres.
No tocante ao movimento pela Anistia, também as mulheres foram pioneiras: Therezinha Zerbini, esposa do general Euryale de Jesus Zerbini - transferido forçadamente à reserva em 1964 por ter-se mantido fiel a João Goulart - fundou em São Paulo o Movimento Feminino pela Anistia (MFPA) em 1975. Ela dizia que “a anistia não cai do céu, é uma guerra política” e é justamente o que aquelas filhas, mães e avós lutavam e reivindicavam naqueles anos.
A estudante de Jornalismo na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Nicole Domingos relatou que a experiência na exposição foi muito esclarecedora e a fez entender sobre a história e as lutas das mulheres naquele período. “É uma história linda e cheia de dor que podemos sentir como mulher, mas nunca entenderemos o que foi estar lá para chegarmos até aqui”, declarou a estudante.
Nicole também cita que ver a participação de diversas mulheres é importante para entendermos que, mesmo não estando nos livros de história, elas estavam na linha de frente. “Digo isso por todas as Marias, Teresas e Joanas que li naquelas paredes. [...] Descobri que sou grata a milhares de mulheres que não sei o nome, mas sei a luta”, finaliza.
Esta matéria foi produzida como parte integrante das Atividades Extensionistas do curso de Jornalismo da PUC-SP.