Por Livia Veiga Andrade
A Ditadura Militar teve início em 1964, com o golpe contra o até então presidente João Goulart. O Brasil se encontrava em um momento frágil, a população estava assustada, Jango assumiu a Presidência às pressas e havia uma desestabilização que foi fomentada pela imprensa brasileira. Era claro, na época, a falta de desejo de mudanças que poderiam acontecer na sociedade, as reformas agrárias iriam tirar o poder e o dinheiro de grandes famílias, os movimentos sociais iriam privilegiar os esquecidos e se os operários recebessem direitos, os donos das fábricas acabariam quebrando, por esses motivos o golpe recebeu apoio não apenas dos militares, mas também de civis.
O Brasil se apresentou muito instáve politicamentel até 2 de abril de 1964, quando finalmente as Forças Armadas arrancaram o poder das mãos de Jango, com o apoio dos Estados Unidos. Segundo documentos divulgados durante e depois da Comissão Nacional da Verdade, os Estados Unidos teve uma notável participação nas atividades criminosas que aqui ocorreram. O mundo estava passando por um momento de polarização, a Guerra Fria estava em andamento, os Estados Unidos estava em guerra com a antiga União Soviética, na época comunista e que criava uma ameaça ao capitalismo, além de já ter conquistado Cuba e a transformado em uma potência até seu declínio no início dos anos 90. O Brasil é o quinto maior território do mundo, os norte-americanos já haviam perdido a Rússia e parte da China, eles não poderiam arriscar também perder a nós, e por isso a Ditadura Militar recebeu não apenas o apoio político, como também o financeiro dos americanos.
O Memorial da Resistência de São Paulo é uma visita que deveria ser obrigatória para todos os brasileiros, principalmente em anos de eleição. O espaço localizado muito próximo à Estação Luz, retrata de uma forma muito cuidadosa e tocante os anos de muita tortura, desaparecimentos e perseguições que todo o estado de São Paulo sofreu nos anos de repreensão.
O prédio abrigava o antigo DOPS, o Departamento de Ordem Política de São Paulo, que foi criado em 1924 e extinto apenas em 1983. O lugar nasceu inicialmente como apenas uma simples delegacia, mas a partir dos anos preenchidos pelas perseguições, se tornou um dos lugares mais temidos da cidade, os criminosos políticos eram levados para lá, torturados, mortos, questionados e fichados por qualquer motivo minimamente ameaçador ao governo militar.
O Memorial foi criado em 2009 e mantém viva as memórias de um dos períodos mais terríveis que o Brasil já enfrentou. É praticamente impossível entrar em uma das celas que foram usadas na época e não sentir ao menos um arrepio na coluna apenas por imaginar o tanto de pessoas que eram mantidas ali diariamente sofrendo. A visita se inicia em uma sala chamada de “Lugares da Memória”, onde estão expostas placas que reúnem informações sobre os lugares que sofreram com o controle e repressão. O Pátio dos Leões na PUC-Campinas é um dos exemplos de lugares que receberam muitas manifestações na época contra a ditadura e a favor da democracia.
O próximo local nos imerge em um montante de informações, com uma enorme e detalhada linha do tempo sobre todo o período que engloba os antecedentes do Golpe de 64 e ainda conta com lembranças de repreensões e chacinas até os anos de 2000. O passeio não é divertido e muito menos leve, caso ache necessário é possível solicitar um monitor que pode explicar todas as salas e dar informações ainda mais aprofundadas sobre o que acontecia no local.
A visita tem o intuito de causar a reflexão sobre cidadania e os direitos humanos, além de evidenciar os terrores que a história carrega e não devem ser repetidos. Três celas foram mantidas e recriam o ambiente horripilante que os prisioneiros eram obrigados a enfrentar. O primeiro espaço conta a história de como o Memorial foi implantado e qual a sua importância não apenas histórica, mas também social.
Os outros dois espaços carcerários foram usados para nos transportar para aquela época e são chocantes. Toda a ambientação foi pensada de forma perfeita para criar um incômodo no visitante, os sons, os relatos orais das pessoas que passaram por ali, os nomes escritos nas paredes, os colchões no chão e a recriação do minúsculo banheiro que era usado por inúmeras pessoas.
Cada cela tinha espaço suficiente para comportar no máximo três a quatro pessoas, mas segundo relatos que estão impressos nas paredes, elas eram ocupadas por dez a quinze pessoas por vez, criando um ambiente completamente insalubre e impedindo que a tortura ficasse apenas fora das celas.
A cela que faz a reconstrução de como era ali na época também carrega consigo diversos nomes que podemos reconhecer escritos nas paredes, que foram colocados ali com base em relatos dos ex-presos que sobreviveram. Além dos nomes, também temos contato com algumas histórias, como a de Rose Nogueira, que deixou ali escrito “Pegaram meu bebê para me ameaçar”, e torna impossível não se emocionar ao menos um pouco de imaginar a cena.
Catraca Livre
O último espaço é uma cela vazia com áudios, apenas uma flor sobre um caixote no centro marca a homenagem para todos que sofreram nas mãos do golpe. Ali é possível sentar-se em bancos de metal e escutar as histórias horripilantes dos ex-presos. Desde artistas à adolescentes que acompanhavam os pais em manifestações, todas as histórias estão ali registradas e nos obrigam a refletir sobre a história.
A entrada é gratuita e funciona de quarta a segunda-feira e sem dúvidas deveria ser uma visita obrigatória a todos.