Legado dentro e fora das pistas: a influência de Senna em diferentes gerações

Após 30 anos de sua morte, o piloto se mantém vivo no imaginário de novos fãs e pilotos
por
Gustavo Pereira
Leonardo de Sá
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15/07/2024 - 12h
Mês de maio é marcado por homenagens aos 30 anos da morte de Ayrton Senna
Mês de maio é marcado por homenagens aos 30 anos da morte de Ayrton Senna — Foto: Reprodução

No dia 1 de maio de 1994, Ayrton Senna da Silva escreveu pela última vez em sua carreira. Em Ímola, Itália, o piloto brasileiro sofreu um acidente fatal e não resistiu aos ferimentos. Com uma carreira vitoriosa, em que esteve no pódio 80 vezes, nas quais foi vitorioso em 41 delas, Senna impactou uma geração de fãs e jovens pilotos que viriam a ser os protagonistas da era atual da Fórmula 1.

Pedro Antunes é um dos exemplos dos que se inspiram no atleta. O jovem de 17 anos é piloto da Fórmula Delta, uma categoria de base do automobilismo brasileiro, e, mesmo com a pouca idade, tem o Ayrton como ídolo.

“Para mim Senna é herói, meu ídolo no esporte. O Senna é uma grande fonte de inspiração. As suas conquistas me motivam a continuar me esforçando e buscando ser o melhor, tanto no esporte quanto no dia a dia”, aponta Pedro.

Outro grande fã do símbolo brasileiro é Davi Miguel Leite ou Davi Batata, de apenas 7 anos. O apaixonado mirim conta que mesmo sem assistir uma corrida ao vivo do piloto brasileiro, considera Ayrton como o maior atleta de todos os tempos: “O Senna é um ótimo ótimo ótimo piloto. O maior de todos”.

O legado do Senna no mundo digital

Mesmo que Ayrton Senna tenha morrido há 30 anos, o seu legado parece estar mais vivo do que nunca e é transmitido de geração em geração por diversas maneiras, sendo a internet o principal canal. A irmã de Davi, Gabriela Leite, conta que eles conheceram o ídolo brasileiro através das histórias contadas pelo pai deles. Com apenas três anos, o pequeno fã já assistia as corridas emblemáticas do Senna através do celular: “A gente cresceu com isso, assistia tudo que o Senna fez e falou na televisão. Assistimos várias vezes aos documentários dele. Então o Davi já cresceu sabendo que o Ayrton Senna é um grande ídolo do esporte”, afirma Gabriela.

Davi não perdeu tempo e hoje produz conteúdo para as redes sociais sobre a fórmula 1, e claro, contando para as futuras gerações quem é o seu ídolo no esporte. O mini influenciador digital já possui mais de 25 mil seguidores e vídeos que chegam a 400 mil visualizações.

 

Davi e Gabriela em Interlagos
Davi e Gabriela em Interlagos — Fotos: Arquivo pessoal/ Davi Batata

A internet também foi a porta de entrada para o piloto Pedro Antunes descobrir a carreira e conquistas de Senna. Antunes afirma que a partir de vídeos do Youtube e do Tiktok chega à figura do herói nacional.

A conta oficial da categoria automobilística possui, hoje, mais de 60 milhões de seguidores se somam todas as suas redes sociais, atingindo um crescimento de 29% em relação ao ano passado. Para efeito de comparação, a conta do Tik Tok da Fórmula 1 supera os 7 milhões de seguidores, números próximos aos da Premier League, UFC e NFL.

O jornalista esportivo da categoria e autor do livro “Ayrton Senna e a Mídia esportiva”, Rodrigo França, afirma que o grande acervo de imagens do Senna facilitou a reprodução do legado do piloto: “A carreira do Senna é muito documentada em vídeos, há diversas entrevistas dele, muitas coisas do que ele falou estão aí presentes na internet. Então é isso que faz com que os pais possam falar para os seus filhos sobre o Senna, e os filhos têm a oportunidade de buscá-lo nas redes sociais e conhecê-lo”.

Senna: Herói nacional

Não é difícil ouvir de muitos brasileiros que o seu principal ídolo no esporte é o Ayrton Senna. Imagens históricas são revividas como lembranças frescas na memória nacional, como: as corridas terríveis na chuva do piloto, as comemorações com a bandeira do Brasil após uma vitória, além da música típica ouvida nas transmissões da Globo, o seu primeiro troféu em Interlagos com o Troca de sua Mclaren quebrada, além das lembranças do trágico acidente em Ímola e o cortejo fúnebre que parou o país.

Ayrton Senna não foi só um piloto vitorioso, mas uma figura mítica para o brasileiro, é o que afirma o Professor de Ciências Sociais com ênfase em sociologia do esporte da PUC-SP, José Paulo Florenzano: “Ayrton Senna ocupa um lugar chave no panteão dos heróis esportivos, destacando-se nas pistas de corrida pelo estilo arrojado”.

Rodrigo França vai ao encontro desse pensamento e coloca Ayrton Senna como herói nacional pela sua garra, superação e amor pela sua pátria: “Senna não era só um esportista, ele era o Brasil que dava certo, uma representação de valores que estavam em falta naquela época e até hoje”.

 

Ayrton Senna com a bandeira do Brasil em sua última corrida na F1
Ayrton Senna com a bandeira do Brasil em sua última corrida na F1 — Foto: Reprodução/ Getty Images

O jornalista ainda destaca o papel fundamental do Instituto Ayrton Senna na consolidação do legado do atleta, além de continuar o sonho do piloto no incentivo à educação. Rodrigo ainda reverencia a imagem de que o piloto deixou para as futuras gerações: “O nome do Senna sempre está associado a alguma coisa positiva para o Brasil, com os valores que ele defendia nas pistas, então acho que isso é um fator determinante”.

Tanto Davi, quanto Pedro destacam as habilidades do ídolo de ser um piloto corajoso, confiante e que os ensinou a nunca desistir. Pedro ainda agradece a contribuição de Ayrton ao deixar o esporte mais seguro, luta que Senna batalhou durante toda a sua carreira.

Senna eternamente lembrado

Desde o início de diversas homenagens a Ayrton Senna foram feitas. No GP de Ímola, que aconteceu em 19 de maio, os pilotos se juntaram e vestiram a camisa verde e amarela em homenagem ao Senna. Além disso, durante a corrida diversos competidores estavam com capacetes e equipamentos que faziam referência ao ídolo brasileiro.

 

Homenagem dos pilotos da Fórmula 1 para o Ayrton Senna no GP de Ímola.
Homenagem dos pilotos da Fórmula 1 para o Ayrton Senna no GP de Ímola — Foto: Divulgação/ F1

No mesmo GP, aconteceu uma das homenagens mais emocionantes feitas ao Senna. O tetracampeão da F1 Sebastian Vettel pilotou uma réplica da famosa McLaren usada pelo brasileiro em 1993, numa volta de apresentação pelo circuito. O momento foi marcante para todos os que estavam presentes no local, como afirma Rodrigo França: “Em Imola, eu estava lá e teve uma geração de torcedores que viu o carro da McLaren de 93 pela primeira vez. A maioria das pessoas nunca tinha visto esse carro andar”. Ele conclui contando a importância do feito: “Então, você terá um tetracampeão mundial, como Sebastian Vettel pilotando esse carro, mostrando a reverência que ele tem do Senna e num GP emblemático como o Imola”.

As homenagens não pararam na Itália. No Grande Prêmio de Mônaco, a McLaren utilizou as cores da bandeira do Brasil, utilizou o capacete do Senna, na pintura do carro. Zac Brown, CEO da equipe, rasgou elogios para o “Rei de Mônaco”: “A equipe tem orgulho de reconhecer e celebrar a vida extraordinária e o legado automobilístico de Ayrton Senna através desta pintura da McLaren. Senna continua reverenciado e respeitado como o maior ícone da Fórmula 1 e o piloto mais condecorado da McLaren”.

No Brasil, uma corrida de rua em Interlagos foi realizada para comemorar a carreira do piloto brasileiro. O evento conta com mais de 10 mil pessoas, entre adultos e crianças. Ainda, no túmulo onde Senna foi enterrado, diversos fãs também prestaram homenagem ao ídolo levaram flores e bandeiras.

“Daqui a 200 anos a Fórmula 1 será disputada em aeronaves espaciais, mas ainda vamos falar de Ayrton Senna, porque é o cara que mais representou a Fórmula 1. Senna vai ser sempre um sinônimo de automobilismo no mundo inteiro”, conclui Rodrigo.

Um mundo novo: Liberty media e a imagem da Fórmula 1

O crescimento da categoria e o consequente interesse de gerações mais novas em personalidades marcantes do esporte como Senna passa por um processo recente na modalidade. Em 2017, a Liberty Media, empresa americana, iniciou essa mudança, que focou nas estratégias para conquista de audiência e engajamento, quando se tornou dona da Fórmula 1. Desde então, os números dos fãs da categoria subiram. De acordo com relatórios anuais sobre automobilismo, a audiência cumulativa cresceu de 1.758 bilhões em 2017 para 1,9 bilhões em 2023.

Ainda segundo dados divulgados no final do ano passado, a modalidade sofreu a queda da média de idade de seu público de 36 anos para 32. Nas transmissões esportivas, a audiência teve um crescimento de 44% entre os torcedores de até 35 anos, devido aos últimos cinco anos (2018 a 2022).

Um dos novos fãs que chegaram nessa nova era foi o Davi. A irmã dele, Gabriela, conta um pouco sobre como ela e o irmão foram inseridos em um momento de renovação da categoria, principalmente no que se refere ao público-alvo.

“Em 2022, meu pai e eu fomos ao GP Academy em Interlagos, onde comentaram sobre o foco da Liberty Media em atrair um público mais jovem. Até cerca de oito anos atrás, a Fórmula 1 era seguida principalmente por pessoas mais velhas, mas agora a audiência está se tornando cada vez mais jovem”, disse Gabriela.

Determinadas decisões e ações fizeram a diferença nessa revitalização da marca da Fórmula 1. Entre elas está a criação da série sobre os bastidores da categoria chamada “Drive to Survive”, lançada em 2019. Segundo a Liberty Medida aproximadamente mais de 800 milhões de usuários foram alcançados nos dois primeiros anos de lançamento da série, o que a fez conquistar mais de 50 milhões de visualizações desde o lançamento da quarta temporada, em 2022.

Com o sucesso do programa e a influência de Senna, a Netflix resolveu seguir o mesmo formato e decidiu lançar uma minissérie sobre o piloto. O anúncio foi feito no final do ano passado, mas as primeiras imagens e o teaser foram lançados no final de abril, pouco antes dos 30 anos de sua morte. Entre homenagens e ações realizadas no período, as movimentações sobre a produção fazem parte deste interesse de novos fãs de automobilismo.

Teremos um novo Senna?

Mas o que muitas pessoas ainda se perguntam é se um novo piloto brasileiro terá o mesmo, ou destaque semelhante ao que o Senna teve. O professor José Paulo Florenzano afirma que é difícil prever o futuro dos pilotos brasileiros na Fórmula 1 e concorda que há, sem dúvida, um vazio na história recente da modalidade esportiva, levando-se em consideração a presença marcante de pilotos brasileiros nas pistas de corrida , de Emerson Fittipaldi e Ayrton Senna.

Rodrigo complementa dizendo que a influência do ídolo brasileiro e os talentos que vêm despontando nas categorias de base dão esperança para que o logo um atleta brasileiro entre no grid da principal categoria de automobilismo, mas que, atualmente, outros fatores são levados em consideração como o apoio financeiro de marcas: “A gente sabe que não é só o talento tem que ter outros fatores, então é por isso que é um pouco mais complicado de acontecer”.