Gabriela Mayer é apresentadora e repórter especial da BandNews FM; Apresentadora do podcast Elas com Elas; Sócia-fundadora da Rádio Guarda-Chuva e apresentadora do podcast literário Põe na Estante. No mês de maio, ela concedeu entrevista para estudantes de jornalismo da PUC-SP, na qual falou sobre sua carreira e também de sua produção independente do Põe na Estante.
Intermediada pelo professor e apresentador da TV Cultura Aldo Quiroga, a entrevista tinha uma proposta simples em que cada aluno participante teria a oportunidade de fazer uma pergunta. No geral, o “bate-papo” foi muito límpido. A jornalista é uma leitora sagaz, como ela própria se intitula e acredita que o poder da literatura é transformador.
O que te motivou a estudar jornalismo?
Bom, o jornalismo não foi minha primeira opção de curso. Eu estava entre direito e jornalismo, mas na hora de preencher minha ficha no vestibular, acabei escolhendo ele. Mas, no meio do curso encontrei muito sentido no jornalismo em cada aspecto da minha vida e hoje entendo que não foi apenas uma escolha para preencher uma ficha. Eu vejo um poder transformador no jornalismo, ainda que isso seja um pouco idealista, eu o vejo como um pilar muito importante na democracia.
Como é feita a produção do Põe na Estante?
Ele é dividido em temporadas temáticas e eu planejo com antecedência para o entrevistado ter o seu tempo de leitura e análise da obra. Elas também variam pois em algumas eu escolho os livros ora o entrevistado, mas sempre com alguns critérios pois é muito difícil fazer essa escolha, juro! Mas elas também seguem algumas lógicas com questões atuais e também conversando entre si.
Você acha que falta a inclusão do jornalismo literário dentro da grade jornalística uma vez que, não temos muitas opções de veículos que abordam esse estilo?
Falta dinheiro,rs. Não é toda redação que consegue manter um repórter trabalhando na mesma história por meses, o que é um mega privilégio,- se dedicar todo esse tempo para uma única apuração -. Eu nunca vivi isso. Faço muitas coisas ao mesmo tempo e não consigo nem imaginar o que é você ter tempo para se dedicar a uma apuração. Se eu tivesse, acho que ficaria até confusa. Mas em geral, tem demanda, o que não tem é verba.
Qual sua opinião sobre a possível tributação dos livros?
Eu acho um assinte. Os livros são isentos no Brasil por uma proposta do Jorge Amado, que era deputado na época, numa tentativa de estímulo à leitura pois o brasil é um país que lê muito pouco e quando você pára e analisa o que as pessoas estão lendo, é perceptível o espaço restrito que a literatura tem no Brasil. Então, taxar os livros sob o argumento de que só os ricos lêem e por isso é razoável taxá-los, é um descalabro completo. Até porque, se formos taxar tudo aquilo que só os ricos possuem acesso, podemos taxar grandes fortunas, o que com certeza será mais eficiente. Os livros são muito potentes. Uma sociedade leitora por completo, consegue entender as entrelinhas, ter uma amplitude de mundo, conhecer outros mundos, contar histórias, ser dono de suas próprias palavras…
Em sua opinião, que papel a cultura desenvolve em nossa sociedade?
Bom, a importância da cultura é a importância da sobrevivência. Cultura é o que nos faz humanos. No que a gente está vivendo neste momento de pandemia, se não tivéssemos a cultura estaríamos completamente enlouquecidos. Além disso, a cultura tem o papel de nos conectar, por vários motivos, pois a cultura seja ela no livro ou não, ela conta uma história. A arte é aquilo que colocamos para fora e isso é uma forma de comunicação. No fundo, eu acredito que é pela comunicação que a gente vive pois ela permite nossas interações. Ou seja, é algo tão potente que eu me conecto com você sem ao menos te conhecer.
Qual foi a matéria mais importante de sua vida?
Brumadinho! Essa foi a cobertura mais importante que já fiz em minha vida. Foi importante tanto para minha vida pessoal quanto para minha carreira. Por mais que eu não publique, continuo acompanhando o caso. Não foi uma matéria tranquila e relembrar também não é. Eu cabei tendo um envolvimento emocional muito grande na cobertura de Brumadinho. Quando isso acontece, há um desafio extra. Eu não acredito em um jornalismo frio e distante, mas a carga de emoção pode nublar sua capacidade de narrar a história, dessa forma, acaba sendo mais difícil trabalhar.
Sua carreira começou na televisão e depois migrou para a rádio. Existe algo que você sente falta?
Olha, quando eu fui fazer rádio, eu ouvia muito das pessoas que rádio é apaixonante. Hoje, eu sou uma dessas pessoas. O rádio tem potência, agilidade e proximidade, que são encantadoras. Por outro lado, eu sempre fui muito apegada à imagem. Sou uma pessoa muito visual. A construção de histórias com imagens sempre fizeram muito sentido pra mim. Talvez seja isso o que mais sinto falta da televisão como plataforma.
Até agora, qual foi seu maior desafio nas rádios?
A linguagem da televisão é totalmente diferente da rádio e essa foi minha principal dificuldade. Porque é outro jeito de contar histórias, então eu tive que aprender a descrever muito bem, uma vez que não usamos imagens. Além disso, a apresentação na rádio é mais freestyle, diferente da televisão, que é algo mais roteirizado. Ou seja, você precisa ter uma capacidade de improviso, o que eu não tinha quando comecei. Inclusive, chorava todos os dias quando cheguei porque pensei que não ia conseguir, mas hoje deu certo.
E como foi sua volta à televisão, continuando na rádio?
Foi excelente. Voltei muito melhor por ter adquirido os hábitos da rádio como o improviso. E lógico, aprendi muito com os meus colegas.
Como você lida com sua exposição, uma vez que está em posição de destaque?
Eu lido mal. Sou muito suscetível aos comentários. tem gente que consegue não se importar, mas eu não consigo. Uma vez na Tv Cultura um telespectador disse que eu não deveria apresentar o jornal e muito menos ficar de pé pois o meu corpo não era adequado para ser apresentadora de televisão. Isso me deixou arrasada porque eu tenho uma relação muito difícil com o meu corpo. Era um comentário sobre isso, mas me abalou. Meus colegas homens, não recebem críticas sobre seus corpos, apenas sobre o conteúdo, já os meus, estão sempre atrelados ao fato de eu ser mulher.